ATA DA DÉCIMA TERCEIRA SESSÃO EXTRAORDINÁRIA DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA TERCEIRA LEGISLATURA, EM 14-11-2001.

 


Aos quatorze dias do mês de novembro do ano dois mil e um, reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezoito horas e cinqüenta e oito minutos, foi efetuada a chamada, sendo respondida pelos Vereadores Adeli Sell, Aldacir Oliboni, Beto Moesch, Cassiá Carpes, Clênia Maranhão, Ervino Besson, Estilac Xavier, Fernando Záchia, Helena Bonumá, Humberto Goulart, Isaac Ainhorn, João Antonio Dib, João Bosco Vaz, Juarez Pinheiro, Luiz Braz, Marcelo Danéris, Maria Celeste, Maristela Maffei, Nereu D'Avila, Pedro Américo Leal, Raul Carrion, Sebastião Melo e Sofia Cavedon. Ainda, durante a Sessão, compareceram os Vereadores Elói Guimarães e Reginaldo Pujol. Constatada a existência de quórum, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos. Em PAUTA, Discussão Preliminar, 3ª Sessão, estiveram o Projeto de Resolução nº 105/01, o Projeto de Lei do Executivo nº 032/01. Na ocasião, face Questão de Ordem e manifestação formuladas pelo Vereador Estilac Xavier, o Senhor Presidente prestou informações acerca dos trabalhos da presente Sessão. A seguir, constatada a existência de quórum, foi iniciada a ORDEM DO DIA. Foi aprovado o Requerimento nº 256/01 (Processo nº 4286/01 - Requer Moção de Apoio à Comissão Parlamentar de Inquérito instalada na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, que trata da Segurança Pública, tendo em vista o trabalho desenvolvido em defesa da ética, da cidadania, da transparência e da moralidade pública), por doze votos SIM e dez votos NÃO, em verificação de votação solicitada pelo Vereador Juarez Pinheiro, após ter sido aprovado em sua votação simbólica e encaminhado à votação pelos Vereadores Raul Carrion, João Antonio Dib e Clênia Maranhão, tendo votado Sim os Vereadores Beto Moesch, Cassiá Carpes, Clênia Maranhão, Elói Guimarães, Ervino Besson, Humberto Goulart, Isaac Ainhorn, João Antonio Dib, Luiz Braz, Nereu D'Avila, Pedro Américo Leal e Sebastião Melo, Não os Vereadores Adeli Sell, Aldacir Oliboni, Estilac Xavier, Helena Bonumá, Juarez Pinheiro, Marcelo Danéris, Maria Celeste, Maristela Maffei, Raul Carrion e Sofia Cavedon e tendo apresentado Declaração de Voto os Vereadores Estilac Xavier, Helena Bonumá, Juarez Pinheiro, Maria Celeste, Maristela Maffei, Raul Carrion e Sofia Cavedon. Na ocasião, face Questão de Ordem e manifestações do Vereador João Antonio Dib, o Senhor Presidente prestou esclarecimentos sobre a Declaração de Voto aposta ao Requerimento nº 256/01 (Processo nº 4286/01), apresentada pelos Vereadores Estilac Xavier, Helena Bonumá, Juarez Pinheiro, Maria Celeste, Maristela Maffei, Raul Carrion e Sofia Cavedon. Também, o Vereador Estilac Xavier manifestou-se sobre os trabalhos da presente Sessão. Ainda, o Vereador Luiz Braz solicitou verificação de quórum, tendo o Senhor Presidente declarado a existência do mesmo e tendo os Vereadores Luiz Braz, Juarez Pinheiro e Raul Carrion formulado Questões de Ordem e manifestações sobre o assunto. Na oportunidade, face Questão de Ordem formulada pelo Vereador Isaac Ainhorn, o Senhor Presidente prestou esclarecimentos sobre o tratamento regimental a ser dado à Declaração de Voto de autoria dos Vereadores Estilac Xavier, Helena Bonumá, Juarez Pinheiro, Maria Celeste, Maristela Maffei, Raul Carrion e Sofia Cavedon, aposta ao Requerimento nº 256/01 (Processo nº 4286/01). Foi aprovado Requerimento de autoria do Vereador Estilac Xavier, solicitando seja o Projeto de Lei do Executivo nº 032/01 (Processo nº 4265/01) considerado em regime de urgência e submetido à reunião conjunta de Comissões Permanentes. Às vinte horas e sete minutos, constatada a inexistência de quórum, o Senhor Presidente declarou encerrados os trabalhos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária da próxima sexta-feira, à hora regimental.. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Fernando Záchia e Reginaldo Pujol e secretariados pela Vereadora Helena Bonumá. Do que eu, Helena Bonumá, 1ª Secretária, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada por mim e pelo Senhor Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Fernando Záchia): Estão abertos os trabalhos da 13ª Sessão Extraordinária.

Passamos à

 

PAUTA - DISCUSSÃO PRELIMINAR

 

(05 oradores/05 minutos/com aparte)

 

3ª SESSÃO

 

PROC. Nº 4219/01 - PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 105/01, de autoria da Mesa Diretora, que altera dispositivos da Resolução 1.569, de 9 de outubro de 2001, que dispõe sobre a concessão de vales-alimentação aos funcionários efetivos e aos funcionários em comissão, detentores de cargos dos quadros da Câmara Municipal de Porto Alegre, e dá outras providências.

 

PROC. Nº 4265/01 - PROJETO DE LEI DO EXECUTIVO Nº 032/01, que autoriza a abertura de créditos suplementares no Legislativo Municipal e na Fundação de Assistência Social e Cidadania - FASC, no valor de R$2.486.266,49, e dá outras providências.

 

O SR. PRESIDENTE: Vamos ingressar na Ordem do Dia, momento em que retomaremos o Requerimento nº 256/01, de autoria do Ver. João Antonio Dib e outros Vereadores, que estavam, naquele momento, sendo encaminhados pelas diversas bancadas.

Estão liberados os painéis, solicitamos que os Srs. Vereadores registrem suas presenças para entrarmos na Ordem do Dia.

 

O SR. ESTILAC XAVIER (Questão de Ordem): Sr. Presidente, a Ordem do Dia dá seqüência à Sessão que não foi prorrogada? É a votação do Requerimento do Ver. João Antonio Dib e há o meu Requerimento, que estava naquela ordem.

 

O SR. PRESIDENTE (Fernando Záchia): Os dois requerimentos.

 

O SR. ESTILAC XAVIER: Eu queria só me certificar.

 

O SR. PRESIDENTE (Fernando Záchia): Havendo quórum, passamos à

 

ORDEM DO DIA

 

Nesta Sessão Extraordinária estamos votando o Requerimentos nº 256/01 e também nesta Ordem do Dia consta o Requerimento nº 259/01, de autoria do Ver. Estilac Xavier.

O Ver. Raul Carrion está com a palavra para encaminhar o Requerimento nº 256/01.

 

O SR. RAUL CARRION: Sr. Presidente, Sr.as Vereadoras e Srs. Vereadores, aqueles que nos assistem nesta Casa. Como o meu Partido tem afirmado reiteradas vezes que há muito tempo essa pretensa CPI da Segurança não trata das questões da segurança do nosso Estado. Há muito tempo não se discute nessa dita CPI da Segurança a carência de efetivos da Brigada militar e da Polícia Civil. Essa carência é decorrência do irresponsável PDV do Governo Britto, sustentado pelo PMDB, pelo PPB, pelo PFL e outros partidos. Há muito tempo essa CPI não discute a corrupção nos órgãos policiais; não discute o roubo de cargas; não discute os esquemas de receptação; não discute o problema do sistema penitenciário; não discute o tráfico de drogas ou de armas; não discute, povo de Porto Alegre, nada que tem a ver com segurança; não discute a corrupção dentro da polícia; não discute a banda podre. Eu peço que os Srs. Vereadores, se querem o debate, que me desconte o tempo, meu Presidente, eles não querem o debate, eles têm medo do debate! Não tem capacidade de debater!

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Vereador, nós vamos interromper o seu tempo. V. Ex.ª terá mais três minutos depois, eu vou solicitar ao Plenário que respeite o orador que está na tribuna, podem até, eventualmente, divergir das suas opiniões. Eu vou insistir na solicitação de que se garanta o direito de, livremente, o orador encerrar a sua posição. Garantiremos isso a todos aqueles que ocuparem a tribuna.

V. Ex.ª dispõe de mais três minutos pela interrupção do seu tempo.

 

O SR. RAUL CARRION: Obrigado, Sr. Presidente. A cada dia que passa fica mais clara a parcialidade, o descompromisso com a verdade, o caráter inquisitorial e a utilização político-eleitoreira dessa CPI que mais parece um IPM dos mais negros tempos da Ditadura! Na verdade é uma CPI contra o Partido dos Trabalhadores e o Governo Olívio que está golpeando tantos privilégios dos grandes grupos econômicos e interesses inconfessáveis. CPI que já nasceu falsa com uma assinatura de um Deputado que nem estava mais lá. Já nasceu na fraude! É necessário que o povo do Estado e da Cidade de Porto Alegre, saibam o que está por trás dessa cortina de fumaça. Trata-se, na verdade, de uma luta inconciliável entre dois projetos antagônicos. De um lado, o Projeto das elites entreguistas, autoritárias, antipopulares, corruptas deste País, que estão destruindo a Nação e entregando o País ao grande capital internacional, de outro lado, os trabalhadores, as forças populares e democráticas deste País. De um lado, os que defendem, consciente ou não, o neoliberalismo, a entrega do País, a retirada dos direitos dos trabalhadores, o golpeamento da democracia com uma lei antigreve, que hoje o FHC lançou no País, de outro lado, os que querem um novo rumo para o Brasil, o rumo de soberania, de democracia, que os direitos do povo e os direitos do trabalhador sejam respeitados. É lamentável que alguns setores do campo popular estejam hoje abraçados com o que tem de mais reacionário, de retrógrado, de obscurantista, de antinação e antipovo. Este é o verdadeiro debate, não é Clube de Cidadania! Não é jogo do bicho! Isto é cortina de fumaça! São dois projetos: uns estão tomando um lado, e outros estão tomando outro.

E concluo: hoje é a CPI dos que perderam em 98 e que foram derrotados em todo o Brasil. Como diz a nossa Deputada Jussara Cony: “É o coice da vaca moribunda.” Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A Ver.ª Clênia Maranhão inverte o seu tempo com o Ver. João Antonio Dib, que está com a palavra para encaminhar o Requerimento nº 256/01.

 

O SR. JOÃO ANTONIO DIB: Sr. Presidente e Srs. Vereadores, eu, como tantos outros desta Casa, sou Vereador sete dias por semana, gosto dos problemas da minha Cidade, da nossa Cidade. E, apresentar uma moção, é um fato inédito no meu currículo, para dizer do excelente trabalho prestado pela Assembléia Legislativa na busca de soluções, porque interessam a Porto Alegre. Não vou elogiar a condução da CPI por Deputado do meu Partido, eu quero me centrar na figura do Relator, Deputado Vieira da Cunha, várias vezes agredido sem nenhuma razão. Na figura do Deputado Vieira da Cunha quero deixar claro aqui a minha tristeza e a minha alegria. Tristeza por lembrar do jovem Ver. Vieira da Cunha, e acompanhar os debates do brilhante Deputado Estadual Vieira da Cunha. Eu quisera que na oportunidade em que ele estava nesta Casa do Povo de Porto Alegre tivesse a mesma experiência que hoje tem, porque competência ele tinha, sem dúvida nenhuma, mas faltava-lhe experiência, faltava-lhe vivência. Se tivesse experiência, teríamos talvez outra solução numa CPI que ocorreu, aqui, nesta Casa. Eu fiquei todo o tempo procurando ter absoluta convicção daquilo que ocorreu na CPI desta Casa, daquela balança que quebrou. Se o Vieira da Cunha tivesse a mesma experiência, teríamos flagrado uma história séria na história da Prefeitura de Porto Alegre. A balança quebrou, deu um prejuízo de um milhão de dólares - auditoria feita pelo Dr. Tarso Fernando Genro e que a CPI, aqui, não pode comprovar e a auditoria do Dr. Tarso Fernando Genro dizia, propunha que se buscasse ressarcimento na empresa que havia recebido o dinheiro a mais. Eu fiz um pedido de informação nesse sentido: “Não, aquela auditoria não era bem assim.” Mas não posso deixar de registrar que um dia, na página 3, da Zero Hora, a empresa dizia: “Eu não pesei o lixo. Eu não emiti o empenho, eu apenas recebi o que me pagaram.” O que dizia, portanto, que a auditoria estava certa.

Se fosse o homem experiente que é hoje, nós saberíamos mais coisas, não só a balança quebrada, que deu um imenso prejuízo. Um incinerador de lixo que, até hoje, não foi instalado e teve a assessoria petista, fabricação petista e o dinheiro do povo de Porto Alegre. Não estariam acontecendo coisas no Estado e por aí afora, se, naquele tempo, Vieira da Cunha tivesse a experiência que hoje tem. Então, é uma tristeza que, naquele tempo, ele não tivesse experiência. Mas é uma alegria, também, vendo que a competência que ele já tinha aqui é maior ainda como também a experiência foi aumentada. Esta experiência que fez com que ele pudesse buscar os documentos lá na casa do Dr. Diógenes, que nunca usou lanterna, porque as coisas no seu entorno sempre foram um tanto quanto escuras. Mas Vieira da Cunha não tinha experiência. Se tivesse experiência, aqui na Casa do Povo de Porto Alegre, todas as colocações, que foram feitas na nossa CPI, teriam sido comprovadas como, depois, a auditoria do Prefeito Tarso Fernando Genro comprovou.

Portanto, ao Vieira da Cunha, que não é do meu Partido, mas que é uma pessoa que eu respeito, os meus cumprimentos, cumprimentos da minha Bancada e que o seu Relatório ajude a limpar este Rio Grande, ajude o Rio Grande a crescer, porque o Rio Grande é de todos nós e cada um de nós precisa e tem direito ao progresso e ao sucesso. Saúde e paz. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A Ver.ª Clênia Maranhão está com a palavra para encaminhar o Requerimento nº 256/01. Ela é a última oradora inscrita.

 

A SRA. CLÊNIA MARANHÃO: Sr. Presidente, Sr.as Vereadoras e Srs. Vereadores, encaminho favoravelmente à Moção de autoria do Ver. João Antonio Dib. Trata-se de uma Moção de Apoio à Comissão Parlamentar de Inquérito que trata da Segurança Pública, instalada na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, e que, neste momento, inclusive, está concluindo seus trabalhos com a leitura do Relatório, com várias pessoas já indiciadas.

Considero extremamente importante a aprovação desta Moção de reconhecimento ao trabalho da CPI, porque foi através dela que o público do Rio Grande do Sul, que a comunidade gaúcha pôde tomar conhecimento de que o Partido do Governo, o PT, estava usando uma entidade “laranja” chamada Clube da Cidadania, através da qual recolhia dinheiro, onde os doadores pensavam que o estavam destinando a obras sociais e, na verdade, essa entidade comprava uma sede que é hoje usada como a sede do Partido dos Trabalhadores aqui em Porto Alegre.

É importante o reconhecimento do trabalho da CPI porque o povo do Rio Grande pôde acompanhar através do Canal 36, e de uma série de canais de televisão, o desempenho dos Deputados que, durante dia e noite, trabalhavam na busca do esclarecimento das denúncias que lá chegavam.

É importante a Moção do Vereador porque ela demonstra ao Estado do Rio Grande do Sul a demagogia de alguns Deputados que, na tentativa de se salvar das denúncias, disseram que o problema seria resolvido se o PT devolvesse aquela sede, de novo, ao Clube da Cidadania, assumindo assim uma ação como ilegal e antiética. É importante a Moção porque ela reconhece o trabalho da CPI, mostrando que houve a utilização de dinheiro de contravenção em campanha eleitoral. É importante também porque nos faz refletir sobre uma declaração feita no ano passado pelo atual Prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, quando ele disse que “botava a mão no fogo pelo Clube da Cidadania”. Queimou a mão o Prefeito de Porto Alegre, porque os dados da CPI demonstraram o uso do recurso ilegal, o dinheiro da contravenção, usado para a compra da sede de um partido político. Eu acredito que é muito ruim a posição tomada...

 

(Aparte anti-regimental da Ver.ª Maristela Maffei.)

 

A SRA. CLÊNIA MARANHÃO: São os dados da CPI, Vereadora. Eu acredito que é muito ruim a posição tomada, na minha avaliação, com todo respeito a V. Ex.ª, Ver. Estilac Xavier, porque, quando há denúncia de corrupção, quando há denúncia de falta de ética, quando há denúncia de imoralidade, um partido tem que procurar investigar a responsabilidade dessas acusações! E não é tentando tergiversar, tentando acusar os acusadores, tentando depreciar uma Comissão Parlamentar de Inquérito, não é tentando confundir a opinião pública é que se vai resgatar a história da moralidade pública do Rio Grande. Não adianta negar! Esse é o maior escândalo político da história recente do Rio Grande do Sul! Semelhante a isso há outros, muitos outros escândalos políticos no Brasil!

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A oradora, na tribuna, está com a palavra assegurada.

 

A SRA. CLÊNIA MARANHÃO: No Rio Grande do Sul, eu desconheço, nos últimos vinte anos, uma série de denúncias tão graves na história da política gaúcha. Isso é evidente, porque houve transparência, houve acompanhamento da imprensa, e o povo do Rio Grande pôde acompanhar as gravíssimas denúncias travadas naquele momento. Dizer que vai perder privilégios, quem vai perder privilégios são aqueles que arrecadavam o dinheiro da contravenção e agora não vão poder arrecadar mais. Evidentemente, vai haver perda de privilégio. Essa questão de dizer que muitos empresários acreditavam na postura ética do PT, eu concordo; é evidente que os empresários acreditavam na postura ética do PT, mas não eram só os empresários, não, a população acreditou. A população acreditava tanto que o PT ganhou a eleição. O problema é quando acreditamos numa coisa, porque ela é passada como verdade, mas os fatos da realidade demonstram que ela era mentira. Eu fico me perguntando se não é importante lembrarmos daquela frase que diz que: “Quem semeia vento, colhe tempestade.” Só que essa tempestade não surgiu do nada.

Por último, quero dizer que é muito triste a posição tomada por alguns partidos coadjuvantes do Governo, com tradição de esquerda que, para garantir o seu espaço político, ficam justificando coisas injustificáveis que têm sido comprovadas pela CPI, e, portanto, ela merece o apoio desta Casa. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Não há mais oradores inscritos. Em votação o Requerimento nº 256/01. Os Srs. Vereadores que o aprovam permaneçam sentados. (Pausa.) APROVADO.

Há um Requerimento de verificação de votação. Solicito que sejam disponibilizados os equipamentos para serem tomados os votos dos Srs. Vereadores, na verificação de votação, hábil e tempestivamente requerida.

Eu já tinha entendido como aprovado o Requerimento. Houve, tempestivamente, o pedido de verificação. Ver. Estilac Xavier, V. Ex.ª tem assegurada a Declaração de Voto, após a votação. Pode providenciá-la e encaminhá-la à Mesa.

Em votação nominal, solicitada pelo Ver. Juarez Pinheiro, o Requerimento nº 256/01, de autoria do Ver. João Antonio Dib. (Após a apuração.) APROVADO por 12 votos SIM e 09 votos NÃO.

V. Ex.ª não votou, Ver. Juarez Pinheiro? Pode votar. No microfone V. Ex.ª vota.

 

O SR. JUAREZ PINHEIRO: Sr. Presidente, agradeço a gentileza da Mesa. Eu voto “não”.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Registrado o voto do Ver. Juarez Pinheiro, que vota “não”.

Este Presidente proclama o resultado final: 12 votos SIM e 10 votos NÃO. APROVADO o Requerimento nº 256/01, de autoria do Ver. João Antonio Dib. À Diretoria Legislativa para as providências devidas. Não colhemos o voto do Ver. Fernando Záchia, porque, como ele presidiu parte da votação, ficou impedido de votar.

 

O SR. ESTILAC XAVIER: Sr. Presidente, estou-lhe apresentando - e gostaria que V. Ex.ª lesse, para conhecimento dos Anais desta Casa - a Declaração de Voto da nossa Bancada, que está escrita. Passo às suas mãos.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Agradeço a V. Ex.ª. Procederei a sua leitura. Antes, porém, aproveitando o quórum regimental, está em votação o Requerimento de autoria do Ver. Estilac Xavier, solicitando seja o  PLE nº 032/01, que autoriza a abertura de crédito suplementar do Legislativo Municipal e da FASC, considerado em regime de urgência e submetido à reunião conjunta de Comissões Permanentes. (Pausa.) Os Srs. Vereadores que o aprovam permaneçam sentados. (Pausa.) APROVADO.

Passo à leitura da Declaração de Voto da Bancada do PT ao Relatório Final. (Lê.) 

“Declaração de Voto

Reafirmamos nosso voto contrário à moção porque a CPI da Segurança foi parcial, desconstituiu o instituto da CPI a partir do momento em que não tratou do objeto da mesma, buscando apenas atingir o Partido dos Trabalhadores e o governo popular do Rio Grande do Sul, de forma irresponsável e caluniosa.

Queremos  que a CPI apure os financiamentos de campanha de todos os partidos.

                                                   (aa) Ver.  Estilac Xavier

                                                          Ver.ª Helena Bonumá

                                                          Ver. Juarez Pinheiro

                                                          Ver.ª Maria Celeste

                                                          Ver.ª Maristela Maffei

                                                          Ver. Raul Carrion

                                                          Ver.ª  Sofia Cavedon”

 

O SR. LUIZ BRAZ (Questão de Ordem): Sr. Presidente, solicito a V. Ex.ª que faça a verificação de quórum.

 

O SR. ESTILAC XAVIER: Sr. Presidente, nós temos um acordo político de que vamos enfrentar a questão do segundo Requerimento da CPI. Em nome desse acordo estou pedindo que os Srs. Vereadores permaneçam para dar quórum. Nós mantivemos quórum; votamos os créditos e ainda votamos as suplementações, tudo legal e regimental.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Srs. Vereadores, neste exato momento é visível que há quórum para discutir a matéria. Então, iniciarei a leitura da Declaração de Voto.

 

O SR. JOÃO ANTONIO DIB (Questão de Ordem): Sr. Presidente, eu gostaria que fosse esclarecido quantas páginas tem a Declaração de Voto.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Pelo que observo são 107 folhas.

 

O SR. JOÃO ANTONIO DIB: Sr. Presidente, eu devo declarar que eu não vou aceitar isso. É um desrespeito a uma moção que tem meia dúzia de linhas declarar 107 páginas. Eu não vou aceitar e estou me retirando.

 

O SR. LUIZ BRAZ (Questão de Ordem): Sr. Presidente, o pedido de verificação de quórum tem de ser feito através de votação nominal. Eu sei que é da boa vontade de V. Ex.ª, mas o Regimento impede que possa ser feita uma verificação visual. O pedido de verificação de quórum que faço é regimental.

 

O SR. JUAREZ PINHEIRO: Sr. Presidente, embora estejamos contristados por termos perdido o Requerimento, V. Ex.ª portou-se na condução dos trabalhos da forma mais correta possível, e quero fazer essa observação. Em segundo lugar, não procede a verificação de quórum, porque quando V. Ex.ª colocou em votação havia quórum, e o ato contínuo da leitura independe da verificação de quórum. Ela poderá ser feita depois. Se não for feita agora, ela poderia ser feita na próxima Sessão, e eu entendo que não procede a verificação de quórum, agora, porque faz parte do momento em que quórum havia, tanto é que o resultado está colocado no placar. A leitura, a meu juízo, Sr. Presidente, é uma situação nova, e ela pode e deve ser feita antes da verificação de quórum, porque quórum houve para verificação. É a minha observação e agradeço a V. Ex.ª.

 

O SR. RAUL CARRION (Questão de Ordem): Sr. Presidente, a Declaração de Voto faz parte do processo de votação, portanto, se o processo de votação é válido, a Declaração de Voto deve ser lida. Se não for lida a Declaração de Voto, é como se não tivesse quórum na votação.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A Mesa vai declarar, peremptoriamente, que não se submeterá a nenhum tipo de pressão que, eventualmente, possa alterar a tranqüilidade com que vai encarar a situação criada.

Nós, ao recebermos o Requerimento do Ver. Luiz Braz solicitando a verificação de quorum, de plano, como nos confere o Regimento, decidimos que visualmente tínhamos mais de onze Vereadores presentes na Casa. Com onze Vereadores presentes na Casa, pode-se ser complementado esse ato que precedeu e se vinculou à votação já ocorrida. O Ver. Luiz Braz inconforma-se com a nossa decisão e pede que se confirme, por meio da chamada nominal, os Srs. Vereadores.

Entendo, data vênia, que esse Requerimento do Ver. Luiz Braz, neste momento, é irrelevante, na medida em que é visível a constatação que nós temos no presente momento onze Vereadores. Nós, obviamente, se formos proceder uma votação agora, nós faríamos a verificação de que dispomos de dezessete Vereadores.

Eu dou a questão por encerrada.

 

O SR. LUIZ BRAZ (Questão de Ordem): Sr. Presidente, com a devida vênia, eu apenas quero lembrar a V. Ex.ª, de acordo com o nosso Regimento, que quando vamos votar um Requerimento, nós precisamos ter dezessete Vereadores e não mais os onze Vereadores, porque estamos votando um Requerimento e é por isso que um Requerimento é votado nominalmente.

Como eu fiz um Requerimento a V. Ex.ª, quando V. Ex.ª coloca o Requerimento em votação, nós precisamos ter dezessete Vereadores em Plenário. Não é mais um problema de quórum para seguir uma discussão, mas para votar um Requerimento e para votar precisa de dezessete votos.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Vereador, V. Ex.ª talvez tenha razão, nesse particular, o que não impede que se cumpra, se culmine um ato formalmente já iniciado, que foi uma votação para qual foi solicitado uma Declaração de Voto, me foi encaminhada uma Declaração de Voto com 107 páginas. Eu estou determinado a cumprir o Regimento e ler essa Declaração.

 

O SR. ISAAC AINHORN (Questão de Ordem): Sr. Presidente, um Requerimento tinha cinco ou seis linhas, é óbvio que a natureza da Declaração de Voto feita por esse Vereador, que subscreve essa Declaração, tem caráter de inviabilizar, de procrastinar o processo de votação. V. Ex.ª pode dar por lida, por considerada lida e apensar aos autos do Requerimento. Não precisa nem dar por lida, basta para conhecimento determinar o apensamento aos autos. É um absurdo a leitura de uma Declaração de Voto de 107 folhas, já brevemente preparada para tumultuar o processo de votação nesta Casa.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A votação não será tumultuada, ilustre Ver. Isaac Ainhorn, porque a votação já se complementou nos seus aspectos objetivos. A leitura para atender uma disposição regimental, a leitura é o aspecto adjetivo, secundário da matéria. Já encaminhei a decisão à Diretoria Legislativa para que produza os seus efeitos. O que ocorre agora é simplesmente uma satisfação regimental.

Solicito a Sr.ª Secretária que proceda a leitura da Declaração de Voto.

 

A SRA. 1ª SECRETÁRIA (Helena Bonumá): (Lê.)

 

“Declaração de Voto.

 

COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO

 

DECLARAÇÃO DE VOTO CONTRÁRIO AO RELATÓRIO FINAL

 

Bancada do Partido dos Trabalhadores

 

Dep. Ronaldo Zülke - Dep. Ivar Pavan

 

I. DO VOTO CONTRÁRIO AO RELATÓRIO APRESENTADO.

 

Declaração de voto

 

Senhores Deputados:

 

Os deputados signatários votam contrariamente ao relatório apresentado pelo Dep. Cunha, com as seguintes justificativas:

 

Chegamos ao fim de uma CPI que iniciou com um requerimento fraudulento e que acaba em séria suspeição sobre seu relator e seu presidente.

Todos lembram do requerimento que deu início a esta CPI, flagrado com rasuras grotescas e a presença ilegal de nomes de ex-deputados.

Quanto ao relator, ao longo dos trabalhos da Comissão ficou demonstrada sua parcialidade, em especial ao encenar uma farsa para apresentação da fita com gravação de Jairo Carneiro. Merecem destaque as ligações manifestas entre o relator e o ex-delegado Nelson Soares, atualmente advogado militante na defesa de contraventores da jogatina.

Hoje, a Agência Folha, em sua página na Internet, retrata também a ‘doação para sua campanha de José Antônio Andreola Mônaco – citado em inquérito da Polícia Civil sob acusação de ser banqueiro do jogo do bicho’.

Chegamos ao final de uma CPI que não trabalhou sobre o seu objetivo, que nunca fez questão de tratar a sério os problemas históricos e estruturais da segurança pública no Estado do Rio Grande do Sul.

Chegamos ao fim melancólico de uma CPI em que um delegado de polícia tido como um dos principais testemunhas das teses da bancada oposicionista exibe ao vivo, em tom debochado, suas duas carteiras de identidade, com números diferentes. Confessa o crime, ri, faz pantomima, dá as costas ao plenário sem ser importunado e ainda é defendido por deputados de oposição.

Ou então, da atitude não menos melancólica do Deputado Cunha que ao entregar a prova que havia recebido na condição de Relator ao Senhor Jair Krischke, deixou transparecer a exclusiva busca por manchetes ou luzes de ocasião, sem se importar com honra, imagem e muito menos com a verdade.

Assim como este senhor delegado, esta CPI também cometeu o crime de carregar sempre duas identidades. Oficialmente foi instalada para tratar das questões importantes referentes à segurança pública no Estado, tais como: Instituto Geral de Perícias, estrutura dos órgãos responsáveis pela segurança, e índices de criminalidade. Na prática, contudo, trabalhou sempre para atingir o governo, a figura do governador e o Partido dos Trabalhadores.

Esta CPI – com suas duas identidades, duas caras – recolheu provas ilícitas, montou fraudes com setores da imprensa, mentiu e caluniou. E continua a mentir agora, pelos termos apresentados no relatório proposto pelo Deputado Cunha.

Relator, aliás, que precisa ser seriamente investigado. Sim, porque ficou claro e documentadamente provado na última semana, que o delegado Nelson Soares de Oliveira, o mesmo que possui ilegalmente duas carteiras de identidade e, além disto, é sabido por todos como advogado de bicheiros, foi contribuinte financeiro da candidatura do relator Cunha na última campanha eleitoral.

Só agora, começamos a encontrar explicações plausíveis para a postura displicente e inerte de alguns deputados desta CPI, que nada fizeram, não tomaram nenhuma atitude, quando no início dos trabalhos desta Comissão Parlamentar quatro delegados de polícia confessaram com absurda naturalidade a existência de pagamentos de propinas na relação entre policiais e contraventores do jogo do bicho.

Mas a relação de apoio político e financeiro entre o relator da CPI e o mais descarado dos depoentes com que esta Comissão se deparou não foi a única surpresa destes últimos dias.

Em entrevista à Rádio Sepé Tiarajú, de Santo Ângelo, o presidente da CPI, Deputado Valdir Andres, talvez sentindo-se seguro pela distância da capital, declarou com todas as letras: ‘o jogo do bicho é um jogo inocente’; ‘me disseram que até dentro da chefia de polícia se faz jogo do bicho’; ‘eu acho que esta operação contra o jogo do bicho aqui na cidade foi feita para me deixar mal com as pessoas e pressionar os deputados da CPI’.

Seria cômico se não fosse trágico. Risível se não fosse grave. Curioso se não fosse o brutal desmascaramento de uma farsa. Pois o próprio presidente desta Comissão, em fita legalmente gravada e entregue à CPI pelo Deputado Elvino Bohn Gass, demonstra considerar inocente a contravenção jogo do bicho, se manifesta pressionado quando são presos seus agentes e afirma que possui informações sobre a prática deste delito, informações estas que nunca repassou ao conjunto dos deputados membros da CPI.

Chega ao fim uma CPI escandalosa, onde a raiva, a fúria e a irracionalidade manifestas nos termos do relatório oficial proposto, tem apenas dois objetivos: atacar o PT e o governo e desviar a atenção para a grave suspeição que pesa sobre as figuras do relator e do presidente desta Comissão, Deputados Cunha e Valdir Andres.

Mas neste voto em separado, onde as bancadas do PT e do PC do B manifestam sua total rejeição aos termos do relatório proposto, queremos de maneira franca fazer algumas afirmações sobre o tema segurança pública. Dizer em primeiro lugar que o Governo Democrático e Popular muito tem trabalhado nesta área. Afirmar que não aceitamos a trama sórdida e irresponsável operada por alguns parlamentares em conluio com setores da imprensa, que tentam criar neste Estado um ambiente de medo e insegurança, como se aqui vivêssemos num território sem lei e sem ordem. Nosso Rio Grande não é menos seguro que nenhum outro estado brasileiro.

O Governo Olívio Dutra, vem ampliando os patamares de gastos na área da segurança pública, com ações inéditas e de qualidade superior.

Não basta para nós termos as melhores polícias do país, nosso projeto de unificação das polícias é reconhecido nacional e internacionalmente como um projeto conseqüente, capaz de enfrentar a corrupção policial e dar profissionalismo e efetividade aos serviços de segurança prestados à população, inclusive com reconhecimento da ONU. Estamos sim enfrentando com coragem estruturas viciadas e arcaicas. Não somos daqueles que fazem vistas grossas aos crimes de sempre, seja por medo, interesse ou acomodação. E é bom que fique claro aqui: continuaremos fazendo nosso trabalho, por mais duro e perigoso que possa ser. Não estamos no governo para administrar as polícias em seus vícios, deformações e privilégios; governamos para devolver aos cidadãos e aos bons policiais uma polícia profissional, confiável e eficiente.

Não queremos aqui, neste ato de encerramento dos trabalhos da CPI, tergiversar sobre os temas que envolvem o Partido dos Trabalhadores, o Clube da Cidadania, as doações feitas por militantes e simpatizantes do nosso partido, seja para a compra da sede, seja para auxiliar na campanha eleitoral. Queremos tratar destes temas com a clareza que eles merecem.

É importante, em primeiro lugar lembrar que a tese inicial da oposição foi de que o dinheiro para a compra da sede e, quem sabe, para a campanha eleitoral, teria vindo do jogo do bicho. Fitas foram criminosamente gravadas e logo desmentidas e personagens menos dignos chegaram a falar de relações com a máfia internacional. O ódio muitas vezes leva ao delírio. A falta de compromisso com a verdade leva sempre à mentira. Dezenas de cidadãs e cidadãos, fossem eles estudantes, empresários ou trabalhadores foram convocados a depor nesta CPI. Foram expostos à opinião pública, declarados suspeitos pela verve irresponsável de vários deputados da oposição e tinham todos eles um único e grave crime: eram militantes ou simpatizantes do Partido dos Trabalhadores.

 

A CPI não se ateve a responder nem mesmo as questões que ela se colocou: Se acha que o dinheiro agora ‘vai para financiar a sede ou obras sociais’, para onde iria antes? Nelson Soares sabia, e em seu depoimento confirmou. A CPI omitiu-se. Esta testemunha também registrou com absurda naturalidade seu protesto em conversa com o então Chefe de Polícia: ‘e agora, como fica a contabilidade?’ referindo-se a coleta de dinheiro do bicheiros. Do mesmo modo o Capitão Airton, quando declarou nomes de policiais que teriam recebido dinheiro da contravenção. Com medo da verdade a CPI, novamente, omitiu-se.

Mais ainda. Quando a maioria dos Parlamentares silencia sobre o conteúdo do famoso ‘envelope amarelo’, contendo documentos que constituem indícios fortes da relação de um bicheiro de Estrela com partidos políticos.

Esta CPI que hoje acaba atolada na mentira, com seu relator e presidente sobre forte suspeição, não hesitou nunca em lançar acusações levianas sobre pessoas de bem, sobre cidadãos conscientes que declararam aqui ter absoluta clareza sobre suas escolhas políticas e seus atos militantes. Esta CPI que não teve o menor respeito com a história política e pessoal de José Paulo Bisol, chegando as raias de chama-lo de ‘covarde’ e ‘insano’, fato motivador de sua justa saída da sessão.

Esta CPI que hoje acaba, fez lembrar a inquisição. A intolerância e o fanatismo, por um bom tempo, derrotaram a ética e a civilidade. Na ânsia quase doentia de atacar a figura de Olívio Dutra, não hesitaram nem mesmo em lançar infâmias sobre a esposa do governador e de convocar seu filho para depor - numa sessão patética - sobre uma doação espontânea de 500 reais.

Hoje, depois de todas as investigações, depois de assistirmos a contabilidade do Clube da Cidadania ser avidamente esmiuçada, podemos afirmar de forma clara e taxativa: destas investigações não restou nenhum prova de recursos com origem ilícita. Repetimos: nenhuma prova.

Por fim, queremos tratar, também de maneira muito clara, franca e direta, a questão que envolveu a fita ilegalmente gravada de uma conversa entre o Senhor Diógenes de Oliveira e o então Chefe de Polícia Delegado Luís Fernando Tubino.

As duas partes foram longamente inquiridas por esta Comissão. O Senhor Diógenes afirmou de forma clara que nunca, em nenhum momento e em nenhuma situação teve autorização do Governador para falar em seu nome. Confessou que cometeu uma bravata, por sua conta e risco.

Quanto ao então chefe de polícia, este foi incisivo ao declarar e provar que nenhuma conseqüência resultou da dita conversa.

Tratou-se, portanto, de uma conversa bufa, vulgar e irresponsável. De uma pataquada inaceitável que envolveu autoridade pública. Nosso partido já está tratando deste assunto com o necessário rigor ao encaminhá-lo à Comissão de Ética para apuração de falta grave, bem como neste voto, estamos requerendo seja dado conhecimento dos fatos ao Ministério Público para que este proceda as investigações pertinentes e para que produza, se for o caso, as responsabilizações de lei.

Isto é da nossa história, da nossa tradição, assim fizemos e continuaremos a fazer.

Nosso voto em separado é longo e minucioso. São dezenas de páginas que levaremos ao Ministério Público para que sejam buscadas responsabilidades legais. Nele também abordamos os pontos que deram início a esta CPI e que jamais foram aqui tratados com a seriedade que o assunto requer. É mais uma das formas que encontramos de prestar contas à sociedade daquilo que estamos fazendo na área da segurança pública.

Ao encerrarmos os trabalhos desta Comissão Parlamentar de Inquérito, queremos lamentar profundamente a prática da calúnia e da infâmia que marcou os trabalhos desta CPI. Lamentamos a parcialidade com que os trabalhos foram conduzidos e as farsas que foram montadas.

Esta CPI revelou-se verdadeira ópera bufa que se prestou para enxovalhar a imagem do Parlamento do Rio Grande. Portanto, Senhores Deputados, honrem a história deste parlamento!

 

II - PRELIMINARES POLÍTICAS

 

Os reais motivos da CPI: desgastar o governo e sua política de segurança pública

 

1. Desde o início, em 1999, o atual Governo do Estado do Rio Grande do Sul começou a realizar profundas mudanças na área da segurança pública, adotando políticas defendidas pela ONU. Isso provocou fortes reações contrárias da banda podre da polícia, da oposição política e do monopólio da mídia, que começaram a defender a criação de uma CPI nesta área delicada.

Com demandas históricas que se arrastavam, a segurança pública é uma área naturalmente conflagrada, em razão dos imensos e à época quase insolúveis problemas. Naturalmente, problemas que não foram criados nesta administração, mas que atravessaram governos ao longo de décadas, como falta de recursos humanos, financeiros e materiais, insuficiências de armas, munições e viaturas, que se traduzem em efetivos mal preparados; além do envolvimento de policiais com a criminalidade.”

 

O SR. JOÃO ANTONIO DIB: (Questão de Ordem): Sr. Presidente, solicito uma Questão de Ordem.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): A Questão de Ordem de V. Ex.ª já foi acolhida, nós sabemos que V. Ex.ª vai protestar que, numa Sessão Extraordinária, o Ver. Luiz Braz esteja sem o paletó. Justifique a sua Questão de Ordem.

 

O SR. JOÃO ANTONIO DIB (Questão de Ordem): Sr. Presidente, o material da Declaração de Voto foi entregue, não pode ser acrescido mais. Não, não pode! Eu vi o Ver. Estilac Xavier levando mais material. Não precisa fazer sinal, porque eu estou sentado ouvindo a brilhante leitura de V. Ex.ª.

Eu faço uma proposição também, Sr. Presidente, além de pedir uma cópia da Declaração que liberassem os servidores para não terem de ficar de castigo, em razão de uma matéria que está sendo gravada, copiada em disquete e entregue a todos nós.

Solicitaria que examinasse a possibilidade de liberar os servidores.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Eu recolho a Questão de Ordem de V. Ex.ª. A Diretoria Legislativa já está autorizada a proceder. Tranqüilizo V. Ex.ª de que não houve nenhum acréscimo de palavras. Eu acredito que não houve, porque nós estamos trabalhando em uma Casa de homens e mulheres honrados que não iriam se prevalecer desta situação.

Ver.ª Helena Bonumá, V. Ex.ª, por gentileza, prossiga na sua leitura.

 

A SRA. HELENA BONUMÁ: (Lê.)

 

“Fatores estes que o atual Governo está encarando de frente. Todos estes itens, mais adiante especificados, ganharam novo status, assim como a ‘banda podre’ das polícias que sabe estar com os dias contados.

Esses setores contrários à política do atual Governo passaram a alegar que ‘os órgãos de segurança estavam sendo desmontados’, que ‘não havia uma política de segurança’ e que ‘estavam sendo criadas milícias armadas no Estado’.

A mídia colaborou decisivamente, criando um clima artificial de insegurança forjado pelos veículos de comunicação da RBS junto à opinião pública e impulsionando os parlamentares.

2. Internamente, atingida em seus interesses, a banda podre passou a torpedear decisões do novo comando da Segurança Pública. Basta lembrar a campanha desencadeada contra a portaria do uso de armas de fogo que seguia recomendação da ONU ou o episódio das esposas de PMs envolvidos no assassinato do chamado Caso Konrad, que gravaram um fita com o objetivo de desgastar o secretário de Segurança Pública.

Não é por mero acaso que essa mesma fita aparece requentada na CPI cinco meses depois. Também não é por coincidência que o presidente do MJDH já surgia neste episódio acusando o governo.

Em março de 1999, os deputados oposicionistas já haviam tentado criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a Brigada Militar.

No final de 2000, nova tentativa. Chegaram a ser colhidas assinaturas de deputados oposicionistas mas, com o final do ano, a operação foi suspensa. Engavetado, o requerimento ressurgiu no começo de 2001 de forma melancólica, na forma de uma das mais desmoralizantes fraudes já praticadas no parlamento gaúcho. Rasurado e remendado, o requerimento foi reapresentado com assinaturas de parlamentares que já não estavam na Assembléia Legislativa e do próprio presidente do poder que, por força do cargo, não poderia firmar tal requerimento. A quantidade de corretivo líquido utilizada no documento foi a prova mais cabal da tentativa de fraude para requerer a criação da CPI da Segurança Pública.

3. Enfim, a oposição conseguiu instalar a CPI, no dia 18 de abril. O secretário da Casa Civil, Flávio Koutzii, o secretário da Justiça e da Segurança, José Paulo Bisol, o então comandante geral da Brigada Militar, coronel Nélvio Neumann, e o chefe de Polícia, delegado José Antônio de Araújo, participaram da solenidade demonstrando que o Governo do Estado não temia qualquer investigação séria no setor. Este fato, inédito na história das CPIs no Legislativo gaúcho, demonstrou com clareza à população e à própria Assembléia a reafirmação do projeto transparente de Política de Segurança Pública e a disposição do Governo de combater a banda podre da polícia gaúcha.

A CPI apresentava 12 pontos, aos quais, depois, foi acrescentado mais um. Nenhum deles, porém, indicava qualquer fato ilícito que justificasse investigações. Já no início dos trabalhos da comissão, o Governo do Estado esclareceu todos esses pontos. Passados os primeiros meses da CPI, os fatos estavam sendo esclarecidos e eliminada, definitivamente, qualquer possibilidade de ilícitos na área da segurança. A partir daí, os pretensos motivos que levaram à instalação da comissão deixavam de existir e só restou o debate ideológico da oposição parlamentar, do monopólio da mídia e da banda podre da polícia contra o Governo do Estado.

A Comissão passa então a trilhar caminhos tortuosos que incluíram quebra de formalidades, atitudes que desqualificaram os parlamentares de oposição, acusações infundadas, ilações e, sobretudo, tentativas de enxovalhar a imagem do governo estadual e do PT.

4. Apenas para ilustrar a parcialidade que pautou a oposição nessa CPI, é muito curiosa a entrevista do Presidente Valdir Andrés, após a Polícia Civil ‘estourar’ uma banca de jogo do bicho na sua cidade natal, Santo Ângelo, em 09 de novembro. Após o repórter perguntar o que ele acha da ofensiva sobre o jogo na cidade do presidente da Comissão, este responde que:

‘Olha, no mínimo Jairo, eu acho muito estranho e uma coincidência muito forte. É muito estranho que policiais de Porto Alegre aonde o jogo campeia abertamente, aonde se faz jogo em todas as esquinas em todos os bares, eu não duvido que até dentro da própria chefia de polícia, me disseram que fazem jogo do bicho. O jogo do bicho é um jogo inocente, é um jogo que todo brasileiro faz, sem dúvida nenhuma. É um jogo que já está enraizado na cultura do povo brasileiro. O que a gente sempre tem que combater é as pessoas que querem tirar dinheiro destes que fazem o jogo do bicho, né. É arrancar dinheiro para não oficializar, isto é que é o errado... eu te diria que é uma estranha coincidência, é uma tentativa talvez de amedrontar, de fazer uma pressão...’

 

O Repórter então pergunta: ‘Seria uma represália contra a CPI neste momento deputado?’

 

Deputado Andres:Não há dúvida nenhuma, claro que é uma represália. É para assustar os deputados. Aqui em Porto Alegre se joga tudo, não só o inocente jogo do bicho...Vão a Santo Ângelo aí combater pessoas muitas vezes simples que fazem seu trabalho e que enfim não estão causando nenhum problema.’

 

Como se vê, um dos temas enviezadamente tratados na CPI, o jogo do bicho, em Porto Alegre é uma atividade ilícita, reprovável e que se presta para corrupção. Em Santo Ângelo é uma coisa normal, ou no dizer do Presidente da CPI, ‘inocente’ e qualquer tentativa de combate em sua base eleitoral é vista como intimidação, ato reprovável que pode causar transtorno ao Parlamentar. Por que algum deputado se intimidaria com a atuação da Polícia em sua cidade? Este fato não devia ser elogiado?

 

De fato a CPI que nasceu ‘da Segurança Pública’ tinha um pressuposto político perversamente contrabandeado de fazer oposição ao governo e um objetivo imediato de desgastar a imagem do Partido dos Trabalhadores, com fins meramente eleitoreiros.

5. Talvez o maior mérito da CPI da Segurança tenha sido o de trazer a público uma simbiótica união entre a maioria oposicionista, defensora da maneira ‘tradicional’ de fazer política, aliada a um rol de denunciantes, assessores e testemunhas que demonstram muito bem um modelo de polícia antigo, adepto de concepções e métodos duvidosos, muito aquém do ideal de policiais que o Estado e população gaúcha merecem:

 

O PRESIDENTE DO MJDH E SUAS
ESTRANHAS VINCULAÇÕES

 

Acusando o governo de ter ‘implantado um cassino virtual no estado’, devido às tentativas para regulamentar a exploração dos jogos eletrônicos, o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, se apresentou à CPI munido de um extenso ‘dossiê’, no qual identificava até mesmo ligações da atual administração com a máfia internacional. Não fosse a respeitabilidade que a sua imagem, mantida até então, avalizava, a dita denúncia teria como endereço imediato o mais absoluto ridículo.

Mas não foi assim, por que foi exatamente neste episódio que configurou-se a estranha aliança, já antes referida, entre os representantes do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, delegados de polícia - alguns deles comprometidos com a violência e a corrupção policial -, deputados oposicionistas e parte da mídia. Uma verdadeira central de boatos e calúnias, na qual, tristemente, o MJDH se prestava ao papel de acusador, enquanto que os delegados emprestavam o necessário verniz institucional à infâmia, a CPI ouvia e a mídia reproduzia.

Interessante é que o presidente do MJDH não se apresentou sozinho à CPI, esteve secundado por dois ‘assessores’, um jornalista e um advogado, este ex-Prefeito de Sapucaia do Sul, juiz aposentado e advogado de bicheiros, Luiz Francisco Barbosa, o ‘Barbozinha’, que em depoimento a essa CPI confirmou a homenagem feita, enquanto prefeito aos bicheiros que colaboraram com recursos para o hospital municipal.

Se Krischke era o centro das calúnias, a medida que os fatos iam se revelando, o assessor advogado do presidente do MJDH revelava-se o centro de outra e inconfessável articulação: Barbosa não era apenas advogado de Krischke, empenhava seus préstimos profissionais, também, a empresas que atuam na área de jogos, inclusive eletrônicos, especificamente o grupo chamado Grub Game.

Como entender esta aparente dubiedade? De um lado acusava os jogos eletrônicos, de outro defendia seus patrocinadores. Estaria ele contrariando o bíblico ensinamento de que não se pode servir a dois senhores? Não. Barbosa, Krischke seu jornalista assessor, acusavam apenas uma empresa concorrente da Grub Game, a italiana SISSAL. Seus motivos não eram éticos e muito menos morais, movia-se pelo interesse de seu cliente.

Vejamos como se articulam tais interesses: a empresa Grub Game é representada no Rio Grande do Sul pelo ex-Vereador peemedebista Paulo Lougue, de Sapucaia do Sul, conhecido bicheiro e proprietário de casas de jogos naquele município, como visto antes, já administrado pelo advogado de Kirschke... Paulo Lougue, aliás, é contumaz freqüentador do presídio local, por conta de suas atividades empresariais, e votou favoravelmente ao projeto de lei que regulamentou os jogos eletrônicos em Sapucaia do Sul. (E aqui outra contradição: para Barbosa, Kirschke. e seu escriba, o estado da Federação não pode legislar sobre tal matéria, pois a mesma seria, como defenderam, de competência da União. Mas silenciaram em relação à iniciativa do prefeito sapucaiense. Lá a Constituição é outra?)

As autoridades policiais também têm destaque nesta trama. É o caso do delegado Abílio Pereira, ex-diretor do Departamento de Polícia Metropolitana, época em que expediu pareceres favoráveis ao funcionamento da empresa Grub Game, quando a orientação geral da polícia, e dele próprio, era reprimir este tipo de atividade. Abílio não esteve só no que se refere aos pareceres favoráveis à Grub Game, foi secundado pelos colegas delegados Alexandre Vieira e Roberto Leite Pimentel.

Abílio e Alexandre, tradicionalmente denunciados pelo Ministério Público, por esta e outras CPIs inclusive, simplesmente se travestiram em vítimas de perseguição do Governo aos olhos da maioria oposicionista na CPI..

Roberto Pimentel, por sua vez, não bastasse a providencial assessoria na área de jogos, revelou-se incansável advogado em atividade paralela à de policial, mesmo que incompatível com a sua função pública, tendo entre sua clientela delegados processados judicialmente.

Outros expoentes da Polícia também deram o ar de sua graça. De todos, o de maior destaque seguramente, foi o ex-delegado Nelson de Oliveira. Advogado da contravenção, assumido, foi um dos primeiros a denunciar o envolvimento do Governo. Cidadão de dupla identidade (e não é figura de linguagem), simplesmente acusa, em suas denúncias, um descaminho das verbas da contravenção que ‘doravante’, segundo suas palavras, não mais alcançariam o seu tradicional objetivo.

Enquanto isso a CPI, inebriada com a gravidade das denúncias, esquecia-se de investigar o óbvio: o histórico uso do dinheiro da contravenção como pagamento de propina. Quem sabe, talvez, pelo excesso de zelo do relator que confere importância somente ao que lhe interessa. Principalmente em depoimentos de um de seus contribuintes de campanha, o controvertido delegado Nelson.

 

III. PRELIMINARES LEGAIS.

 

III. a) Das tentativas frustradas à fraude.

 

O requerimento de instalação...”

 

O SR. ESTILAC XAVIER (Questão de Ordem): Como proponente da leitura da Declaração de Voto da nossa Bancada, e dado que são 20h05min e que a declaração contém 110 páginas e, pelo cálculo que eu fiz aqui, nós levaríamos em torno de 200 minutos para ler, pelo ritmo que estão indo, a Bancada se satisfaz dando a Declaração de Voto por lida e anexada aos autos. Então, Sr. Presidente esta é a Questão de Ordem que gostaria de apresentar.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): À luz do que dispõe o art. 177, parágrafo único, do nosso Regimento, eu defiro o Requerimento de V. Ex.ª uma vez que é uma manifestação de vontade do autor. Se o autor entende que a matéria pode ser considerada lida e juntada aos autos, assim será procedido. Defiro o requerido por V. Ex.ª em Questão de Ordem e determino à Diretoria Legislativa que anexe, nesse processo, toda a documentação, no momento nas mãos da Sr.ª 1ª Secretária da Casa, que, até o presente momento, de forma muito exaustiva, vinha cumprindo com as suas tarefas, que, obviamente, necessitariam cerca de dez vezes mais tempo, porque penso que, até o presente momento, estaríamos pela página 14 ou 15. V. Ex.ª deseja fazer uma Questão de Ordem, Ver. Estilac Xavier?

 

O SR. ESTILAC XAVIER: Sr. Presidente, é uma rápida justificativa, não sei como enquadrar regimentalmente. Fiz isso em respeito aos funcionários, a V. Ex.ª, aos Vereadores que ficaram, pois essa leitura seria exaustiva. Então, considerando os Vereadores que estão aqui presentes, o Ver. João Antonio Dib, o Ver. Luiz Braz, o Ver. Humberto Goulart, a nossa Bancada, o Ver. Cassiá Carpes, o Ver. Raul Carrion, o Ver. Beto Moesch, também a Diretoria Legislativa, o Ver. Isaac Ainhorn, os funcionários, eu fiz isso, pois acho que seria extremamente exaustivo para todos; poderíamos até usar isso, mas não contribuiria para o bom andamento dos trabalhos desta Casa. Está registrada a nossa posição. E eu estou-lhe informando, Sr. Presidente, que, tendo em vista a votação ter consistido em 10 votos “não” e 12 votos “sim”, nós vamos entrar com pedido de renovação de votação no momento oportuno.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): V. Ex.ª poderá dispor.

 

O SR. JUAREZ PINHEIRO: Sr. Presidente, embora o nosso Líder já tenha falado, e, quando fala o Líder, os liderados tem de se dar por satisfeitos, eu quero salientar aqui, num momento importante desta Casa, a figura de V. Ex.ª, que fez com que a paixão dos debates não superasse a obrigatoriedade que nós temos com o cumprimento da lei e do Regimento. V. Ex.ª segurou a situação e honrou esta Casa. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Pujol): Estou grato a V.Ex.ª pela sua manifestação, ainda que não regimental. Uma vez que não dispomos de mais condições e de quórum para encaminharmos as outras matérias que deveriam ser objeto de deliberação da Casa, damos por encerrada a presente Sessão.

 

(De acordo com o que foi determinado pelo Sr. Presidente, o restante da Declaração de Voto dos Srs. Vereadores Estilac Xavier, Helena Bonumá, Juarez Pinheiro, Maria Celeste, Maristela Maffei, Raul Carrion e Sofia Cavedon, foi considerada como lida, sendo anexada aos Anais.)

 

Continuação da Declaração de Voto: ...da CPI da Segurança data de 21 de março de 2001 com originalmente 13 pontos passíveis de investigação parlamentar. Foi precedido por dois episódios:

 

1. O primeiro foi o pedido de instalação de CPI em meados de 1999, encaminhado pelo Deputado Frederico Antunes (PPB), que pretendia investigar sic: “a) o fato gravíssimo de o Governador ter afirmado que estaria ‘desmontando a cultura da violência institucionalizada’ na Brigada Militar; b) os fatos que envolvem a Secretaria de Segurança no chamado ‘Caso Konrad’; c) os fatos referentes às denúncias de coação e perseguição por divergências político-ideológicas que estariam ocorrendo na Brigada Militar, a servidores públicos; d) o fato grave de o Comando da Brigada Militar estar emprestando apoio, como mera expectadora, a invasores de propriedades rurais e urbanas, a ideologização e partidarização da Corporação Militar Estadual, com sua progressiva transformação em milícia do partido do governo e o reflexo que toda essa crise vem gerando na qualidade da prestação dos serviços de segurança pública à comunidade gaúcha.” Apesar da fragilidade de argumentos do texto, indignos de constarem num requerimento para instituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, o animus não arrefecia, pelo contrário, conforme demonstra a “tradicional antecipação de pauta política” da página 10 de um conhecido veículo meio jornalístico, em mensagem curta e direta: “De volta da França, o deputado Frederico Antunes (PPB) retoma o debate sobre a constituição de uma CPI para a Segurança.” (ZERO HORA, 28 de maio de 2000)

 

2. O segundo episódio foi a fraude nas assinaturas de parlamentares para instalação da nova ou quem sabe a mesma CPI. No que toca ao conteúdo, também refletia a mesma fragilidade ou ausência de fatos “determinados” da primeira tentativa de 99, cujo texto em parte, somos forçados a transcrever: “Constitui fato determinado, a que se refere o art. 56, § 4º, da Constituição do Estado, combinado com o art. 83 e seguintes do Regimento Interno da Assembléia Legislativa (Resolução n° 2288/91), que autoriza o pedido de instituição de uma COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO a situação de insegurança pessoal e patrimonial da maioria dos habitantes do Estado do Rio Grande do Sul, decorrente fundamentalmente da (1) ausência de uma política pública de segurança; da (2) desestruturação do aparelho policial; da (3) quebra de hierarquia na polícia civil e militar; das (4) rebeliões na FEBEM e nos presídios, onde os criminosos se organizam acima da lei e das autoridades; (5) das tentativas de fugas no sistema carcerário; do (6) aumento do número de assaltos a bancos, farmácias, lotéricas, ônibus e taxistas, furtos, roubos e homicídios e das continuadas e repetidas (7) invasões a propriedades, rurais e urbanas, com o apoio velado de agentes públicos e omissão na repressão dessa invasões e de invasões de próprios públicos, inclusive faixas de domínio de rodovias.”

 

3. Em que pesem as inovações jurídicas e gramaticais dos dois requerimentos anteriores, digna de nota é a sobreposição de ambos, numa adição de pontos a serem investigados, de tal maneira que, mesmo na atual CPI da Segurança se fez ouvir, nas vozes de alguns parlamentares, a lembrança de indagações repetitivas como as de quebra de hierarquia, que no plano formal, não fazem parte do rol de “fatos determinados” passíveis de investigação. Não poderia ser esquecido também que a atual CPI, como visto, foi mera formalização de uma idéia de ataque a uma das áreas de administração do Governo, permeada por investidas pessoais contra o titular da pasta e do caráter político de que o instrumento de investigação parlamentar veio a se revestir no atual contexto. Neste sentido a nota publicada na coluna de Armando Burd:

 

“Tarólogo

 

Deputado João Luís Vargas, do PDT, prevê que, apesar das amabilidades iniciais entre Governo e oposição, ao final da CPI, certamente, os deputados pedirão o impeachment do Secretário José Bisol.” (Correio do Povo, p. 4, em 19 de abril de 2001)

 

4. Em 18 de abril de 2001 a CPI da Segurança, com um requerimento mais robusto em linhas que os anteriores - mas ainda carente de fatos determinados, e ao qual a bancada do governo não aderiu - foi instalada pelo Presidente da Assembléia Legislativa.

O requerimento original pode ser dividido em cinco (5) títulos, que serão desenvolvidos na parte IV deste relatório.

1)      DESESTRUTURAÇÃO DO APARELHO POLICIAL, subdividido em 8 “fatos determinados”;

2)      DESPROPORÇÃO ENTRE O NÚMERO DE OCORRÊNCIAS E DE INQUÉRITOS POLICIAIS;

3)      EMPREGO DE TÉCNICAS ILÍCITAS DE ESPIONAGEM:

4)       FUNDO ESPECIAL DE SEGURANÇA PÚBLICA – FESP

5)      EMPRESAS DE SEGURANÇA PRIVADA

Na data de 21 de abril de 2001, no programa “Os Gaúchos e o Rio Grande” na Rádio Gaúcha, o Secretário de Justiça e da Segurança, José Paulo Bisol, fez declarações que embasaram um aditamento ao requerimento inicial da CPI com o objetivo de:

“Apurar a existência de corrupção no âmbito da Secretaria de Justiça e Segurança e órgãos vinculados, bem como o envolvimento de Delegacias de Polícia com o crime com a finalidade de identificar a prática de fatos delituosos e irregularidades administrativas e seus respectivos autores e/ou responsáveis”

 

III.b) Do parecer da Procuradoria da Assembléia Legislativa

 

Em seu parecer, posteriormente aprovado pelo Presidente da Assembléia Legislativa, a Procuradoria da Casa entendeu por objeto da CPI da Segurança como sendo aquele constante do último parágrafo do requerimento inicial:

“...estabelecer as causas do aumento dos níveis da criminalidade no Estado, das insistentes notícias do desaparelhamento dos órgãos policiais e da incapacidade do Governo em atender às necessidades elementares de segurança da população do Estado, bem assim identificar as autoridades que, por ação ou omissão no cumprimento dos seus deveres, dão causa à situação existente para o fim de promover sua responsabilidade, criminal ou civil.”

Destacou ainda o parecer da Procuradoria, “...que alguns dos fatos relacionados no requerimento n° 02/2001 dizem respeito com atribuições específicas do Poder Executivo de estabelecer, por seus critérios próprios de oportunidade e conveniência (mérito administrativo) a estrutura de órgãos públicos estaduais.”

 

Neste caso, em relação ao mérito administrativo, as autoridades públicas investigadas não estariam sujeitas à qualquer punição, criminal ou civil, desde que tenham atuado dentro do âmbito dos critérios de oportunidade e conveniência. São estes os casos elencados nos pontos: 1.1) determinação de transferência de atribuições do DEIC para delegacias de não-especializadas; 1.2) introdução do termo circunstanciado pela Lei Federal 9.099/95; 1.3) fechamento de delegacias regionais de polícia. Deste modo, como bem ressalta o parecer da Procuradoria do Legislativo, a discussão quanto ao mérito administrativo refoge à competência constitucional das comissões parlamentares de inquérito.

Nos pontos acima destacados só pode haver investigação se os atos foram praticados em discordância com as formalidades legais ou se provenientes de autoridades incompetentes.

No que diz respeito ao item, 1.7) iminência de greve, opinou a Procuradoria da Casa Legislativa que não merece ser objeto de investigação, restando prejudicado, pelo fato de poder vir a ser uma conseqüência dos demais fatos investigados além de ser uma decisão apenas dos servidores e não da Administração Pública.

 

III.c) CPI sem regras e sem lei

 

A Comissão Parlamentar de Inquérito, como figura prevista no art. 56 da Constituição do Estado deve pautar-se pelas regras normais aplicáveis a qualquer órgão público colegiado e pelas normais comuns as demais comissões da Assembléia Legislativa, previstas em seu regimento Interno. Ou seja, suas decisões devem ser tomadas por maioria, com a existência de um orgão de secretaria e com isonomia entre seus membros. Não foi o que se notou na condução dos trabalhos. Senão vejamos os principais casos:

 

1. O Relator realiza diligências e visitas "surpresas" avisando imprensa, mas não os integrantes petistas da CPI. O caso se verificou na visita ao Instituto Geral de Perícias, no Centro Integrado de Operações de Segurança Pública e em algumas Delegacias de Porto Alegre. Apesar da cobertura da imprensa, previamente agendada, e de alguns deputados da oposição, o Relator deixou de comunicar os demais membros da CPI, especialmente da bancada petista.

 

2. Todas as divergências quanto ao regimento são apreciadas através de “questões de ordem”. A direção dos trabalhos pela presidência da CPI, que facilitou e por vezes estimulou esta conduta foi extremamente parcial na condução de tais discussões, deixando de manifestar qualquer decisão nos casos em que isto era necessário e por vezes cortando a palavra de deputados, dando por resolvida a questão pela manifestação dos parlamentares, sem sequer adentrar-lhe o mérito.

 

3. Como publicamente denunciado pela bancada do governo que testemunhou o fato, delegados, ex-delegados, pseudo-assessores que serviram como testemunhas e até mesmo jornalistas tiveram acesso à sala reservada da CPI, onde estavam sendo estudados documentos fiscais, bancários e telefônicos que deveriam ser sigilosos.

 

4. Quando do depoimento do Sr. Daniel Verçosa, que teve seu sigilo telefônico e bancário transferido pelo Judiciário para a CPI, o Relator passou a inquiri-lo, publicamente, sobre suas movimentações financeiras e ligações telefônicas, quebrando ilegalmente o sigilo de tais informações.

 

5. A CPI, pelo fato da testemunha Maria Dollores ter um cargo de confiança no Governo do Estado, levantou suspeitas sobre seu depoimento e não pretendia tomar o compromisso legal de dizer a verdade previsto no art. 203 do Código de Processo Penal. Tal fato inusitado foi resolvido com uma inovação jurídica. O presidente perguntou a testemunha se ela queria prestar tal compromisso.

 

6. Silvio Gonçalves, sobrinho de Daniel Verçosa, um dos investigados pela CPI e que possui contra este uma ação trabalhista de mais de R$ 36 mil, por outro lado, foi compromissado como testemunha, embora a intervenção dos deputados da bancada do governo de que, atendendo ao art. 214 do Código de Processo Penal, ele somente poderia ser ouvido como informante.

 

7. Os depoimentos das testemunhas incorreram em quatro aspectos fundamentais que os tornaram em parte, imprestáveis:

 

a) Não foi obedecida uma regra comezinha do direito processual penal: todas testemunhas opinavam sobre tudo, enquanto o art. 213 do CPP é taxativo:

Art. 213. O juiz não permitirá que a testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da narrativa do fato.

 

b) Inúmeras testemunhas trouxeram depoimentos por escrito, o que é vedado pelo art. 204 do CPP:

Art. 204. O depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito.

 

c) O art. 210 do CPP, pelo qual uma testemunha não pode ouvir o depoimento de outra somente teve cumprimento condicionado à manifestação da bancada do governo que obrigava a mesa a cumpri-la. A regra era a observação, pela televisão ou ao vivo, dos demais depoimentos.

 

d) Várias testemunhas foram agredidas moral e psicológicamente. Além do fato de um depoimento de mais de seis horas, após uma espera de igual período em uma sala “reservada” já ser, por si só uma agressão, alguns termos como “picareta”, “covarde” e “mentiroso” ilustram os adjetivos desqualificantes utilizados para intimidar e desestabilizar os depoentes.

Um dos fatos mais lamentáveis na história do Parlamento Gaúcho se deu por ocasião do depoimento de Jair Krischke, que simplesmente “ordenou” que uma servidora da Polícia se identificasse sem nenhum amparo legal ou regimental, no que contou com a total compreensão e apoio da Mesa da CPI. Esta situação foi uma das maiores violações da intimidade, dignidade humana, direito de ir e vir e do livre exercício da profissão que a população gaúcha ao vivo teve oportunidade de apreciar.

8. O relator, no episódio de Jairo Carneiro repassou comprovada e assumidamente, a fita de áudio contendo a conversa entre este e jornalistas para o Sr. Jair Kirschke, que, depois, bombasticamente, entregou a fita em seu depoimento, como se fosse o apresentante. Tal ato é absolutamente irregular, pois qualquer prova que chegar as mãos do relator deve ser levado ao conhecimento dos demais Parlamentares, não podendo ser clandestinamente entregue a terceiro. Tal fato levou a bancada do PT a representar contra o relator na Comissão de Ética da Assembléia e a requerer sua destituição do cargo ao Presidente da Casa.

 

9. A aceitação de gravações em que nenhum dos interlocutores assume a autorização para tanto, como no caso de Diógenes de Oliveira, ou a divulgação de fitas quando assumidamente mentirosas, caluniosas e injuriosas, como no caso Jairo Carneiro desrespeitam a jurisprudência uníssona do STF e a Lei Penal, contribuindo o Relator da CPI para a desmoralização deste meio de prova, que mesmo útil e por vezes necessário como único meio de exercício da legítima defesa deve obedecer a parâmetros claros para ser aceitável e confiável.

Tal fato é reconfortado por duas decisões judiciais ao longo da CPI que limitaram a utilização de gravações clandestinas.

 Tais episódios não são de pouca importância. Em uma CPI que teve 46 reuniões e cerca de 160 depoentes, tais regras, longe de ser um mero amor a forma são elementos basilares e comezinhos do direito, e sua não observância fere os princípios do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e a Lei 1.579/52, transformando esta CPI em um verdadeiro Tribunal de Exceção.

 

IV. A INVESTIGAÇÃO MATERIAL DA CPI

 

1ª Parte: Os fatos determinados que instruem a CPI

 

O requerimento que fundamentou a CPI indica seu objeto no último parágrafo, que será o de apurar os fatos que indica para “estabelecer as causas do aumento dos níveis da criminalidade no Estado, das insistentes notícias do desaparelhamento dos órgãos policiais e da incapacidade do Governo em atender às necessidades elementares de segurança da população do Estado, bem assim identificar as autoridades que, por ação ou omissão no cumprimento dos seus deveres, dão causa à situação existente para o fim de promover sua responsabilidade criminal ou civil, nos termos da constituição, das leis e dos interesses da coletividade Riograndense.”

Devemos ter em conta que segundo reiterados pareceres da Procuradoria Legislativa, os requisitos para instituir uma CPI são:

·        Assinatura de um terço de deputados;

·        Prazo certo; (120 dias prorrogáveis por mais 60)

·        Ter fato determinado a ser investigado, e que tenha ele ocorrido em área sujeita ao controle e fiscalização do Parlamento do Estado;

 

Importa recordar que segundo as Constituições Federal e Estadual, o resultado da CPI é de fato remeter suas conclusões para o Ministério Público, que tem a prerrogativa de utilizar-se ou não do que foi apurado. Assim, o objetivo declarado nesta CPI, de promover responsabilidade criminal ou civil, já é, de pronto impossível, pois não tem poderes para tal.

 

Os Fatos (In)determinados que deveriam ser Investigados

 

Os 13 itens elencados no requerimento ou não são fatos determinados, ou estão sob área sujeita a controle comum e ordinário do Poder Legislativo, ou seja, via atividade cotidiana de fiscalização Parlamentar, sendo desnecessária uma Comissão Parlamentar para averiguá-los. Posteriormente o requerimento foi aditado para incluir declarações do Secretário de Justiça e Segurança sobre corrupção policial, e embora todos fossem passíveis de esclarecimento e de alguma deliberação o que se viu foi a preferência pela maioria oposicionista pela investigação com caráter partidário e ideológico, pela criação de factóides e versões, mostrando que esta Bancada Petista previu com acerto que a CPI seria muito mais um instrumento de disputa política que de contribuição para estudar e diminuir os crimes no Estado. Não se deixará, porém, de enfrentar as 13 alegações apresentadas, assim como o resultado apurado por esta Bancada:

 

 DOS ITENS DO REQUERIMENTO ISOLADAMENTE CONSIDERADOS

 

1) Desde a sua criação, o departamento estadual de investigações criminais (DEIC) e respectivas delegacias especializadas vinham mantendo nível razoável de combate à chamada criminalidade violenta. a partir de julho de 2000, a determinação de transferência dessas atribuições para delegacias não-especializadas, vem ocasionando acréscimo à impunidade, em virtude da dificuldade e desaparelhamento destas últimas para a investigação criminal. a situação chegou a tal ponto que membros do ministério público que atuam na vara do júri da capital denunciaram publicamente a falta de qualidade dos inquéritos policiais elaborados por delegacias distritais, inviabilizando o trabalho da justiça.

 

De início, cabe o destaque de que, no plano conceitual, não há nexo entre a suposta transferência de atribuições do DEIC às Delegacias Distritais e o aumento de impunidade alegado neste primeiro item do requerimento.

Em segundo lugar cabe elucidar o que seriam as atribuições e estrutura do DEIC para a seguir cogitar-se da “suposta” transferência de atribuições e a maneira como tal se deu, se é que de fato houve. A seguir, cabe ainda uma rápida análise do que seja “nível razoável de combate à chamada criminalidade violenta” efetuada pelo DEIC e Delegacias Especializadas, conforme alega o requerimento da CPI. Por último a atual situação do DEIC tal como estabelece o mais recente Decreto sobre o tema.

 

a) Das atribuições do DEIC:

O DEIC foi criado em 13 de março de 1997 pelo Decreto n° 37.299 com a seguinte competência: “...coordenar, fiscalizar e executar as atividades de polícia judiciária e de investigações no território do Estado do Rio Grande do Sul, na apuração de infrações penais decorrentes da ação de bandos ou quadrilhas, com atividades em mais de um município, região ou Estado, sem prejuízo da competência de outros órgãos policiais especializados.” (art. 1º)

Como dito, as atribuições do DEIC e de seus órgãos devem ser simétricas à sua finalidade: apuração de infrações penais decorrentes da ação de bandos ou quadrilhas. Na medida em que tais atribuições não se coadunem com o seu fim estas devem ser repensadas e a estrutura física e de pessoal melhor aproveitada, já que tratamos neste caso específico de uma estrutura da Polícia Civil com circunscrição territorial que abrange todo o Estado.

Deste modo, todas as atribuições do DEIC são decorrentes desta competência maior, consubstanciada na apuração de infrações penais decorrentes da ação de bandos ou quadrilhas. Os dispositivos do Decreto de 1997 que criou o DEIC, no que respeita a delimitação de atribuições de seus próprios órgãos, são incoerentes.

Um exemplo é o caso da Divisão dos Crimes de Furto e Roubo de Veículos que, na conformidade original, dirige duas Delegacias Especializadas: uma de Roubos e outra de Furtos de Veículos. Busca-se ainda a explicação de como um mesmo fato: a subtração de um veículo, seja ela feita sob violência ou grave ameaça ou ainda sem coação alguma, se converta em argumento forte o suficiente para a criação de duas Delegacias especializadíssimas e que, além de tudo, abranjam todo o Estado. Isto se desconsiderarmos que, na Divisão de Crimes contra o Patrimônio, teríamos ainda mais duas Delegacias correlatas ao tema dos veículos: uma com incumbência de reprimir os crimes de roubo a veículos de empresa de transporte de valores (1ª Delegacia de Roubos) e outra com atribuição de reprimir os crimes de roubo em veículos de transporte de cargas (4ª Delegacia de Roubos), ambas, como as outras, com circunscrição territorial a abranger todo o Estado.

Outro exemplo consiste na competência estabelecida para a 2ª Delegacia de Homicídios: prevenir e reprimir os crimes de infanticídio e aborto, bem como executar outras tarefas correlatas. É impensável, ao menos enquanto viger o atual Código Penal, cogitar-se de bando ou quadrilha composta por mais de três mães para, em associação, “matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após.” (CP arts. 123 e 288).

Só de Delegacias Especializadas chegamos a impressionante marca de dezoito (18) delegacias na estrutura do Departamento de Investigações Criminais. A Delegacia de Delitos contra a Fazenda Estadual é emblemática: dispunha tão somente de um funcionário e de um Delegado responsável, ambos recebendo para dar, na medida do possível, um ótimo encaminhamento para o nada, que era o máximo que uma estrutura de pessoal deste montante poderia fazer. O que deve ainda ser esclarecido é que só em substituições, pagas para que um Delegado responda por mais de uma Delegacia, desde 1997 gastou-se o equivalente a R$ 3,7 milhões.

Os exemplos acima são apenas o indício da existência de uma estrutura recheada de atribuições sobrepostas e megalômanas que, se algum dia saíssem do papel em sua inteireza, implicariam no fechamento de várias Delegacias do Interior para que as atribuições do DEIC tivessem um mínimo de efetividade. (ver ANEXO)

Manter-se tal estrutura nos moldes em que foi projetada só poderia resultar no abandono das Delegacias Regionais Metropolitanas, num primeiro momento, das Delegacias Regionais num segundo e nas demais delegacias do interior do Estado em uma terceira e definitiva ocasião.

 

c) Da “suposta” transferência de atribuições do DEIC:

Ao contrário do que diz o requerimento não houve transferência de atribuições para as Distritais em julho de 2000. O que aconteceu nesta época, mais precisamente na data de 11 de agosto de 2000, foi a edição de uma Portaria da Chefia de Polícia de n° 126 que, na medida do possível tentou pôr um mínimo de ordem no caos. Fez-se isto a partir da adoção de algumas condutas bem simples.

A primeira consiste na imediata comunicação ao DEIC, pelos meios disponíveis, de infrações penais de maior impacto (furto, roubo e receptação de veículos, roubos a banco, carros-forte, extorsão mediante seqüestro, dentre outras) pelas autoridades policiais e seus agentes, sem prejuízo das medidas adotadas. A comunicação deverá mencionar os dados conhecidos até o momento.

A segunda estabelece que cabe ao titular da Delegacia Especializada decidir sobre a conveniência e oportunidade de apoiar, acompanhar ou avocar os trabalhos persecutórios ou investigatórios relativos ao fato comunicado. Trata-se de questão relativa ao mérito administrativo que nem necessidade tinha de vir expresso em Portaria, posto que mandamento de Direito Administrativo, aliás, conforme a própria Procuradoria da Assembléia Legislativa, não pode ser objeto de investigação.

A terceira linha de conduta, detalhando os termos da diretriz anterior dispõe que, não havendo momentânea conveniência ou disponibilidade do DEIC em apoiar, acompanhar ou avocar os atos persecutórios ou investigatórios, caberá ao órgão policial que originou a comunicação enviar ao DEIC, em 24 horas, relatório dos fatos conhecidos e apurados dentre outros elementos relevantes. O relatório deverá ser atualizado se, após encaminhado ao DEIC, surgirem novos elementos. Cabe ainda ao DEIC estabelecer com as Delegacias Regionais e Distritais um sistema integrado de informações.

A quarta diretriz simplesmente estabelece aos órgãos do DEIC novas atribuições e fixa prioridades em relação às atribuições originais e não o que tem sido sobejamente alardeado. Ao contrário, o que se verifica é o tratamento prioritário daquilo que o art. 1º do Decreto de 1997 dispunha, ou seja, atuação prioritária nos crimes cometidos por bando ou quadrilha, além do atendimento prioritário de outras situações de vulto como a captura de evadidos do Sistema Penitenciário pela Delegacia de Capturas, controle dos casos de homicídios e desaparecidos. Corrigiram-se também algumas distorções somando-se as investigações de furto e roubos de veículos em uma única Delegacia, além da criação da Delegacia de Crimes contra a Fazenda Estadual, Meio Ambiente e Saúde.

Como visto, em momento algum houve transferência de atribuições do Departamento Estadual de Investigações Criminais para as Delegacias de Distritais, houve isto sim, um ordenamento de suas atividades e o estabelecimento de atuações prioritárias no leque de suas atribuições e competências legalmente instituídas.

 

d) Do “nível razoável” de combate à criminalidade:

Cabe aqui um destaque a respeito deste culto à especialização cujo resultado mais venerado é o Departamento Estadual de Investigações Criminais. A departamentalização das atividades policiais merece extremo cuidado principalmente quando se trata da criação de um órgão policial com atribuições investigativas que abrangem toda uma unidade da Federação como é o caso.

A atividade policial deve ser norteada para o atendimento das necessidades da população com um todo. Neste sentido as atividades periféricas da Polícia Civil, por suas Delegacias e agentes, são as que merecem tratamento privilegiado. Tanto melhor que um crime ocorrido em uma distante cidade do interior do Estado seja lá resolvido. Na impossibilidade de que tal venha a acontecer aí sim é que se faz necessária a atuação de uma força policial supletiva da atuação das Delegacias Distritais. No caso de extrema impossibilidade de resolução dos crimes por seus próprios meios é que a atuação de um órgão policial especializado deve ser substitutiva, procedendo-se assim a avocação do Inquérito Policial da Delegacia Distrital.

Por outro lado, a mera existência de um órgão central com atribuições “exclusivas” já de pronto impossibilita a atuação dos demais órgãos policiais, Delegacias Distritais, por exemplo. Trocando em miúdos, a existência de uma atribuição exclusiva do DEIC, se levada a extremos significa um “não fazer” ou simplesmente “deixar de fazer” das Delegacias Distritais em nome da inatacável atribuição exclusiva do DEIC.

O que deve ser entendido é que a grande maioria das Delegacias Distritais não são especializadas logo, têm ampla atribuição no que respeita a atividade persecutória e investigatória de infrações penais. As delegacias e demais órgãos especializados existem e só devem existir por exceção. Além do que, cabe ainda a velha máxima: um especialista é aquele sujeito que sabe cada vez mais sobre cada vez menos.

Não há que se falar de “acréscimo a impunidade”, pois nunca houve “combate a impunidade”. De fato, como meio eficaz de combate ao crime, os números do DEIC deixam a desejar: para ele eram encaminhados 70% dos casos de furtos e roubos registrados na Capital, mas apenas 5% deles eram examinados, e um percentual ainda menor era esclarecido. Agora, o DEIC pode se dedicar apenas a casos de difícil solução, e a população terá mais acesso às delegacias dos bairros onde ocorrem os crimes comuns e de autoria desconhecida, podendo cobrar a solução destes e informar os agentes. As distritais ainda foram reforçadas com 24 viaturas e mais de 70 agentes, possuindo plena capacidade de operação e de dar uma melhor resposta à comunidade.

e) A atual conformação do DEIC:

Hoje em dia, o Departamento de Investigações Criminais, a partir de alterações no Decreto em 17 de setembro de 2001, passou a contar com sete Delegacias Especializadas, melhor equipadas, com mais servidores e com melhor desempenho.

Enxuta e operacionalmente mais eficaz, o que se busca, nos moldes da atual estrutura é:

 Primeiro, extinguir, no plano estadual e mais especificamente no DEIC, a famosa indústria das substituições, que onera em demasia os cofres públicos como contrapartida ao comprometimento de funções de Delegados que se vêm obrigados a responder por mais de uma Delegacia ou Órgão policial;

Segundo, fazer com que o DEIC retorne aos seus objetivos, traçados já no art. 1° do Decreto que o instituiu, ou seja, a investigação e persecução dos crimes cometidos por quadrilha ou bando, dispensando-se excessivas departamentalizações ou criação de estruturas inúteis, algumas das quais especializadas na investigação de crimes que nunca poderiam ser cometidos por quadrilha ou bando, com é o caso do infanticídio, por exemplo;

Terceiro, estabelecer prioridades de atuação dando maior ênfase à especializadas até então no papel como é o caso da Delegacia Fazendária;

Quarto, fazer com que o DEIC, departamento estadual que é deixe de ser o rescaldo das Distritais de Porto Alegre para desempenhar o seu verdadeiro papel que é o de atuação supletiva em casos de todo o Estado na resolução de crimes com autoria desconhecida.

 

2) A contenção da criminalidade considerada de baixo potencial ofensivo, regulada pela lei federal n° 9.099/95, que introduziu o ato de polícia judiciária na matéria, denominado de termo circunstanciado (art. 69), vem tendo da polícia civil, segundo dados disponíveis de seus relatórios, o seguinte desempenho, desde então, pelas médias anuais respectivas,

1996 a 1998               1999 a 2000               incremento

68.173                        149.352                      119,00%

a explicar a atual dedicação quase exclusiva da polícia judiciária aos chamados delitos de bagatela, em detrimento dos crimes violentos, para o que é indispensável a qualificação de seus meios humanos e materiais.

assim, nos últimos dois (2) anos, a polícia civil entrega-se quase que exclusivamente a atos cartoriais.

 

A introdução do chamado termo circunstanciado pela Lei 9.099/95, longe do que quer deixar transparecer o requerimento, veio na esteira de longo debate acerca de um dos aspectos lembrados, qual seja, a excessiva burocratização da atividade policial. A finalidade legal, neste mister, é a de conferir aos Juizados Especiais Criminais, princípios outros na busca de tramitação mais célere em relação aos crimes cuja pena seja inferior a um ano e às contravenções penais, na busca da plena efetividade da prestação jurisdicional e não somente eficiência de tramitação.

Os Juizados Especiais Criminais não vieram ao acaso, e além da celeridade buscada, almejam também fazer com que a população não veja no Judiciário um estranho e distante Poder, pois constituiram-se, também, os Juizados em palco conciliatório de resolução de conflitos inovando no papel de todos os envolvidos com destaque para o desempenhado pelo Ministério Público.

No art. 69 da lei é que o termo circunstanciado é referido, nos seguintes termos:

 

Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se a requisição dos exames periciais necessários.

 

Termo circunstanciado é peça informativa do procedimento judicial especial, assim como o Inquérito Policial também o é no procedimento ordinário criminal. Não é de se conferir ao procedimento especial previsto para os Juizados Especiais Criminais o mesmo entendimento conferido aos demais procedimentos judiciais, dado os princípios que informam àquele como a oralidade, celeridade e economia processual. Tal assertiva tem aplicação no todo da Lei e especificamente no que toca ao termo circunstanciado isoladamente considerado. O TC não deve ser visto com os mesmos olhos que enxergam o Inquérito Policial pois em assim procedendo estar-se-ia fortalecendo a chamada interpretação retrospectiva, vendo-se o novo com olhos tão antigos de maneira que ele não venha a inovar em nada.

O Termo Circunstanciado é um procedimento simplificado para crimes com pena prevista em até 1 ano, de produção imediata e sem necessidade de oitiva de testemunhas, sendo o caso encaminhado diretamente para apreciação do Judiciário. O problema da burocratização da atividade policial é outro e bem mais antigo que a introdução do TC no ordenamento penal. Tratá-los como sinônimos ou ainda buscar em um as razões do outro é enxergar as questões com olhos míopes e preconceituosos. O problema da burocratização da atividade policial e mais especificamente das Delegacias é bem mais antigo e deve ser tratado na observância de duas tendências opostas:

A primeira, confunde-se com a própria disseminação do conceito de Estado Burocrático, que diga-se, não é conceito novo. A própria existência em décadas um pouco mais distanciadas, no plano Federal, de um Ministério da Desburocratização já é disto bom exemplo. O fenômeno burocrático afeta também a atividade policial, principalmente no que tange aos aspectos investigativos desta atividade. Tudo, desde escutas telefônicas autorizadas judicialmente até oitiva de testemunhas, passando-se ao cumprimento de mandados de busca e apreensão, tem de ser documentado, reduzido a termo. Os meios de combate ao crescimento desta tendência passam, necessariamente, por toda uma alteração na legislação penal e processual de modo a permitir que alguns dos atos policiais e processuais penais possam ser suprimidos ou feitos de outra forma, mas sem prejuízo do devido processo legal; e ainda, de outro lado, em termos operacionais, destinar à atividade cartorial da polícia pessoal especializado neste tipo de serviço sem que haja prejuízo das atividades externas, o dito policiamento de rua.

A segunda tendência, oposta a primeira, se assenta na constatação de que os Órgãos de Segurança Pública, notadamente as Delegacias de Polícia, constituiram-se, com o passar do tempo, no primeiro cartório à disposição da população. Os Órgãos policiais, desde algum tempo, não têm atividade exclusivamente de caráter criminal. Em grande parte os registros de ocorrência em Delegacias tratam de questões cíveis como perda de documentos, registros de abandono de lar, sinistros ocorridos no lar etc, são atividades típicas de Cartórios de Títulos e Documentos. Esta tendência só pode ser contraposta com a progressiva eliminação destas atividades, correndo-se o risco de negar-se à população o exercício de direitos inerentes à cidadania.

No equilíbrio destas duas tendências é que deve ser pautada a discussão em torno da burocratização da atividade policial, este sim, tema passível de análise de uma CPI que se pretenda da Segurança Pública. Neste aspecto, toda a política do atual Governo, seja no tocante às Polícias Civil e Militar, seja em relação ao IGP, é a de fixar o menos possível de servidores em atividades meramente cartoriais e dar ênfase à sua atividade fim: atividade policial de rua, ostensiva de um lado, investigativa de outro.

Por sua vez, na hipótese de vingar a tentativa de relacionar o surgimento do TC com a atividade cartorial da Polícia Civil, dois tópicos precisam ficar esclarecidos.

O primeiro diz respeito à simples questão de tratar-se de uma legislação federal impositiva, cogente, obrigatória de todos os Estados Membros. A única e remotíssima hipótese em que se afiguraria louvável a experiência de uma Comissão Parlamentar de Inquérito em relação ao presente tema é na possibilidade de legislar o parlamento gaúcho sobre o tema, hipótese que não se apresenta. Na melhor das perspectivas surgiria daí um projeto de lei dirigido ao Legislativo Federal extinguindo ou alterando a legislação penal no tocante aos Juizados Especiais Criminais.

 O segundo tópico, este sim observável no que tange à política do Executivo Estadual relativa ao tema em destaque, é a nada reprovável introdução da possibilidade de feitura do TC pela Brigada Militar. Em gesto que vem ao encontro dos anseios dos parlamentares signatários do requerimento da CPI da Segurança Pública, o Governo do Estado, pela Secretaria da Justiça e da Segurança, em observância aos princípios estampados na legislação federal entendeu que “Autoridade Policial” não é tão somente Delegado de Polícia, mas todo aquele que venha a estar investido do Poder de Polícia. O que é de lamentar é que os cidadãos que reclamam da atividade burocrática da PC, impulsionada, segundo eles, pelo surgimento do TC, são os mesmos que, ecoam vozes em torno da impossibilidade de feitura de termo circunstanciado pela Polícia Militar.

Segundo o Superior Tribunal de Justiça, não há ilegalidade em se delegar poderes à Polícia Militar para a feitura de TCs quando da impossibilidade de estes serem feitos pela Polícia Civil. O único passo que poderia ser dado em relação a uma solução do tema é o encaminhamento dado pela Secretaria de Justiça e da Segurança do Estado, haja visto que a própria Lei disciplina as possibilidades de uso do TC. Caso tal procedimento não possa ser feito nos limites impostos pela lei, aí sim é que a PC tem inteira prerrogativa para a feitura dos demais procedimentos a ela inerentes como é o caso do Inquérito Policial.

Óbvio que uma discussão de tamanha envergadura, nem de longe foi realizada pelo Parlamento por ocasião da CPI da Segurança.

 Cabe aqui um comentário a respeito do tema investigado pela CPI no que tange aos índices. A primeira vista a única observação que pode ser feita é de caráter elogioso, pois se demonstra, pelos números, que a PC gaúcha, no mínimo, está cumprindo a legislação federal. Por outro lado, esquecem os parlamentares, talvez por desconhecimento, que a narrativa sucinta de um TC, quando em juízo, pode resultar em interpretações diversas, como, por exemplo, uma nova classificação de ilícito, resultando assim na substituição do TC originário por um Inquérito Policial. Desta forma, nos dados crus fornecidos e utilizados pelo Legislativo, não há possibilidade de uma tal conjectura. Maiores considerações a esse respeito serão feitas adiante quando da análise da desproporção entre número de Ocorrências e Inquéritos Policiais. Nem há, por outro lado, sequer um relance de possibilidade de crescimento dos crimes de baixo potencial ofensivo. Não se observa, também, para que se permita a conclusão da dedicação “quase que exclusiva, da Polícia Civil a atos cartoriais”, o número atinente aos feitos relativos à chamada criminalidade violenta. E como é sabido, onde não há comparação, não se pode falar em crescimento ou decréscimo de atividade alguma.

Por último, cabe o destaque de que, nas Delegacias a autoridade máxima ainda continua sendo o Delegado e, salvo nas hipóteses de determinação superior, que no caso em tela não se vislumbra, têm estas autoridades, respeitadas as limitações de estrutura, ampla possibilidade de escolha do que, quando e como. Desta forma, o gesto de privilegiar-se a investigação de um determinado tipo de ilícito em detrimento de outro deflui, sempre, da autoridade responsável, não servindo os números em epígrafe, aliás de onde nem se sabe a fonte, como fator responsável pela ausência ou falta de investigação dos chamados crimes violentos.

 

3) Sucateamento do instituto geral de perícias, denunciado por especialistas e entidades representativas do setor, em março de 2001, com a acumulação de mais de cinco mil armas aguardando perícia no departamento de criminalística, sem qualquer segurança; inviabilização de perícias de incêndio; denúncia de manipulação de laudos feita pelo sindiperícia perante a comissão de serviços públicos desta assembléia legislativa.

 

Para que uma instituição venha a ser “sucateada” presume-se que esta seja dotada de uma estrutura suficiente para que ao menos possa ser dado início ao processo de “sucateamento”. Não se pode sucatear aquilo que não tenha estrutura. Desde a sua criação pela Constituição Estadual de 1989, em nenhum momento teve o IGP condição suficiente para que fosse sucateado; aliás, somente no ano de 1997 é que passou a ter dotação orçamentária própria.

O item correspondente às 5.000 armas no aguardo da realização de perícia, levantado pelo requerimento de instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito, corresponde a apenas uma parcela de um universo de perícias acumuladas e não realizadas decorrentes da deficiência estrutural e do quadro de funcionários do IGP.

Para que se tenha uma idéia, o número de trabalhos pendentes de anos anteriores somados ao do mês de dezembro de 2000, no setor de engenharia legal era de 1398, no setor de levantamento de locais, 1952 e no setor de documentoscopia forense 1306.

No que respeita ao ponto específico da balística forense o número de trabalhos pendentes de anos anteriores, somados ao do mês, em dezembro de 2000, alcança a soma de 4.764 (quatro mil setecentos e sessenta e quatro) perícias, sendo que 3796 (três mil setecentos e noventa e seis) correspondem aos anos anteriores até 1999:

 

Dezembro 2000: mês + anos anteriores = 4764

             Anos anteriores até 1999 = 3796      

 

Neste quadro, pouco mais de 10 peritos no setor de balística (sendo 8 efetivos em dezembro 2000), realizam uma média de 115 perícias ao ano e 11,31 perícias/mês.

No que diz respeito à segurança, não só do material a ser periciado como também do corpo funcional do IGP, após procedimento licitatório, foi contratada uma empresa de vigilância especializada para atender o Instituto, vez que, ao contrário do que foi ventilado na CPI por alguns dirigentes sindicais, à Brigada Militar compete o policiamento ostensivo e não a vigilância específica de um dos Órgãos vinculados à SJS.

É de frisar que, anteriormente ao procedimento de licitação, os departamentos e laboratórios do IGP remeteram à Secretaria de Justiça e Segurança os seus pleitos e, possivelmente, o Diretor do Departamento de Criminalística solicitou somente dois vigilantes, porque à época este número seria suficiente.

A demora das perícias de incêndio, abstraindo-se a situação geral do IGP, têm origem, basicamente no reclamo das Seguradoras Privadas que, escudando-se na existência de um Órgão estatal de perícias, satisfazem ali, gratuitamente, os seus anseios por laudos positivos de incêndio criminoso na busca de escape da remuneração devida a título indenizatório para os seus segurados.

Não prosperou a alegação de manipulação de laudos noticiada no requerimento da CPI, talvez pela inexistência ou ainda, quem sabe, porque todas as denúncias de irregularidades ou ilícitos cometidos por servidor público lotado no IGP, tenham como destino certo a Corregedoria do Órgão, que não se omite na resolução dos feitos.

Além disso, o Governo atual, ciente desta situação, não poupa esforços no sentido de tirar o IGP de sua longa tradição de abandono: alocou no Plano Nacional de Segurança o valor de R$ 3.950 milhões para reaparelhar os departamentos médico-legal, de criminalística, laboratórios e renovação da frota, entre outros investimentos.

Agora está se ultimando um concurso público para a área e efetuou-se a contratação emergencial de 190 profissionais que auxiliarão o trabalho dos peritos, facilitando os laudos e agilizando os serviços. Pela primeira vez está na história está sendo estruturado concurso público para o IGP, com planejamento para que opere em condições satisfatórias.

 

4) Expedição de carteiras de identidade pelo departamento de identificação, sem pesquisa datiloscópica, dando margem a fraudes.

 

A maior possibilidade de fraudes no tocante à expedição de carteiras de identidade não é dada pela astúcia perniciosa de um servidor que, dolosamente, age afrontando a lei, nem tampouco pela falta de estrutura que é de todos sabida. A maior fraude é sobretudo a própria lei que exige como único requisito ao postulante de identificação, ser portador de uma certidão de nascimento ou casamento.

Carece o ordenamento jurídico de um Cadastro Nacional de Identificação Criminal, este sim, sumamente mais importante que o de registro civil. Em que pesem os esforços legislativos para uma unificação dos registros civis no plano nacional, esta nunca saiu do papel. Na atual situação, alguém que percorra o território brasileiro munido de uma certidão de nascimento qualquer, terá amplíssimas possibilidades de conseguir um RG por Estado-Membro. Não é preciso ser líder sindical ou parlamentar para lograr êxito neste intento, basta a vontade.

Excluindo-se estes limites estruturais impostos pela lei, aí sim é que se pode incursionar pelas demais circunstâncias que, ao longo do tempo, permitiram que a situação chegasse ao ponto encontrado no início de 1999. A evolução do número de servidores ao longo dos anos é bem ilustrativa. (ver ANEXO)

O deficitário quadro de servidores observado através da história do IGP talvez fosse suficiente para dar conta da expedição e controle das carteiras de identidade, todavia não é só esta atribuição que cabe ao Departamento de Identificação. Além da emissão de carteiras de identidade, em torno de 55.000 ao mês, incumbe ao DI: emitir atestados e folhas de antecedentes; realizar pesquisa de post mortem; efetuar o cadastramento criminal; possibilitar a identificação de cadáveres através de busca técnica e confronto de impressões digitais em casos especiais como acidentes, morte por crimes ou dúvidas quanto à identidade; realizar coletas externas de impressões digitais em residências, hospitais, presídios, casas geriátricas etc, tanto para emissão de carteiras de identidade como para fins de investigação; prestar informações para diversos órgãos; emitir laudos de confirmação de identidade...

Fora os obstáculos causados pelo decréscimo de servidores em contraposição ao elevado número de atribuições, outras cinco situações singulares são extremamente elucidativas da temática abordada pela CPI:

 

a) Situação 99

Entre 1988 e 1989, para possibilitar a entrega de Carteiras de Identidade mais rápido, as primeiras vias foram emitidas sem a devida classificação das impressões digitais.

Como o sistema só libera a emissão de carteira após ser digitada a fórmula datiloscópica, esta foi informada com os dígitos 9999/9999, sendo que, posteriormente, as individuais seriam classificadas substituindo-se no sistema a informação prestada (9999/9999) pela fórmula datiloscópica correta, o que não ocorreu devido à grande quantidade de serviço existente, associada à insuficiência de recursos humanos.

O número total da situação 99, como são conhecidos estes casos, é estimado em 450.000.

À medida em que os indivíduos em situação 99 procuram este departamento para requerer a segunda via da carteira de identidade ou o Atestado de Antecedentes, corrige-se a fórmula datiloscópica no sistema. Esta falha, contudo, permite que uma pessoa obtenha a carteira de identidade com o nome de outra, pois não há como confrontar a fórmula datiloscópica atual com a que consta no sistema (9999/9999).

Já foram corrigidos cerca de 300.000 situações 99, estimando-se que restam cerca de 150.000 cadastros 99 para correção.

 

b) Arquivos:

Arquivo DATILOSCÓPICO: É composto de arquivos eletro-mecânicos, em número de 25, onde as fichas individuais são arquivadas pela fórmula datiloscópica. Ali são realizadas as buscas técnicas e pesquisas.

A partir de 1993/1994, cessou definitivamente o arquivamento de fichas individuais no arquivo datiloscópico, devido à falta de arquivos, espaço físico e técnicos papiloscopistas.

Anteriormente a 1999, as fichas individuais geradas pelas identificações e que deveriam ser arquivadas no arquivo datiloscópico, eram armazenadas, sem nenhuma preservação ou ordenação, em caixas de papelão.

Como conseqüência, as buscas técnicas e pesquisas ficavam prejudicadas, pois parte dos indivíduos cadastrados neste Departamento, não possuiam fichas no arquivo datiloscópico, o que impossibilitava sua identificação quando necessário.

A partir de 1999 foi iniciado um trabalho de preservação deste acervo, bem como posterior armazenamento em arquivos de aço.

Arquivo NUMÉRICO: Local onde as fichas individuais são arquivadas pelo número do RG (Registro Geral).

As fichas individuais do arquivo numérico, anteriormente a 1999, também estavam sendo armazenadas em caixas de papelão, devido à falta de arquivo e espaço físico.

Em 1999, a partir da mudança do lay out do local do arquivo numérico, bem como com a doação de arquivos da extinta Caixa Estadual, foi possível implementar um novo sistema de arquivamento no numérico. Este consiste em utilizar o microcomputador para endereçar as individuais em lotes de 100 (cem), possibilitando que se tenha acesso a estas fichas que também estavam amontoadas em caixas de papelão. Já foram arquivadas mais de 1.500.000 (um milhão e meio) de individuais datiloscópicas neste arquivo, com o que se pode afirmar que 80% do acervo do numérico já está arquivado.

 

c) Busca técnica:

Até 1983/1984, era efetuada busca técnica de impressões digitais em todas as coletas de primeira via de carteira de identidade solicitada neste departamento, bem como era realizado o confronto das impressões digitais, coletadas para emissão de segunda via, com as individuais anteriores arquivadas.

Havia carteiras de identidade do interior com mais de um ano de atraso.

Há vários anos, pela insuficiência de técnicos, é efetuada a busca técnica (pesquisa) no post mortem, criminal, atestado de antecedentes para não cadastrados no sistema, desconhecidos, em casos de divergência e situações especiais.

O confronto em segunda via de carteira de identidade é realizado a partir dos dados do sistema. No caso de divergência de série/seção, é realizado o confronto com as individuais datiloscópicas.

 

d) Identificações Criminais:

Em 1999 havia mais de 100.000 (cem mil) identificações criminais no interior do Estado, atrasadas desde 1985, armazenadas em caixas de papelão para serem cadastradas.

A partir de 1999, mais de 21.000 identificações criminais foram cadastradas, não sendo possível fazer mais pela falta de técnicos para classificar as impressões, pesquisar no arquivo datiloscópico e confrontar as impressões digitais.

Este atraso no cadastramento criminal, possibilita uma deficiente pesquisa no sistema pois os indivíduos não constam no cadastro.

 

e) Controle de espelhos:

O controle que antes havia sobre os espelhos das carteiras de identidade era somente aquele realizado pelo almoxarifado, que registrava, no respectivo livro, a quantidade e numeração dos espelhos enviados a cada posto.

A partir de 1999 foi implantado um sistema de mapa estatístico, o qual controla, também, a quantidade de espelhos utilizados, relacionado ao número de carteiras confeccionadas por cada posto de identificação.

Tendo em conta os aspectos anteriormente descritos, torna-se extremamente fácil, principalmente para uma servidora sabedora da realidade da situação, conseguir a expedição de nova carteira a partir de uma certidão de casamento, como foi o caso extremamente alardeado pelos meios de comunicação, os quais, desconhecedores do todo, emprestam ao fato singular uma importância que não tem, aliás, como de praxe. Importância adquire, em verdade, o que se oculta atrás de um novo RG. Servidores públicos policiais, por exemplo, valem-se desta possibilidade para que, em consulta à ficha funcional pela nova numeração de identidade, contra eles nada conste; ao passo que, irregularidades funcionais, apuradas ou em fase de apuração (inquéritos policiais, sindicâncias, processos administrativos disciplinares), quase sempre no plural, repousem sem sobressaltos no berço seguro do RG antigo.

 

5) Termo de convênio n° 062/2000, celebrado entre a Secretaria da Justiça e da Segurança e o Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços Funerários do Rio Grande do Sul, estabelecendo a responsabilidade pelo traslado de corpos do local onde são encontrados até as dependências do departamento médico legal a entidades privadas e pessoas não habilitadas, podendo gerar graves e irreparáveis prejuízos ao trabalho técnico e especializado dos peritos criminalísticos, convênio esse até a presente data não enviado ao poder legislativo.

 

Permita-se, neste particular, uma pequena inversão de ordem para, desde já, esclarecer que o Convênio foi remetido ao Poder Legislativo conforme restou exaustivamente demonstrado perante a CPI da Segurança.

Como de resto, também neste particular, a conclusão primeira, antes de serem abordados e esclarecidos os fatos, é a de que o atual Governo é pioneiro no estabelecimento de convênios relativos à remoção de corpos. A situação não é nova aqui ou alhures. O Governo do Estado do Paraná já havia realizado convênio semelhante conforme se depreende da leitura do procedimento administrativo que veio a originar o tão questionado convênio 62.

Aqui no Rio Grande a situação também não é novidade. O que é novo, talvez, seja a forma abrangente e detalhada, inclusive no que respeita a eventuais responsabilidades, que pautou este Convênio. Alguns antecedentes devem ser lembrados antes que se comente o Convênio de 2000.

Em outubro de 1995, os proprietários de funerárias do Litoral Norte do Estado, em ofício remetido ao Delegado Regional de Polícia de Osório-RS, já ofereciam, de forma gratuita, serviços de remoção de cadáver para o posto do IML daquela cidade. Este ofício foi encaminhado, posteriormente, ao então Diretor do Instituto Médico Legal que respondeu o pleito nos seguintes termos: “Vimos pelo presente, felicitar os proprietários de Funerárias do Litoral Norte pela iniciativa de oferecer seus serviços de remoções de cadáveres, de forma gratuita. Nada temos a opor, pois a iniciativa veio solucionar um problema antigo para o IML.” (cópia do inteiro teor do expediente juntado à CPI).

No ano de 1996, em decorrência do edital de concorrência n° 01/95, foi firmado o contrato de prestação de serviços n° 02/96 entre o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, através da Secretaria de Justiça e da Segurança e Transportes Figueira Ltda. Tal contrato, oneroso diga-se de passagem, tinha como objeto a prestação de serviços de remoções de cadáveres ou restos mortais a cargo do IML, tendo como circunscrição territorial a região de abrangência do IML de Porto Alegre.

Os dois exemplos acima são extremamente úteis no sentido de demonstrar que a tarefa de transporte de cadáveres ao cargo de empresas privadas, autorizadas pelo Estado, já é tema antigo. Mais antigo, certamente, só o transporte sem autorização alguma.

Três pressupostos precisam ser enfrentados antes da análise de qualquer tipo de instrumento legal relativo ao transporte de cadáveres.

O primeiro consiste na constatação de que, nas localidades que não sejam servidas por um serviço específico de translado, necessariamente, o transporte será realizado de qualquer forma: em caçambas de caminhão, carroças, a cavalo... Para estes locais o translado de corpos é ainda um desafio. Em outros casos, normalmente, os transportes são realizados por funerárias ou ambulâncias.

O segundo consiste na constatação, ainda mais elementar, de que o que não é regulado, regulamentado ou legalizado, abre um permissivo para que todas as formas de manifestação venham à tona. Assim, neste caso, na ausência de regramento, toda e qualquer forma de transporte de cadáver, a princípio é permitida; com todas as virtudes e defeitos que disto possam advir.

O terceiro, por sua vez, consiste na primária diferenciação entre atividade pericial e translado de cadáveres. Aceitar que o transporte de cadáveres possa influir ou prejudicar a atividade pericial é admitir que a perícia do local do crime seja feita posteriormente à remoção do cadáver.

A partir de tais pressupostos cabe aqui um ligeiro comentário a respeito do Convênio n° 62 de 2000 no tocante à sua legalidade. Tomamos aqui, como aporte as considerações expendidas sobre o tema pelo Conselheiro da OAB/RS José Francisco Oliosi da Silveira. A cláusula primeira do convênio estabelece, claramente que a autópsia será feita pelo DML. No mesmo sentido a alínea “c” da cláusula segunda e ainda a cláusula terceira. A responsabilidade para manter a inteireza do local do crime, quando tenha conhecimento da infração penal, é da autoridade policial (CPP art. 6º). Assim, no caso de crime, a Autoridade Policial verifica a necessidade da Perícia, e se entender necessária, somente após esta é que O PRÓPRIO PERITO libera o corpo para ser removido. Em momento algum se demonstra nas cláusulas do convênio conflito com a normativa constante do CPP. Em suma, contrato ou convênio não pode derrogar normas de ordem pública como as do Código de Processo Penal.

 

6) O fechamento de delegacias regionais de polícia, com “desmonte das instituições que compõem o sistema de segurança pública do estado”, conforme denúncia da federação das entidades de classe da área de segurança pública do Estado do Rio Grande do Sul – FECASP-RS, representando 13 sindicatos e associações de servidores da área, consubstanciada em ofício de 13 de março último, onde solicitam uma CPI para “investigar os motivos que estão levando o Estado do Rio Grande do Sul a se encontrar em elevada e gritante condição de insegurança pública”.

 

Em primeiro lugar, criação, alteração, extinção, fusão de órgãos constitui questão de mérito administrativo portanto, sem possibilidade de investigação por parte de uma CPI a não ser que se demonstre irregularidade ou ilegalidade nestes atos.

Em segundo, a existência ou não de uma DRP não significa um número maior de servidores policiais a serviço da população. Antes pelo contrário, com a extinção de algumas DRPs, conseguiu-se fazer que um maior efetivo de policiais fosse destinado ao policiamento de rua, numa clara resposta à preocupação suscitada no item relativo à dedicação quase exclusiva dos policiais à atividade cartorial.

Cabe às Regionais, basicamente, desempenhar atividades de coordenação das Distritais, dirimir conflitos de competência entre estas, o desempenho de atividades correicionais e ainda a expedição de porte de arma.

As Delegacias Regionais serviram por muitos anos apenas como forma de propiciar uma boa gratificação para delegados lotados em Delegacias de Polícia e que ao exercerem a substituição em uma Regional ganham FG para tal. Eram gastos R$ 3.7 milhões em salários, para que fossem realizadas até então, apenas 196 inspeções e 116 sindicâncias em todo do Estado.

Ao todo, de 32 regionais o número reduziu-se para 12. Com esta diminuição cerca de 88 agentes foram realocados nas Distritais, isto sem contar equipamentos e viaturas, invariavelmente os melhores, que antes estavam sob a guarda das DRPs.

 

7) A iminência de greve dos servidores da área de segurança pública, noticiada em documento encaminhado à Assembléia Legislativa.

 

Como dito de início, um dos requisitos de instalação de uma CPI é a existência de fato determinado a ser investigado. Instalar uma CPI para investigar um evento futuro, incerto e ainda por cima lícito – ao menos para o atual Governo a greve ainda é um direito e não um crime -, é uma hipótese absurda. Fatos ou são determinados ou não, e só é fato aquilo que existe. Não basta, porém, a existência para ser objeto de investigação. Fosse assim e teríamos CPIs na Bahia, São Paulo, Paraíba... e em todos os demais locais onde efetivamente se observou a ocorrência de greves dos servidores da área de Segurança.

 Não tivemos investigações parlamentares nestes Estados, não por falta de fatos mas pelo simples motivo de que investigar greves, mesmo as existentes, em um Estado Democrático é inaceitável.

A eventualidade de uma greve não é algo impossível, mas no tocante à Segurança Pública no atual Governo é, no mínimo, improvável. Tanto que a Assembléia Legislativa aprovou de forma unânime em 27 de junho, o Projeto de Lei apresentado pelo Governo do Estado que possibilita o pagamento da diferença do adicional por risco de vida de 222%, restabelecendo-se os percentuais de gratificação nos vencimentos dos policiais militares, policiais civis, funcionários do quadro do Instituto Geral de Perícia (IGP) e do quadro da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe).

Assim, são devolvidos a integralidade dos 222% de risco de vida para os policiais, da gratificação de incentivo pericial e técnico para o quadro do IGP e do fator de valoração do nível de vencimento do quadro da Susepe, recuperando o percentual das gratificações que os servidores perderam na época da administração de Alceu Collares, e que não foram repostos na administração Antônio Britto. A repercussão financeira ao final da integralização deste adicional chegará a R$ 10,8 milhões.

Outra vitória, assistida pelos servidores da segurança presentes à votação no Plenário da Assembléia Legislativa, foi a aprovação, também por unanimidade, do projeto que autoriza pagar a gratificação por exercício de serviço extraordinário aos servidores da segurança.

Além disto, ainda foi apresentado um programa de tratamento, assistência e prevenção de saúde para a área. O que existe são negociações, e não “greve iminente”. No Governo Britto houve sim, greve, punição e demissão. Aliás somente no Governo Olívio é que houve anistia das punições aplicadas naquela época.

 

8) A introdução da Brigada Militar na FEBEM, transgredindo a atribuição constitucional da polícia militar e, em conseqüência, desguarnecendo o policiamento das ruas.

 

A presença da BM na FEBEM decorre de situação emergencial e temporária, cingindo-se a apenas uma unidade que cuida de adolescentes, o Centro do Jovem Adulto – CJA. A BM serve para segurança do local, não tendo iniciativas quanto a execução de medidas sócio-educativas aos adolescentes.

A retirada do efetivo da Brigada Militar do CJA/FEBEM constitue um projeto específico deste Governo, o qual deve culminar com a extinção da referida unidade onde hoje está a BM. Esta retirada está se dando na mesma proporção que diminui o número de jovens adultos, numa atividade segura e gradual sem que o interesse público de proteção aos cidadãos, neles incluindo as crianças e adolescentes em conflito com a lei, seja sequer arranhado. Em agosto de 2000 a média da população do CJA era de 80 adolescentes, hoje é de 48.

 Este Governo já tirou a BM dos presídios de Charqueadas, da PEC e da PASC, e nomeou 550 novos servidores na SUSEPE, sendo que continuará sua política de especialização da BM no Policiamento, com a necessária retirada da força-tarefa dos sistemas prisionais e sócio-educativos.

 

9) desproporção entre o número de ocorrências e de inquéritos policiais a lei estadual 11.343, de 8 de julho de 1999, que dispôs sobre o registro e divulgação dos índices de violência e criminalidade no estado, vem sendo reiteradamente descumprida. essa violação oculta da população e da fiscalização parlamentar o assustador incremento da criminalidade violenta, e a inoperância dos órgãos de segurança.

Com efeito, ao lado de não estarem disponíveis dados estatísticos a que se refere a mencionada lei, inobstante, naqueles a que se pode ter acesso, já se pode constatar o quanto afirmado.

De fato e pelo teor dos elementos oriundos de relatórios limitados à polícia civil, se pode verificar, por exemplo, quanto às médias de delitos levantados dos anos de 1994 1998 e, separadamente, dos anos de 1999 e 2000, largo incremento,

                               1994 a 1998        1999 e 2000        incremento

furto de veículos        13.692                  21.262                55,28%

roubos                                    28.886                 45.292                56,79%                                arrombamentos         38.423                 43.186                12,39%

e, no entanto, quanto a inquéritos policiais nos mesmos períodos, se observa a alarmante defasagem pelas seguintes médias,

 

1994 a 1998                           1999 e 2000                defasagem

 151.414                                 106.054                        29,95%

 

Urge verificar as causas e as autoridades responsáveis pelo paradoxo: enquanto os fatos delituosos se multiplicam, o número de inquéritos, que deveria crescer proporcionalmente ao incremento da criminalidade diminui!

 

A Lei Estadual 11.343 prevê semestralmente a publicação de mais de 15 tipos de relatórios estatísticos diferentes, todos minuciosos e divididos pelas 22 regiões dos COREDES mais a Capital. A vontade do legislador, último recurso na interpretação de um texto legal, não pode ser vista como a salvação de um dispositivo tecnicamente imperfeito, cujos conceitos e limitações simplesmente algemam aquele que deve cumpri-la. Afastar-se do disposto nela seria conduta mais que reprovável mesmo que, apesar disso, seu thelos venha a ser comprometido.

O texto legal invocado poderia, no mínimo, ser mais esclarecedor em muitos pontos, especialmente para minimizar os possíveis erros que do seu cumprimento possam advir, tais como:

Em seu artigo primeiro a lei fala em manter um banco de dados com índices e depois, incisos do art. 2º falam de números. O índice é um número relativo extraído de algum evento em determinado espaço de tempo enquanto os números são absolutos e em qualquer período. Na maior parte do corpo da lei se menciona números e, também, entendemos que este era o espírito da lei, e não o de taxas.

O que sempre se menciona nos incisos do art. 2º é tipo de delito, e não dos eventos atendidos pelas corporações. Isto é, somente se publicaria os eventos por delitos, como roubo, furto, lesões corporais, e não suas várias tipificações. No delito de roubo a banco, por exemplo, cuja tipificação inexiste, como diferenciá-lo do roubo este sim tipificado sem que se altere o Código Penal ou o próprio corpo da lei estadual?

Entre o inciso I e X do art. 2º não há diferenças de pedidos. Que diferenças haveria entre “número de ocorrências registradas pela polícia militar e civil, por tipo de delito” e “número de delitos comunicados a autoridades policiais, discriminados por tipo penal”?

No item “inquéritos policiais instaurados”, cabe salientar que no que se refere a polícia civil são feitos instaurados de acordo com os registros efetuados, e os da BM são contra integrantes da Corporação.

Pois este Governo está absolutamente em dia com tal publicação, apesar do pouco tempo disponível e de ter encontrado os serviços de estatística absolutamente desestruturados, tendo que montar o Depto. de Estatística da Secretaria da Justiça, que até então não existia. Eventuais erros, decorrentes de deficiência de estrutura ou até mesmo em função das imperfeições legais são e têm sido corrigidos de ofício.

Quanto ao “paradoxo” sobre a defasagem do número de Inquéritos Policiais remetidos à Justiça nos períodos já referidos, é sabido que a maneira como as Secretarias Estaduais de Segurança, em todo o país, procedem à investigação de fatos delituosos sofreu drástica alteração com a promulgação da Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995.

Esta Lei dispensou expressamente a elaboração de Inquéritos Policiais para a apuração de infrações de menor potencial ofensivo (arts. 66 e 77, § 1º). Neste sentido, a partir de 1996, ano do início da execução da lei, os procedimentos policiais não se limitam aos IPs remetidos à Justiça, englobando também os TCs encaminhados judicialmente. Na segunda tabela, os Termos Circunstanciados foram simplesmente ignorados, o que, inevitavelmente, provocou uma distorção nos dados. A mera utilização de conceitos corretos ou mais apropriados, como “procedimentos policiais” traduz-se em resultados bem mais satisfatórios.

Outra consideração extremamente útil neste aspecto, diz respeito, ao fato de que nunca o número de ocorrências será proporcional ao número de Inquéritos Policiais. Ainda que se abstraia a diferença conceitual entre os IPs e TCs deve ser considerado o seguinte:

Primeiro, ocorrência é muito mais um modelo ou padrão, comparável nas devidas proporções ao padrão ofício de correspondência oficial, que um documento ou operação singular, direta e exclusivamente relacionada a atividade policial investigatória de crimes.

Segundo, nem todas as ocorrências registradas nas DPs são referentes à questões criminais, assim, por exemplo, as de perda de documentos, abandono de lar, queda de muros provocados por vendavais ou enchentes, queima de eletrodomésticos por sobrecarga de eletricidade, dentre outros. Ao contrário, o que se observa é um número extremamente superior das “ocorrências cíveis” no comparativo com as “criminais”.

Terceiro, um Inquérito Policial pode gerar mais de uma ocorrência assim, por exemplo, no caso de roubo de veículo há possibilidade de ser gerada pelo menos 4 ocorrências: a primeira comunicando o fato, a segunda do veículo encontrado, a terceira quando da devolução do bem e ainda uma quarta se for caso de prisão em flagrante.

Finalizando, nem mesmo nas estatísticas do Ministério Público, Poder Judiciário e Polícia Civil, os números de Inquéritos Policiais remetidos à Justiça são coincidentes.

 

10) emprego de técnicas ilícitas de espionagem

O Departamento de Inteligência e Assuntos Estratégicos da Secretaria de Justiça e da Segurança adquiriu recentemente e vem fazendo uso, sem autorização judicial, de equipamentos eletrônicos de alta tecnologia na escuta e controle telefônico, inclusive digital, localizados em malas portáteis, aquisição essa provavelmente feita com recursos do Fundo Especial de Segurança Pública – FESP.

A atuação dos chamados órgãos de inteligência, distribuídos pela própria Secretaria da Justiça e da Segurança, Brigada Militar e Polícia Civil, provoca permanente inquietude na sociedade, dada a completa ausência de controles públicos sobre suas atividades.

Na Secretaria, opera o departamento de inteligência e assuntos estratégicos (DIAE/SJS), integrado por oficiais e praças da Brigada Militar, delegados e agentes da polícia civil.

Na Brigada Militar, um contingente significativo de oficiais e praças, sob o comando de um coronel pm, operam esse serviço secreto, a pm-2 ou a 2ª seção do estado-maior, temido pelas práticas informais de atuação, freqüentemente delituosas, como escutas telefônicas sem autorização judicial, dispondo de arquivos secretos, recursos específicos, aparelhos eletrônicos de vigilância e frota de veículos discretos com seu pessoal operando em trajes civis. na polícia civil, o órgão denomina-se serviços de informações especiais, ligado diretamente ao chefe de polícia e opera nas mesmas condições.

É impositivo o conhecimento e controle público desses serviços, cujo volume de recursos que movimenta é expressivo e que, geralmente, atua em duplicidade de esforço nas tarefas ordinariamente cometidas às Corregedorias da Polícia Civil e Brigada Militar.

 

Realmente havia, como já foi esclarecido perante esta CPI, um processo de aquisição das famosas malas pretas. Só que do Governo anterior, inclusive com anuência do Secretário de Segurança e Chefe de Polícia à época. Um dos primeiros atos do atual Governo, pela Secretaria de Justiça e Segurança, foi cancelar esta aquisição.

Não bastassem as irregularidades administrativas apontadas pela CAGE, sempre foi convicção pessoal do titular da Pasta e também deste Governo, de que a excepcionalidade da violação da vida privada e intimidade dos cidadãos garantida constitucionalmente só se dará, na forma da Lei e sempre em caráter excepcionalíssimo, mediante autorização judicial e além disso, como meio de produção de prova judicial, como o são as transferências de sigilo bancário, fiscal e também as gravações telefônicas autorizadas.

Um instrumento de gravação portátil, como o que seria adquirido pela vontade do Governo que antecedeu a este, seria imprestável para a produção de prova judicial. Está em andamento, porém, a aquisição de um equipamento fixo de escuta telefônica, semelhante ao utilizado pela Polícia Federal, próprio para a produção de prova judicial.

Cabe aqui um parêntese a respeito das gravações utilizáveis como meio de prova, sejam elas telefônicas ou ambientais.

Até a edição da Lei 9.296, de 24 de julho de 1996, que veio a regulamentar o inciso XII, parte final do art. 5º da CF/88, a jurisprudência dominante na mais alta Corte do país e também alhures, era no sentido da adoção da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada (Fruits of the Poisonus Tree). Durante a vigência de tal entendimento toda sentença condenatória criminal, que tivesse como único suporte, a violação de sigilo de comunicações telefônicas, era tida por nula, posto que todos os demais atos que se originassem exclusivamente desta gravação ilícita seriam por ela contaminados. Este correto entendimento tinha como lastro à época, a ausência de ato normativo que regulamentasse a possibilidade prevista constitucionalmente de quebra de sigilo de comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (CF art. 5º, XII, parte final). Deste modo, tratando-se de direito e garantia fundamental dos cidadãos, só com a edição da Lei 9.296 é que a inviolabilidade das comunicações telefônicas teve a sua plenitude de eficácia restringida na forma e hipóteses que a lei regulamentou.

O direito ao recato ou à intimidade, mesmo na vigência do regime constitucional de exceção anterior ao vigente, sempre foi de particular importância e resguardo. Em 1984, por exemplo, o julgamento de Recurso Extraordinário em processo cível de n° 100094, da lavra do Ministro Rafael Mayer teve a seguinte ementa:

 

DIREITO AO RECATO OU INTIMIDADE. GARANTIA CONSTITUCIONAL. INTERCEPTAÇÃO DE GRAVAÇÃO TELEFÔNICA. CAPTAÇÃO ILEGÍTIMA DE MEIO DE PROVA. ART-153. PAR-9. DA CONSTITUIÇÃO.

 

ART-332 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

 

INFRINGENTE DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DO DIREITO DA PERSONALIDADE E MORALMENTE ILEGÍTIMO É O PROCESSO DE CAPTAÇÃO DE PROVA, MEDIANTE A INTERCEPTAÇÃO DE TELEFONEMA, A REVELIA DO COMUNICANTE, SENDO, PORTANTO, INADMISSÍVEL VENHA A SER DIVULGADA EM AUDIÊNCIA DE PROCESSO JUDICIAL, DE QUE SEQUER É PARTE. LESIVO A DIREITO INDIVIDUAL, CABE O MANDADO DE SEGURANÇA PARA DETERMINAR O TRANCAMENTO DA PROVA E O DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS, DA GRAVAÇÃO RESPECTIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO.

 

Já em 1984, portanto, mesmo em se tratando de um processo cível, já se delineavam as remotíssimas hipóteses de aceitação, como meio de prova, de gravações clandestinas sejam elas telefônicas ou ambientais. Mesmo que, por um esforço, fosse abstraída a ofensa aos Direitos Fundamentais constitucionalmente protegidos, os dispositivos processuais civil, trabalhista e penal regem-se em consonância com o Princípio da Imediação que, se por um lado confere poderes ao magistrado para determinar as espécies de prova e meios para formar seu convencimento, de outro repele a aceitação de provas que não tenham sido produzidas em juízo.

 No atual ordenamento constitucional as raríssimas hipóteses de aceitação pelos Tribunais de gravações telefônicas ou ambientais produzidas fora do juízo têm que observar o preenchimento de ao menos dois requisitos para que se configure a sua licitude:

O primeiro, consiste no fato de que a gravação de conversa, telefônica ou ambiental, seja autorizada por um dos interlocutores, mesmo sem o conhecimento do outro, desimportando que o meio de obtenção da prova (a gravação em si) seja feita por terceiro.

O segundo, consiste na finalidade da gravação, sendo lícita na presença de excludente da antijuridicidade. Assim, só será aceita a gravação e divulgação de fita, por exemplo, como exercício de legítima defesa contra um ilícito (concussão e extorsão mediante seqüestro, só para nos atermos as hipóteses examinadas e tidas como lícitas pelo STF).

Ausentes os requisitos acima, toda gravação telefônica ou ambiental será ilícita, excetuando-se é claro as gravações autorizadas judicialmente desde que suficientemente fundamentadas.

Em outras palavras, conversas telefônicas ou ambientais, gravadas e divulgadas, sem autorização de ao menos um dos interlocutores e ausente a excludente da antijuridicidade, podem ter várias utilidades, desde a chantagem até a execração pública, mas certamente nenhuma judicial.

Os órgãos de inteligência da Secretaria de Justiça e da Segurança, Polícia Civil e Brigada Militar se destinam a atividades de coordenação, projetos, coleta de subsídios para controle interno e inteligência policial, coisa que só  causa espanto  aos ilustres  parlamentares.  É o caso do SIOT  (Serviço de Informação Operacional e Treinamento) da Brigada Militar, com fins de auxílio ao policiamento urbano; SIE (Serviço de Informações Especiais) da Polícia Civil que atua na coleta de informações necessárias à atividade investigativa e também do DIAE (Departamento de Inteligência e Assuntos Estratégicos) da Secretaria de Justiça e da Segurança.

O que a “alguns” causa certo desconforto e até mesmo medo, motivando reações até mesmo previsíveis para quem está em dívida com a lei, é uma atividade específica do DIAE que consiste na conjugação de esforços junto ao Ministério Público Estadual no combate à atividade ilícita cometida por policiais, melhor seria dizer, criminosos de distintivo. Cuja novidade consiste justamente nisso: o combate à corrupção policial; já que o conhecimento a respeito é antigo e de todos sabido, inclusive de parlamentares que no ano de 1991 tiveram a oportunidade única de compor a Comissão de Serviços Públicos da AL.

As escutas e gravações ocorridas neste tipo de investigação têm, todas, autorização judicial.

 

11) fundo especial de segurança pública

 

A Lei Estadual n° 10.839/96 autorizou a extinção de vários fundos, dentre eles o FUNDESP/RS – Fundo Especial de Reaparelhamento de Segurança Pública (lei 6.704-64), Fundo da Brigada Militar (lei 9.706/92), Fundo da Polícia Civil (lei n° 10.035/93) e criou o Fundo Especial de Segurança Pública – FESP, para apoiar, em caráter supletivo, as atividades e projetos da Secretaria da Justiça e da Segurança. a referida lei determinou a destinação dos recursos do FESP às instituições que integram a secretaria, mensalmente, com a liberação efetiva, no mínimo, dos valores correspondentes ás receitas por si geradas, ainda que oriundas de serviços terceirizados (artigo 4º).

Contudo, tais aportes não têm sido feitos regularmente àquelas instituições, em prejuízo de seu reaparelhamento e, assim, da eficiência na prestação dos serviços de segurança à população.

 

Os repasses do FESP têm sido feitos, regularmente, todo mês, às instituições a que se destinam. Não há nenhuma irregularidade.

O secretário da Fazenda, Arno Augustin, em seu depoimento no dia 09 de novembro informou aos parlamentares que o Governo do Estado tem feito investimentos significativos na segurança pública, em alguns casos superiores aos realizados por administrações anteriores. Os gastos com a segurança pública realizados no período de 1999 a 2001 foram 3l,3% superiores aos aplicados pelo governo anterior em igual período, com um montante de R$ 2,1 bilhões contra R$ 1,6 bilhão. As despesas com pessoal foram 27,4% superiores, acontecendo o mesmo com o custeio, que teve um crescimento de 78,9% e os investimentos alcançando um incremento de 6,3%, na comparação com os dois governos.

É de se salientar a importância dos gastos com manutenção da segurança pública, que cresceram de R$ 152 milhões para R$273 milhões, e com o pessoal, que evoluíram de R$ 1,4 bilhão para R$1,7 bilhão.

Sobre o Fundo Especial de Segurança Pública (FESP), o secretário da Fazenda informou que o saldo do Passivo Potencial (recursos vinculados à área que não vinham historicamente sendo repassados) caiu de R$ 32 milhões ao final de 1998, caiu para R$ 18 milhões, devendo se reduzir a cerca de R$ 4 milhões ao afinal do ano. ``Uma demonstração de que o Governo tem na segurança pública uma de suas prioridades, observou.

Cabe registrar que o governo entregará até o final do ano para a Polícia Civil, Brigada Militar e Corpo de Bombeiros 500 novas viaturas, sendo que até novembro de 2001 foram entregues 488 carros, com investimentos de R$ 10,7 milhões. Também foram contratados 2.777 a aquisição de 5.500 coletes à prova de balas, além da definição da integralização dos 222% de risco de vida, reivindicação antiga dos servidores.

 

12) empresas de segurança privada

A imprensa seguidamente noticia o fato de policiais, civis e militares, principalmente estes últimos, vitimados ou feridos em confrontos com assaltantes, quando, de folga, trabalhavam particularmente para empresas de segurança privada ou assessorias de segurança, com remuneração mais elevada do que aquela obtida do estado, que os habilitou para tal serviço.

Cansados da jornada dupla, quando trabalham para o estado esses policiais não dão resposta adequada ao serviço público.

essas empresas e assessorias, geralmente, são controladas por oficiais pm de alta patente e autoridades policiais, mas não se conhece controle das mesmas, nem do pessoal que a contratam, revelando uma perigosa tendência para a privatização da segurança preventiva, que passa a ser privilégio de quem pode pagar, em detrimento do policiamento ostensivo voltado para a população em geral.

 

Talvez um dos pontos mais importantes da CPI, principalmente no que toca à parte em que refere à autoridades policiais e oficiais de alta patente que controlam estas empresas de segurança privada, não mereceu da Comissão o tratamento devido.

Não foram identificados os controladores de tais empresas, estes sim, os principais responsáveis e patrocinadores da dupla jornada sobre o mesmo tipo de atividade.

Aliás, neste particular a legislação é extremamente falha. O Estatuto dos Servidores Militares da Brigada Militar (Lei Complementar 10.990, de 18 de agosto de 1997) em seu artigo 26 assim dispõe:

 

Art. 26 – Ao servidor militar da ativa é vedado participar de gerência ou administração de empresa privada, de sociedade civil ou exercer comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário.

 

Desta forma, a própria legislação abre a brecha para que, de maneira transversa, como acionista majoritário, por exemplo, um oficial da ativa da Brigada Militar, controle uma empresa privada.

Não há vedações de outro caráter. No tocante à remuneração dos praças e policiais principalmente, o que poderia ser feito, o foi: 222% sobre o risco de vida, horas extraordinárias além de outros projetos que contribuem para a melhora da qualidade de vida dos policiais civis e militares: como o projeto de saúde mental, enxugamento dos Comandos Regionais da Brigada Militar, dentre outros.

 

13) corrupção policial

 

Em data de 21 de abril de 2001, no programa “Os Gaúchos e o Rio Grande” na rádio gaúcha, o Secretário da Justiça e da Segurança, José Paulo Bisol, declarou que:

“- a polícia tem o controle do crime mas não o repassa ao estado, e uma parte dela tira proveito próprio desse controle;

Há partidos políticos que dão cobertura à banda podre da polícia;

Praticamente conhece a banda podre da polícia;

Não manda automóvel para delegacia que gerencia certo tipo de criminalidade.”

Em virtude das declarações acima, foi requerido aditamento ao requerimento inicial da CPI na data de 24 de abril de 2001 com o objetivo de:

“Apurar a existência de corrupção no âmbito da secretaria de justiça e segurança e órgãos vinculados, bem como o envolvimento de delegacias de polícia com o crime com a finalidade de identificar a prática de fatos delituosos e irregularidades administrativas e seus respectivos autores e/ou responsáveis”

 

O 13º ponto da CPI, apesar de um objetivo nobre, não foi levado a sério para fins de uma investigação. O que restou observado foi que, ao invés de ser investigada a corrupção policial ou o cometimento de crimes e irregularidades administrativas por servidores públicos – no que as principais testemunhas da CPI são um exemplo claro –, simplesmente reverberava a voz do relator e dos parlamentares oposicionistas no sentido de que ao Secretário de Justiça incumbia a prova da existência de corrupção policial.

A investigação de corrupção, que deveria cingir-se a Delegacias de Polícia, derivou para investigações outras, sendo que a matéria referente a “banda podre” foi solenemente descaracterizada. A questão em si não é nova, nem para a grande imprensa, que parece ter esquecido as manchetes de anos passados, nem para a Secretaria da Justiça e Segurança, eis que é um dos pontos primordiais na sua atuação para qualificar este serviço público, extirpando de seus quadros aqueles policiais envolvidos em ilícitos em benefício mesmo dos servidores que honram os seus quadros.

 

Como exemplo desta atuação podemos citar, além da criação e efetivação da Ouvidoria da Justiça e Segurança, que recebe denúncias referente a atuação de policiais, algumas das mais importantes atuações da Corregedoria da Polícia:

 

Defrec (Delegacia especializada em furtos, roubos, entorpecentes e capturas) de Canoas:

 

A partir de 73 denúncias feitas através do disque-denúncia, que sustentaram mandados de busca e apreensão e pedidos de prisões temporárias, foram identificadas diversas irregularidades. Havia provas de atividade de policiais fora de sua circunscrição, feitos sobre tráfico de drogas que estavam parados (quando deveriam ter sido enviados ao Judiciário), além de 5.188 ocorrências sem distribuição e sem nenhuma investigação sendo feita.

Em face disso, foram instauradas 32 sindicâncias administrativas apara apurar desvios de conduta. As investigações demonstraram procedimentos como apropriação de drogas e armas apreendidas e extorsão de dinheiro para que traficantes não fossem presos. O material apreendido havia, misteriosamente, desaparecido de dentro da Defrec/Canoas. E a investigação estava parada, embora a autoria fosse conhecida.

Foram indiciados o delegado e quatro agentes.

 

3ª DP de São Leopoldo

 

Numa operação conjunta entre Brigada Militar e Polícia Civil, no bairro Santo André, em São Leopoldo, ocorreu o homicídio de Ronaldo Ramos de Mello. As investigações apontaram o fato de que a vítima estava desarmada e foi morta pelas costas. Houve tentativa de acobertamento, tanto por parte de brigadianos como de policiais civis, plantando-se uma versão de legítima defesa e enxertando-se duas armas no corpo para justificar a morte de Ronaldo Ramos de Mello. Foram indiciados um oficial da BM, um praça e dois agentes da Polícia Civil.

 

Policiais acusados de formação de quadrilha, roubo, furto, receptação, posse e porte ilegal de arma em Rio Grande

 

A partir de denúncias feitas à Secretaria da Justiça e da Segurança e ao Ministério Público, investigações apontaram que três policiais da cidade de Rio Grande aliavam-se a outras pessoas para indicarem locais onde deveriam acontecer furtos e roubos, chegando, às vezes, a participarem desses crimes.

 

Homicídio e ocultação de cadáver em Guaíba

 

Três policiais militares e mais dois homens foram indiciados por seqüestro, tortura, homicídio e ocultação do cadáver do adolescente Romildo Gonzaga Heinsch Menezes.

 

Tráfico e homicídio cometidos por policial

 

Denúncias vindas através da Ouvidoria da Justiça e da Segurança e do Disque-denúncia apontavam o policial Alexandre Luiz Ferreira como traficante. Recentemente, esse policial, conhecido como Vagalume, foi preso por homicídio.

 

Concussão cometida por oito policiais em diferentes cidades

 

Em março de 2001, policiais da Delegacia de Homicídios detiveram um homem, suspeito de ser mandante de um homicídio. Levado para o Palácio da Polícia, em Porto Alegre, foi recolhido ao Presídio de Caxias do Sul, tendo ficado à disposição da Delegacia de Farroupilha por sete dias. Durante esse período, os policiais da Delegacia de Homicídios exigiram o pagamento de R$ 80 mil para rasgarem o processo. Ao mesmo tempo, policiais da DP de Farroupilha exigiram R$ 60 mil, para o mesmo fim. Por sua vez, policiais lotados na DP de Portão também passaram a exigir R$ 60 mil para que esse homem não fosse implicado em inquéritos de roubos de carga de couro ocorridos naquele município.

A vítima dessas extorsões denunciou o caso à Polícia e todos os agentes foram indiciados.

 

1ª DP de Novo Hamburgo

 

No início de novembro de 2001, dois agentes de polícia da 1ª DP de Novo Hamburgo foram presos em flagrante ao extorquirem dinheiro e mercadorias de um comerciante de Cachoeirinha, que esteve envolvido em caso de estelionato em Novo Hamburgo.

 

DP de Gramado

 

Delegado de polícia e agente indiciados por abuso de autoridade e concussão, por terem extorquido dinheiro de bicheiro daquela cidade.

 

1ª DP de Cruz Alta

 

Três policiais da 1ª DP de Cruz Alta foram indiciados por terem extorquido dinheiro para deixarem de cumprir mandatos de prisão ou para soltarem pessoas presas temporariamente. A delegada foi indiciada por prevaricação, já que sabia desses fatos e não tomou providências.

 

Porte ilegal de armas e posse de apetrechos usados no tráfico

 

Policial da 2ª DP de Cachoeirinha preso em flagrante com armamento pesado e drogas em sua residência.

 

Policial assaltante

 

Escrivã de polícia foi presa em flagrante após assalto à agência da Caixa Econômica Federal em Novo Hamburgo.

 

No Conselho Superior de Polícia, onde são tomadas as decisões referentes a vida funcional dos servidores processados houve um grande acréscimo de feitos, demonstrando o rigorismo com que o assunto agora é tratado.

 

Propostas de demissões e cassações de aposentadoria pelo Conselho Superior de Polícia

 

96                      97                    98                    99                    00        01*

Proposta

31                      8                      17                    20                    42        17

Demitidos

8                        21                    8                      10                    7          30

Em andamento

20                      1                      9                      16                    50        37

Negado

2                        6                      --                     3                      1            --

Aposentadoria cassada

1                        --                     --                     --                     --           2

 

* em 2001, os dados vão até setembro

 

 

Demissões propostas:

De 1996 a 1998: 56

De 1999 a setembro de 2001: 79

 

Demissões efetivadas:

De 1996 a 1998: 37

De 1999 a setembro de 2001: 47

 

Em andamento:

De 1996 a 1998: 30

De 1999 a setembro de 2001: 103

 

 

2ª PARTE - OS DESVIOS NA INVESTIGAÇÃO PARLAMENTAR

 

O Jogo do Bicho e os Deputados Gaúchos

 

A partir da notícia de que a Polícia Civil estaria investigando recursos de campanha de Deputados Gaúchos, divulgada pelo Diário Gaúcho (Grupo RBS) de 14 de maio de 2.001 a CPI tomou um rumo totalmente diverso e inusitado: Os deputados de oposição que compõe a maioria da CPI deram crédito as manchetes daquele jornal, passando a articular com ele uma “jogada” de mídia, visando desgastar a atual Chefia de Polícia e desacreditar um Inquérito Policial extenso, minucioso e de grande repercussão que investiga a Corrupção Policial e lavagem de dinheiro, dentre outros crimes, decorrentes do jogo do bicho no estado do RS.

Dizia a manchete do Diário Gaúcho:

 
“POLÍCIA INVESTIGA GRANA DE

ELEIÇÃO DE DEPUTADOS GAÚCHOS”

 

Ao longo da reportagem o jornal tratou, na verdade do IP 003/00, avocado pela Chefia de Polícia e que investiga crimes decorrentes do jogo do bicho, suas ramificações e a suas formas de atuação, principalmente no que se refere ao envolvimento de policiais. Na matéria fica bastante claro inclusive, que as autoridades policiais consultadas nenhuma notícia forneceram, nenhum dado, nenhum nome, seja de deputados ou de possíveis suspeitos.

De fato, no bojo dos mais de vinte volumes do IP consta a apreensão, quando do “estouro” de uma banca de bicho no município de Estrela de propriedade de um filiado ao PMDB, cartões de visitas e cartas de um deputado estadual daquele partido. Não houve porém nenhuma declaração por parte de quem presidia o IP de ligação deste parlamentar com o Jogo, sendo que a própria CPI, ávida por escândalos, tratou de dar ampla publicidade ao fato, em detrimento de um de seus próprios membros, que teve que gastar tempo considerável explicando que nada tinha a ver com o fato. Aliás, ele nunca foi acusado pela Polícia de ter alguma ligação com a contravenção, até porque o caso estava ainda em investigação, e não passava disto, ou seja, uma hipótese investigatória, sendo que o caso foi tornado público através da própria CPI.

O Presidente do IP, Delegado Carlos Santana, Chefe de Gabinete da Chefia de Polícia, instado pela CPI a apresentar o IP negou-se a faze-lo. É que o procedimento estava resguardado por sigilo judicial, já que o Poder Judiciário havia autorizado a quebra de sigilos telefônicos, não podendo este ser repassado a outros sem ordem do juiz competente. Entregou, porém, os documentos referentes as possíveis ligações entre deputados e banqueiros do jogo ilegal em envelope fechado, e que foi imediatamente lacrado em um “envelope amarelo”. O procedimento do Delegado foi absolutamente responsável e condizente com a necessidade de não atrapalhar as investigações, uma vez que o IP estava em pleno andamento, e sob escudo do sigilo judicial e funcional.

 Inusitadamente, a CPI, com o voto contrário da bancada do PT, decidiu não abrir a “pasta amarela”, e de forma ainda mais estranha, encaminha-la para o Tribunal Regional Eleitoral. Mais uma manobra para confortar as manchetes. Mais um lance que teve um resultado que demonstrou o objetivo irresponsável da oposição de não obter resultados práticos, mas apenas de utilizar-se dos meios disponíveis para desgastar a imagem pública da chefia de polícia.

Não existe explicação plausível para que os documentos entregues pelo Delegado do Inquérito não fossem tornados públicos. Para que insistir no assunto, se apenas repassariam a “pasta amarela” para o TRE? Qual o motivo da investigação do assunto se no momento de esclarecê-lo, e, quem sabe, resolve-lo, a maioria da CPI abriu mão de sua função investigatória?

Apesar de simplesmente repassarem os documentos entregues pelo Delegado Santana, a mesa da CPI ainda insistiu em ter acesso a todo o IP. Como esse se desenvolve sob regime sigiloso judicial, o Presidente do IP negou-se a entrega-lo sem ordem do Juiz ligado ao processo. Finalmente, em julho o Del. Santana repassou ao relator o original do IP 003, que contava então com cerca de 20 volumes, sendo excluídas algumas peças, cujo desentranhamento foi solicitado pelo Ministério Público e deferido pela Juíza que conduz o inquérito, na 5ª Vara Criminal.

No dia 09 de agosto a CPI ouviu o depoimento de todos os seis Delegados que trabalharam no IP 003/00. Na ocasião, os primeiros cinco Delegados, que não atuam mais neste Inquérito testemunharam em sigilo, sem a presença da imprensa e público. O último depoente, atual responsável pelo IP e pessoa de confiança do Chefe de Polícia, porém, depôs em sessão aberta sem tal privilégio, uma vez que, efetivamente, pretendia contribuir com a CPI.

 Estranhamente, o Relator da CPI seguiu uma linha de questionamentos totalmente alheia ao fato em si que motivou a entrega do processo para a CPI, dando mais atenção a forma do que ao conteúdo. Esquecendo que a investigação tratava do Jogo do Bicho e crimes conexos, o interrogatório dos seis delegados cingiu-se a saber como se numerava um Inquérito, como se juntava documentos e a conferir assinaturas. O Delegado Santana, por sua vez tentou, longa e exaustivamente, explicar o modus operandi técnico da Polícia; o porque de se renumerar folhas, pois o processo fora cindido e se desdobrado em outros durante a investigação e que o inquérito foi avocado pelo Chefe de Polícia, por se tratar de um trabalho importante, extenso e que envolvia diversas regiões do Estado.

A tentativa porém, foi frustada. O relator e as bancadas de oposição simplesmente não queriam entender as razões apresentadas, por mais evidentes que fossem, apenas porque pretendiam criar uma “suspeição” na atitude da Chefia de Polícia. De fato, a avocação de Inquéritos pelo Chefe de Polícia tem base em Lei, e se faz necessária sempre que o fato for de tal relevância que seja necessário uma equipe especial para a investigação, ou que se necessite acelerar as diligências. O próprio Chefe de Polícia não investiga, tampouco preside o Inquérito. Ele apenas chama para sí a responsabilidade de dar um andamento privilegiado ao trabalho investigativo, o que na opinião parcial e tendenciosa da oposição da CPI transformou-se em um indício de que existia interesse do Governo no assunto.

Evidentemente o Governo, a Secretaria de Segurança e a Chefia de Polícia têm interesse no caso. Interesse de continuar uma investigação criteriosa, célere e que resulte no desmonte de quadrilhas de banqueiros do jogo e na exclusão de membros da “banda podre” da Polícia, que sabidamente recebe propina desses criminosos. O que não interessa ao Governo era justamente manter um Inquérito Policial e a investigação em curso sob a tutela da CPI, que com a posse dele por meses, obstruindo o trabalho investigativo e prejudicando o sigilo do processual, pois não se faz idéia de quantas pessoas tiveram contato com ele desde então.

 

A CPI NAS ESCOLAS: Entre Vassouras e Detergentes

 

O segundo item investigado que não constava no requerimento da CPI foi uma denúncia de que havia irregularidades na compra de material de limpeza por parte das escolas estaduais, publicada no jornal Zero Hora. Ouvidos vários depoimentos na comissão, ficou comprovado que essas irregularidades iniciaram no governo Collares, passaram por toda a administração Britto e apenas no atual Governo, através da Secretaria de Educação, foi solicitada uma investigação para a Polícia Civil.

A 4ª Delegacia de Polícia de Canoas começou uma investigação sobre uma possível fraude envolvendo escolas públicas estaduais da região. O inquérito policial que apura eventuais irregularidades na compra de materiais escolares e de limpeza nas escolas estaduais tramita desde setembro de 2000, após uma empresa lesada ter registrado queixa na Polícia. Suspeita-se da existência, desde 1993, de um esquema fraudulento na aquisição de tais produtos. Como se nota o caso começou bem antes da instalação da CPI.

Conforme a denúncia, os golpistas apresentavam à escola, com a conivência de alguns diretores, orçamentos de empresas fantasmas, garantindo o menor preço para sua empresa e afastando do processo de licitação a concorrente. Segundo o delegado Rodrigo Zucco, titular da 4ª DP de Canoas, diversos documentos comprovam a fraude, entre eles, notas fiscais, orçamentos e carimbos falsos de empresas que não participavam do golpe.

A denúncia iniciou quando, em 30/8/2000, o empresário do ramo de produtos químicos Nilton Figueiredo dos Santos denunciou na 4ª DP de Canoas que documentos com CGC da sua empresa estariam sendo usados de forma indevida em levantamentos de preços para aquisição de material de limpeza pelas escolas públicas estaduais.

A lei 10576/95 – Lei de Gestão Democrática – deu autonomia para as escolas administrarem seus recursos financeiros. Conforme a queixa de Nilton Figueiredo, duas outras empresas de Canoas - Bondmann e Multilimpe – estariam falsificando, desde 1995, um terceiro orçamento de forma a garantir o fornecimento dos produtos de limpeza para as escolas. Em outubro, o delegado responsável pelo inquérito encaminhou três ofícios à Secretaria de Educação solicitando informações necessárias às investigações.

A resposta foi encaminhada imediatamente ao Chefe de Polícia, delegado José Antônio Araújo. Ao mesmo tempo, a responsável pela 27ª Coordenadoria Regional de Educação foi comunicada do fato e encaminhou ofício a todos os diretores das 80 escolas abrangidas pela Coordenadoria. Uma sindicância administrativa será realizada, pois a Escola Estadual Anne Frank, de Porto Alegre, foi citada como receptora de brindes por parte das empresas fornecedoras de material de limpeza.

No decorrer da investigação foi constatado que a possível fraude não estava circunscrita à região abrangida pela 4ª DP de Canoas e o inquérito foi avocado pela Chefia de Polícia, passando à responsabilidade do diretor do DPM. Além disso, a 4ª DP não apresentava estrutura suficiente para dar andamento às investigações, pois o inquérito requeria dedicação exclusiva e a delegacia não tinha como colocar policiais exclusivamente para trabalhar no caso.

O diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), delegado Conceição Cardoso Pinheiro constituiu uma equipe formada por cinco policiais que passou a trabalhar no inquérito sobre irregularidades na aquisição de materiais escolares e de limpeza. Havia 25 caixas com documentos para serem analisadas.

Para investigar o caso, a CPI convocou os delegados Luiz Antônio Ost Frank, Rodrigo Lorenzi Zucco, e Conceição Cardoso Pinheiro; a Delegada regional da Secretaria de Educação Marina Lima Leal; Natércia Martins Lindemeyer e Laureci Barthman, responsáveis na atual administração e na passada, respectivamente, pelo setor de autonomia financeira das escolas estaduais; Wiliam Edward Vautero Bond, empresário denunciado e Nilton Figueiredo dos Santos, empresário denunciante; Fábio Rosa e Inajara Ferreira, respectivamente coordenadores da Assessoria jurídica da Secretaria da Educação na administração anterior e na atual; e Jorge Luis de Quadros, assessor do gabinete Secretaria da Justiça e da Segurança.

Os depoimentos comprovam que a administração estadual adotou todos os procedimentos cabíveis afim de averiguar todas as irregularidades e punir os responsáveis. Os deputados que este subscrevem demonstram que não há qualquer evidência - como sustentado por integrantes da CPI - de que a Secretaria de Educação tivesse conhecimento de fraudes antes do empresário Willian Edward Bond procurar a 4ª Delegacia de Polícia, em Canoas, para denunciar que documentos falsos com o nome da sua empresa estavam sendo utilizados por criminosos em licitações fraudadas. Assim que a Secretaria foi informada do fato, quando recebeu uma cópia da ocorrência policial, a assessoria jurídica do órgão comunicou a Coordenadora Regional de Canoas, que imediatamente comunicou os diretores das escolas da existência do problema. Ou seja, as medidas possíveis foram adotadas tão logo o Executivo ficou sabendo da denúncia.

A Coordenadora da Assessoria Jurídica da Secretaria da Educação explicou à CPI que “Nós recebemos uma denúncia, na Assessoria Jurídica, oriunda do Gabinete, com despacho da Chefe de Gabinete, para a Coordenação da Assessoria Jurídica, com cópia para o Departamento Administrativo, relatando uma denúncia, sendo que estava juntada cópia de um boletim de ocorrência, relatando exatamente isso, a possível fraude na aquisição de materiais de limpeza por parte de escolas públicas e referindo que o registro de ocorrência era da 37ª Coordenadoria de Educação.”

O delegado Frank foi o primeiro a presidir o inquérito, de setembro de 2000 até março de 2001. Explicou que a investigação foi motivada por denúncia de empresário de que estava sendo fraudada a licitação para compra de material de limpeza em escolas. Procedeu a busca e apreensão na empresa tendo encontrado documentos referentes à orçamentos, carimbos de escolas, comunicação de diretores de escolas. Ouviu também alguns funcionários de empresas e expediu precatórias para ouvir diretores de escolas. Teve contato com a delegada de educação, Sra. Marina Lima, que lhe enviou documentação e esclarecimentos sobre o funcionamento das compras objeto de investigação. Também afirmou que a Delegada de Educação já tinha conhecimento de denúncia e havia expedido uma circular para todas as escolas alertando para o fato.

O depoimento do Delegado Zucco, que também presidiu o IP, explicou que conseguiu verificar o envolvimento de duas empresas a BondMann e a Multilimp. Depreendeu que havia outras empresas de fachada, cerca de 10, montadas todas por representantes comerciais da própria BondMann, que participariam das licitações. As que mais haviam participado eram a Adata e a Wilson Rei, ambas pertencentes a dois representantes atuais da BondMann, concluindo, então, que não havia espécie alguma de concorrência ou licitação na aquisição de materiais.

O delegado afirmou que a irregularidade vinha desde 1993, quando foi criada a empresa Bondmann. Segundo ele, os proprietários das firmas teriam confessado a prática do delito e disseram que era exigido por parte das diretoras que as empresas fornecessem, além do orçamento da BondMann, outros dois orçamentos, e que, então, elas tinham ciência de que os orçamentos eram feitos pela mesma empresa. Segundo o delegado, os próprios representantes da BondMann disseram que havia super faturamento de cerca de 40% no preço desses produtos.

O próprio depoimento do delegado Zucco demonstra que a dimensão do inquérito em questão autorizava a medida adotada pelo Chefe de Polícia, em que pese sua convicção de que tinha condições de encaminhar sozinho a investigação. O exemplo contundente de tal dimensão está no ofício encaminhado à Secretaria da Educação no qual solicitou a nominata de todos os diretores de escolas estaduais desde 1993, relação que poderia chegar a cerca de 12 mil nomes...

Neste sentido responde a Coordenadora Jurídica da SE – Inajara Ferreira – sobre os ofícios do delegado Zucco: “Aí imediatamente, também, nós juntamos os dois ofícios, só que esse ofício do recursos humanos, ele nos questionava, solicitava os nomes dos diretores de escolas públicas estaduais desde 95. Aí é um trabalho hercúleo pra se fazer porque envolve muitos nomes, aí nós juntamos esses dois ofícios e respondemos dizendo: bem, nós temos 3.034 escolas listadas para fornecermos o nome dos diretores dessas escolas. Se nós considerarmos que as eleições – e elas acontecem a cada dois anos, desde 95, o grande número de nomes envolvidos, pode ter acontecido vacância por renúncia, por morte, enfim, afastamento de toda a sorte funcional – nós teríamos um universo para além de 10 mil nomes.”

A Coordenadora da Assessoria Jurídica explicou para os deputados que a Secretaria não instaurou imediatamente uma sindicância porque não dispunha de indícios suficientes para fazê-lo. Não obstante, assim, que foi divulgado pela mídia o nome de uma escola que estaria envolvida nas irregularidades, foi encaminhada a abertura de sindicância. Assim demonstra a depoente: “Aqui, oh, Escola Estadual de 1º... Os colégios que adquirissem o material de limpeza ganhavam brindes, tá... tá... tá. Uma das beneficiadas foi a Escola Estadual de 1º e 2º Graus Anne Frank, situada no Bairro Bom Fim, em Porto Alegre. Bem, esse foi o primeiro momento em que tivemos notícia do envolvimento de uma escola especificamente. Então, entendemos que aqui já se configurava objeto para instaurarmos uma comissão de sindicância para apurarmos o possível envolvimento de servidor público nesta situação.”

Por sua vez, os depoimentos dos empresários Nilton Figueiredo dos Santos e de Wilian Edward Vautero Bond, respectivamente denunciante e denunciado no inquérito policial demonstraram que as irregularidades foram perpetradas por fornecedores dos materiais de limpeza às escolas. Todavia, a CPI não aprofundou as investigações sobre os empresários limitando-se ao questionamento sobre a ação da Secretaria e do Governo do Estado. Os depoimentos prestados, podem ser de grande valia para o andamento da investigação e busca dos verdadeiros culpados pela fraude.

O diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), delegado Conceição Pinheiro, fez um relato em seu depoimento de como estão sendo investigadas as denúncias de supostas irregularidades na compra de materiais de limpeza, por escolas de Canoas. O delegado ressaltou a necessidade de o inquérito ter sido avocado pela Chefia de Polícia em função da falta de estrutura da 4ª DP para dar continuidade a um inquérito tão abrangente como este, pois não teria como dedicar exclusividade às investigações, dada a demanda existente na delegacia de Canoas.

O delegado informou aos deputados que recebeu junto com o inquérito 25 caixas contendo mais de 30 mil documentos e que, ao longo de dois meses, dedicou-se com sua equipe a verificá-los e armazená-los. Os documentos, em sua maioria, são notas fiscais que precisavam passar por uma análise, com o objetivo de se provar se há existência de irregularidade. Segundo o delegado, ainda seriam necessários pelo menos mais três meses de investigação, que inclui a tomada de depoimentos e a realização de algumas perícias, para poder concluir o inquérito. O diretor do DPM ressaltou que o inquérito seria remetido à Justiça somente quando estivesse bem fundamentado, definido as atuações e responsabilidades dos envolvidos.

Assim, embora a CPI tenha iniciado e alardeado o assunto das irregularidades na compra de material de limpeza por escolas estaduais, acabou abandonando o tema sem nada concluir. Talvez por não ter podido provar qualquer envolvimento ou mesmo desídia do governo estadual em dar andamento às investigações; ou talvez por verificar se irregularidade há, sua presença se estende pelos dois mandatos que antecederam o da atual administração, sem que tivesse sido adotada qualquer providência.

Atualmente, o governo aguarda o resultado deste inquérito que está investigando a fraude e implementa uma sindicância sobre escolas expressamente mencionadas como envolvidas em irregularidades. Durante a gestão em curso no Estado, tanto a Secretaria de Educação quanto a Polícia adotaram o comportamento correto, pois a Secretaria alertou os diretores das escolas e a polícia está investigando.

Os depoimentos apresentados na CPI sobre o tema mostraram a adoção das providências possíveis e cabíveis. As investigações empreendidas tanto pela Polícia quanto pela Secretaria da Educação demonstram o compromisso do governo com o trato da coisa pública. Afinal, a informação inicial da fraude chegou à Secretaria através de uma carta anônima e, mesmo assim, houve um alerta geral aos diretores das escolas sobre os indícios da existência de crime. A Secretaria da Educação é a principal interessada em desvendar este esquema e que os responsáveis sejam punidos.

 

O TRISTE PAPEL DE JAIR KIRSCHKE

 

Como já referido, a CPI passou a desviar-se completamente dos fatos propostos para sua constituição e começou a investigar toda e qualquer denúncia que pudesse levar a algum desgaste do governo do Estado e do Partido dos Trabalhadores frente à opinião pública. Nesse sentido vieram os depoimentos dos delegados Farney Goulart e Nelson de Oliveira para trazer suspeitas sobre envolvimento do governo com o jogo do bicho, as denúncias sobre a compra de material de limpeza pelas escolas estaduais e até mesmo um episódio ocorrido no Fórum Social Mundial, em que um jovem foi detido com uma “ponta” de cigarro de maconha.

As supostas denúncias apresentadas faziam ilações forçadas entre o Governo estadual com o jogo do bicho e a regulamentação de jogos pelo Estado.

A primeira denúncia surgiu em 17 de maio a partir dos depoimentos dos Delegados Farney Goulart e Nelson Soares Oliveira. Farney, que foi diretor do DEIC no início do atual governo, teria ouvido o ex-Chefe de Polícia Luís Fernando Tubino afirmar em reunião do Conselho Superior de Administração da Polícia – CAS – que o dinheiro do jogo do bicho agora iria para obras sociais do Governo do Estado. Nelson, que foi assessor jurídico da chefia de polícia, teria tido uma conversa com o ex-Chefe Tubino na qual questionou se era verdade que agora o dinheiro do jogo do bicho iria para o chefe, ao que recebeu a resposta de que sim, mas que o chefe era o Olívio, o PT.

A segunda denúncia se refere a regulamentação da LOTERGS na qual foram previstas as modalidades de jogos a serem autorizadas pela Secretaria da Fazenda. O Decreto nº 40.593 foi editado em janeiro de 2001 e previa dentre as modalidades a videoloteria e a loteria on line – real time. O Ministério Público Federal e o Estadual advertiram o Governo em fevereiro de 2001 que a competência para legislar sobre jogos é privativa da União, através da Caixa Econômica Federal, e que os jogos denominados videoloterias – apelidados de “caça-níqueis” – seriam contravenção, e, portanto, ilegais.

O Governo, a partir dos alertas do Ministério Público e das dificuldades para exercer uma efetiva fiscalização sobre as máquinas de jogos eletrônicos, revogou a parte do Decreto relativa às videoloterias. Por uma infelicidade a revogação saiu publicada no dia 18 de maio, portanto, um dia após as supostas denúncias dos delegados à CPI. Essa coincidência passou a alimentar a CPI que começou a estabelecer ligação entre os dois fatos.

Por falta de credibilidade, pois as acusações se baseavam apenas no “ouvir alguém dizer que...”, surge, então, o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos - Jair Krischke -, secundado por dois conselheiros da entidade, com a chamada “Denúncia ao Poder Legislativo”.

A base da denúncia seria o suposto envolvimento e/ou proximidade do governo do Estado com a jogatina clandestina e até com a máfia internacional vinculada ao setor. O dossiê apresentado consegue fazer ligações entre a (a) edição de decreto governamental regulamentando o departamento de loterias – LOTERGS -, integrante da Secretaria da Fazenda, sucessora legal da extinta Caixa Econômica Estadual em relação à loterias; (b) carta ao diretor da Lotergs enviada por representante de sociedades administradoras de bingos e afins pedindo a manutenção da regulamentação das videoloterias; (c) propostas de instruções normativas da Secretaria da Fazenda não publicadas e tampouco assinadas; (d) ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal em 1999 contra o ex-Ministro dos esportes e Turismo – Rafael Valdomiro Greca (PFL) – vários de seus assessores, e lobistas de bingos que atuavam junto ao extinto Indesp.

No detalhamento, a tese do MJDH cita meros textos de instruções normativas que não passaram de estudos que, embora internos, foram amplamente debatidos e manipulados por técnicos da Loteria do Rio Grande do Sul (Lotergs) e que sequer foram publicados. Somente a publicação no Diário Oficial tornaria os documentos oficiais. O MJDH ainda avaliza, como suas fontes, os dois delegados que "denunciaram relações dos banqueiros do jogo do bicho com o Palácio Piratini".

O documento do MJDH é duplamente mal intencionado. Primeiro, porque, seguindo a tática da confusão, mistura propositadamente o tema do jogo do bicho com o assunto das loterias. Depois, porque omite que os delegados Nelson Oliveira e Farney Goulart deram uma versão que outros 10 colegas rejeitaram, oficialmente em depoimentos à CPI.

A peça do MJDH afirma, porém, no dia 17 de maio, o senhor Juarez Rosa da Silva, apresentado como consultor empresarial de sociedade administradora de bingos, encaminhou correspondência ao diretor da Lotergs pedindo que o Governo revisasse a decisão de suprimir do decreto de janeiro autorização para as máquinas caça-níqueis.

Mas se foi exatamente neste mesmo dia 17 de maio que foram ouvidos os delegados na CPI qual a relação entre os depoimentos desses policiais e a decisão do Governo do Estado?

A denúncia apresentada em 20 de junho de 2001 provocou sua imediata convocação para depor na CPI da Segurança Pública, o que ocorreu no dia 25 do mesmo mês.

O depoimento do presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, não acrescentou nenhuma novidade que pudesse ajudar as investigações da CPI da Segurança Pública, mas contribuiu para introduzir novos assuntos e uma chamada “testemunha-bomba”. A apresentação feita na CPI requentou denúncias contra o Chefe de Polícia, contra delegados e contra o Corregedor da Polícia Civil, todas já analisadas e arquivadas pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário. A grande novidade apresentada por Krischke foi a crítica feita ao Ministério Público que foi chamado pelo depoente de “Triângulo das Bermudas”.

Em 25.06, este foi bem claro:

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Sim, nós fizemos aquilo que a lei prevê e publicamente. Nós levamos ao conhecimento do Ministério Público uma notícia crime elencando todos os fatos e mostrando com clareza que havia minimamente dois crimes. O crime de prevaricação e o crime de abuso de autoridade. Por solicitação do Ministério Público, essa queixa foi arquivada na 5ª Vara Criminal. Eu não estou absolutamente... Por favor, Srs. Deputados, eu não estou absolutamente acusando nada. Eu estou só solicitando, vamos investigar. Já corre na cidade um boato, Deputado Zülke, assim, que a Coordenadoria das Promotorias Criminais, a 5ª Vara Criminal hoje são chamadas graciosamente de Triângulo das Bermudas. Tudo vai para arquivo. A delegacia papel de que é acusado o atual Chefe de Polícia também foi pedido o arquivamento. E foi arquivado. É interessante isso. Eu acho que é... Estou dizendo que, e é salutar.

 

E, mais adiante, sobre a força-tarefa, que legitimamente agrega membros do Ministério Público e Policiais, numa experiência vitoriosa no combate do crimes de maior gravidade alega:

 

“... Inclusive entreguei como sugestão, até para que as coisas sejam bem separadas, que a Coordenadoria das Promotorias Criminais exerça o seu papel, o Conselho Superior de Polícia faça a sua tarefa e esta força-tarefa seja extinta para as plenas garantias constitucionais neste Estado. É muito preocupante, porque, caso contrário, Deputado Ronaldo Zülke, poderá acabar se transformando na força do governo, e isto é ruim para a democracia...”

 

A postura do presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos na CPI foi muito estranha pois ele condenou todos: Governo, Ministério Público, a Força Tarefa que iniciou seus trabalhos na CPI do Crime Organizado, a Assembléia Legislativa, o Poder Judiciário, a Chefia de Polícia, o Conselho Superior de Polícia, a Corregedoria da Polícia Civil, ou seja, na opinião de Krischke, todas as instituições que atuam, ou atuaram, no combate ao crime organizado estão sob suspeita, como se ele fosse o único a pairar acima do bem e do mal. A Força Tarefa teve seu trabalho elogiado por todos os partidos que participaram da CPI do Crime Organizado e, devido a sua eficácia, continuou a ser implementada mesmo após o término da CPI.

Por iniciativa dos deputados subscritores, através de requerimento milagrosamente aprovado, foram convocadas oito testemunhas que foram referidas na “denúncia” de Jair Krischke ao Poder Legislativo. Sete delas são ligadas a empresas de jogos: Antônio Carlos Portugal, procurador da empresa Chance; Carlos Alberto Martinez de Azambuja, procurador da empresa Neojuegos; Mário Alberto Charles e Silvana Luca, proprietários da Kater Administradora de Eventos; João Carlos Cunha, denunciado como um mais influentes banqueiros do jogo do bicho de Porto Alegre; Thales Carvalho citado como o maior banqueiro do jogo do bicho da capital e Eduardo Noal Viulicino, representante as empresa Tecno Turfe. Também foram solicitados os depoimentos dos delegados de polícia Abílio Andreoli Pereira, que em 1997 liberou o funcionamento de máquinas eletrônicas de jogos e hoje está afastado da Polícia por suspeita de envolvimento com crime, e Hilton Müller, além de cópias do inquérito policial em que Thales Carvalho figura como denunciado.

Todavia, a CPI não aprovou a convocação do delegado Hilton Müller, apesar de evidenciada sua denúncia pelo Ministério Público por abuso de autoridade e constrangimento de testemunhas da CPI do Crime Organizado. A reação destes setores mostra a intenção de esconder determinados fatos da sociedade gaúcha. O delegado, sobre o qual pesam as denúncias, foi convidado para assessorar a CPI, mas tal não se concretizou formalmente devido ao seu afastamento preventivo realizado nos termos da legislação, em decorrência da denúncia do Ministério Público e do respectivo recebimento pelo Judiciário.

Ressalte-se que esse delegado só veio a depor recentemente, ao término dos trabalhos da CPI, após apresentação de documentos pelo Secretário substituto da Justiça e da Segurança, Lauro Magnago.

Durante o depoimento de Krischke, Ronaldo Zülke propôs que a CPI solicitasse a ata da reunião do Conselho do Movimento de Justiça e Direitos Humanos que discutiu o tema. O deputado havia feito o pedido a Jair Krischke, que se recusou a entregar o documento. Krischke observou ainda que só entregaria a ata se fosse obrigado pelo Poder Judiciário. A negativa tão veemente dá margem à conclusão de que o documento entregue à Assembléia por Krischke não foi uma iniciativa do MJDH, mas uma decisão pessoal do presidente e outros dois integrantes do Movimento. Além disso, nenhuma manifestação houve por parte da Mesa da CPI em relação à negativa, esquecendo-se, momentaneamente das prerrogativas constitucionais de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.

Para melhor compreensão do conjunto de denúncias de Jair Krischke, passaremos a tratá-las em tópicos, como segue.

 

a) LOTERGS

 

Com a extinção da Caixa Econômica Estadual, a competência para administrar e regulamentar o tema das loterias no Estado do Rio Grande do Sul passou para a estrutura da Secretaria da Fazenda. Após, um período de estudos e reflexões, o governo entendeu por editar decreto regulamentando a estrutura interna da Secretaria da Fazenda que seria a responsável pela área de loterias. Para melhor entendimento, apresentamos um resumo sobre a legislação a seguir.

 

 

HISTÓRICO DAS LOTERIAS

 

DATA

LEGISLAÇÃO

CONTEÚDO

28/02/1843

Decreto

Cria a Loteria do Estado do RS

10/02/1944

Decreto-lei 6.259

Dispõe sobre o serviço de loterias federal e estadual

15/01/1947

Decreto-lei 1.350

Institui a exploração de loteria pelo Estado

27/02/1967

Decreto-lei 204

 

Dispõe sobre a exploração de loteriais e dá outras providências. No art. 32, determina que não poderiam mais serem criadas loterias estaduais, mantendo-se apenas as já existentes, sendo que as loterias existentes não poderiam aumentar suas emissões, ficando limitadas às quantidades de bilhetes e séries em vigor na data da publicação deste decreto-lei. No art. 33, esclarece que as loterias estaduais continuam obedecendo ao decreto-lei 6.259.

16/07/1975

Lei 6.893

Transfere para a Caixa Econômica Estadual o serviço público de loteria do Estado do Rio Grande do Sul e extingue o Departamento de Loteria do Estado.

“Art. 1º - O serviço público de Loteria do Estado do Rio Grande do Sul, permitido pela União Federal, passa a ser explorado, com exclusividade, pela Caixa Econômica Estadual, de acordo com a presente Lei e em consonância com a legislação federal.

Art. 2º - É extinto o Departamento de Loteria do Estado(...), passando todo o seu patrimônio para a propriedade da Caixa Econômica Estadual.”

20/07/1988

Decreto 32.914

Autoriza a Caixa Econômica Estadual a AUMENTAR a emissão de bilhetes lotéricos até 100 mil

05/10/1988

Constituição Federal

O art. 195 determina que “A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

...

III – sobre a receita de concursos de prognósticos.”

16/05/1990

Decreto 33.531

Institui na Caixa Econômica Estadual, a loteria instantânea, com bilhetes de resultados imediatos

19/10/1995

Decreto 36.233

Institui na Caixa Econômica Estadual o sistema lotérico “On Line/Real Time”

27/05/1997

Lei 10.959

“Art. 18 – A execução do serviço público de Loterias do Estado do Rio Grande do Sul, atribuída à Caixa Econômica Estadual pela Lei nº 6.893, 16/07/1975, será transferida ao órgão integrante da estrutura da Secretaria da Fazenda...”

27/12/2000

Lei 11.561

Introduz alterações na Lei nº 8.109, de 19 de dezembro de 1985, que dispõe sobre a Taxa de Serviços Diversos.

Anexo VII – Serviços da Secretaria da Fazenda: elenca taxas para credenciamento, autorização e veiculação de propaganda institucional de Bingo Tradicional, Videoloteria, Loteria Instantânea, Loteria de Chances Múltiplas e Loteria On Line/Real Time; percentuais e taxas de fiscalização da exploração das loterias de Bingo e Videoloteria; e taxas de selo anual e de auditoria de homologação de softwares para a Videoloteria e a On line/Real Time.

16/01/2001

Decreto 40.593

Introduz alterações no decreto 37.297, 13/03/1997, (estrutura da Secretaria da Fazenda), dispõe sobre a Loteria do Estado do Rio Grande do Sul, institui modalidades lotéricas (bingo tradicional gaúcho, videoloteria e chances múltiplas) e refere outras já instituídas (loteria estadual, loteria instantânea e on line/real time)

No art. 2º, III, que acrescenta o art. 16 ao Decreto 37.297, está claro que qualquer modalidade lotérica somente seria autorizada pela Lotergs após a expedição de instrução normativa específica.

...

“V – regulamentar, através de instrução normativa, as novas modalidades lotéricas e os concursos de prognósticos existentes e os que vier a instituir;”

....

19/02/2001

Instrução Normativa Lotergs nº 001/2001

Dispõe sobre o credenciamento de Permissionário para exploração de Loterias Estaduais

Art. 3º “O credenciamento não implicará o direito de operação, o qual dependerá da expedição da autorização de funcionamento”

Art. 7 “O Certificado de Credenciamento será expedido pela Lotergs e publicado no Diário Oficial do Estado”

20/02/2001

Instrução Normativa Lotergs nº 002/2001

Normatiza a emissão de autorização de funcionamento, a operação e o controle da Loteria de Chances Múltiplas

18/05/2001

Decreto 40.765

Introduz alterações no Decreto 40.593, 16/05/2001. Revoga a modalidade de videoloteria

 

COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR

 

O assunto, como se pode observar na legislação federal e dos Estados (anexo), tanto do RS quanto dos demais, é suscetível a diferentes interpretações no que diz respeito à competência para legislar sobre o tema. Tanto há diferentes interpretações que o próprio Poder Judiciário se divide nas decisões: ora favoráveis aos Estados, ora à União. Quanto à questão específica da videoloteria, também há divergências entre os juristas (anexo). Isto tudo revela a necessidade de uma legislação que seja efetivamente clara e não dê margem à discussão. Somente desta forma será possível coibir a utilização de eventuais divergências em prol de que atividades na área lotérica sejam desenvolvidas, amparadas em decisões liminares, sem qualquer fiscalização pública. Um exemplo é a liminar concedida pela desembargadora do TJ/RS, Elba Nicolli Bastos, no Mandado de Segurança nº 70002068922, de 26/12/2000. Argumenta a desembargadora, “(...) o próprio Estado (União) autoriza a importação dos equipamentos, cobrando o respectivo imposto, também permite a criação da empresa para depois interditar por ilegal sua exploração o que de certa forma causa surpresa pela incongruência e falta de unicidade dos Órgãos Públicos (...)”.

 

RECOMENDAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - O Governo do Estado recebeu uma recomendação do Ministério Público Federal e, mesmo com toda a discussão nacional a respeito do tema, retirou do decreto a modalidade videoloteria sem ter, neste meio tempo (entre a publicação do decreto e a revogação da modalidade videoloteria), autorizado o funcionamento de qualquer máquina deste tipo de jogo no Estado, mesmo porque jamais houve regulamentação publicada no DOE.

É importante ressaltar que a data da recomendação (22/02/2001) é posterior ao decreto 40.593 (16/01/2001). Também é importante esclarecer que a recomendação do Ministério Público expressa tão somente a opinião dos procuradores que a firmam. Se fosse do órgão (Ministério Público Federal) seria aplicada nos demais Estados brasileiros que legislam amplamente sobre loterias. No que se refere à videoloteria, a recomendação foi levada em conta pelo Estado porque, somado aos argumentos dos procuradores mencionados, também estava o fato de que há grande dificuldade na implantação de um sistema eficaz de fiscalização desta modalidade de loteria. Cada máquina possui um software individual que precisa ser auditado, o que nos moldes tecnológicos atuais da Lotergs exigiria, na prática, um fiscal ao lado de cada máquina de videoloteria. A retirada da modalidade do decreto também teve um caráter jurídico preventivo: de que, com base na previsão da videoloteria constar do decreto 40.593, fossem obtidas decisões judiciais favoráveis ao funcionamento destas máquinas.

 

AÇÃO CONTRA JOGOS CLANDESTINOS NO RS

 

 A “denúncia” do MJDH dizia também que a jogatina não sofria qualquer hostilidade no Estado.

Desde 1999, o atual governo vem tendo suas várias ações de repressão às máquinas eletrônicas de jogos canceladas por decisões judiciais. Como exemplo, pode-se citar a decisão de janeiro de 2000 do desembargador Cacildo de Andrade Xavier – então presidente do Tribunal de Justiça do Estado - deferindo o mandado de segurança impetrado por Flipertronics Indústria e Comércio de Aparelhos Eletrônicos Ltda., contra a Secretaria da Justiça e da Segurança. Determina a abstenção de apreensões de máquinas eletrônicas dessa empresa, inclusive aquelas que vierem a ser utilizadas por ela, bem como de ato que impeça a continuidade de sua atividade de operação, locação e de comercialização de tais equipamentos via autoridade policial.

Como a legislação comprova, vários governos, preocupados com a situação de falta de amparo aos consumidores de jogos (que vêm historicamente se mantendo apoiados em ordens judicias), emitiram leis e decretos sobre o tema. Estas legislações estão em vigor e nunca foram questionadas, inclusive, o decreto do governo Britto que institui a modalidade On Line/Real Time, o “cassino virtual” do MJDH. (Decreto 36.233/95)

Na CPI, os depoimentos realizados no dia 11 de junho demonstraram que há interpretações diferentes para o tema, de maneira que não se pode taxar como ilegal a atitude do Estado de buscar regulamentar e moralizar um tema tão polêmico, sem realizar uma análise aprofundada.

O chefe da Divisão Operacional da Lotergs, Mário Gasparin, no depoimento à CPI da Segurança comprovou aos deputados que a Loteria do Estado não autorizou o funcionamento de nenhuma máquina de videoloteria ou caça-níquel no Estado. Gasparin esclareceu que apenas na modalidade de loteria chances múltiplas há empresas autorizadas pela Lotergs a funcionar (jogos “Mais Fácil” e “Toto Bola”, que circulavam há vários anos no Estado mediante autorização federal). De acordo com Gasparin, apesar da modalidade videoloteria ter constado no decreto 40.593, de 16 de janeiro de 2001, seu funcionamento não foi normatizado, por isso, não havia qualquer possibilidade de uma empresa requerer autorização de funcionamento. Ele também explicou que, devido à dificuldade de fiscalização das videoloterias (muitos tipos de software e muitas máquinas) e recomendações do Ministério Público Federal, a Lotergs decidiu retirar esta modalidade do decreto. "Também levamos em conta o fato de que muitas videoloterias estavam se baseando no decreto para solicitarem, por via judicial, autorização de funcionamento", complementou Gasparin.

Durante a sessão, também depôs o diretor de Loterias da Caixa Econômica Federal, Marco Antônio Lopes, que afirmou aos deputados que a competência sobre a legislação das loterias está gerando polêmica em todo o país: "muitos Estados contestam a competência exclusiva da Caixa", admitiu Lopes, acrescentando que, no entendimento da Caixa, a competência é exclusiva do Governo Federal. As diferentes interpretações da legislação em todo o país fazem com que existam diversos Estados autorizando as mais diversas formas de loterias O diretor da Caixa citou o exemplo do Rio de Janeiro que, por decisão judicial, regulamenta e fiscaliza de forma exclusiva todo o tipo de loteria, inclusive bingos.

Ressalte-se, portanto, que nenhuma empresa referida na "denúncia" tem qualquer relação com a Lotergs. As únicas duas empresas credenciadas pela Lotergs estão autorizadas, por apresentarem toda a documentação necessária e terem efetivado o pagamento das taxas previstas na Lei 11.561 de 27 de dezembro de 2000, a explorar a modalidade Chances Múltiplas. Estão credenciadas, de acordo com as exigências das Instruções Normativas Lotergs 001/01 e 002/01, as empresas June - Agência de Empreendimentos Ltda (Mais Fácil) e Kater - Administradora de Eventos Ltda (Toto Bola).

Posteriormente, em 03 de setembro, seguiram-se outros depoimentos em relação às loterias. Os novos depoimentos também demonstraram que as empresas que exploram as diversas modalidades de jogos estão amparadas na lei, a exemplo do que acontece em Santa Catarina, Paraná e Rio de Janeiro. Prestaram depoimentos o atual diretor da Lotergs, José Vicente Brizola, e o ex-diretor, Antônio Carlos Contursi.

O atual e o ex-diretor da Loteria do Estado do Rio Grande do Sul (Lotergs), reafirmaram a necessidade de modernização da Lotergs para a sobrevivência da instituição mais antiga do país no setor.

Pode-se afirmar, a partir dos depoimentos colhidos, que o debate sobre as modalidades de jogos dentro da CPI evidencia uma série de interesses. O ex-presidente da Lotergs informou que há uma tendência de monopolização do mercado por parte da Caixa Econômica Federal. “A Caixa Econômica Federal arrecada cerca de R$ 100 milhões no Rio Grande do Sul. Ao mesmo tempo, há disposição expressa de alguns setores de levar à falência a loteria do Estado, que é a mais antiga do país com 158 anos”, frisou.

Contursi, que ocupou o cargo de diretor da Lotergs de 17 de março de 2000 a 14 de fevereiro de 2001, lembrou que a Loteria gaúcha é a mais antiga do Brasil. Ele esclareceu aos deputados que a Lotergs precisava acompanhar a modernização já verificada em outras loterias estaduais e também na Caixa Federal, que controla os jogos da União. Por isso, desde o início de sua gestão, procurou reunir subsídios para promover as modificações necessárias na estrutura da Lotergs. O ex-diretor disse em seu depoimento que recebeu para apreciação, inclusive, um anteprojeto de lei sobre a criação da autarquia da Loteria de autoria do deputado Sérgio Zambiasi.

O atual diretor da Lotergs, José Vicente Brizola, que está no cargo há cerca de sete meses, entregou ao relator da CPI, deputado Vieira da Cunha, cópia da sua agenda contendo todos os compromissos desde o dia da sua posse. Pela agenda, os deputados comprovaram que o diretor da Lotergs recebeu diversos empresários do setor, representantes de empresas nacionais e de fora do Brasil. De acordo com José Vicente, os empresários buscavam informações sobre as modalidades de loterias criadas pelo decreto 40.593 de 16 de janeiro de 2001 e eram informados de que apenas a modalidade chances múltiplas havia sido regulamentada e que nesta modalidade as empresas poderiam solicitar credenciamento.

Na agenda também constavam, e foram confirmadas pelo diretor da Lotergs, as visitas à Loteria feitas por parlamentares que, da mesma forma, buscavam informações sobre a legislação, entre os quais o vereador de Santo Ângelo Hélio Costa de Oliveira (PDT) e o deputado estadual Luís Augusto Lara (PTB).

José Vicente defendeu que o poder público não pode se omitir na questão dos jogos. "Quando há omissão é que se abrem brechas para a contravenção, lavagem de dinheiro, etc.”, frisou. O diretor da Lotergs afirmou que a legislação brasileira deve ser modificada para atender ao cidadão. “O Brasil está em um vácuo de legislação. Por um lado, proíbe o Estado de fiscalizar as máquinas de videoloteria e, por outro, concede através de liminares na Justiça, autorização para que estas mesmas máquinas funcionem sem qualquer garantia da lisura do jogo ao cidadão”, argumentou.

 

b) O "CASSINO VIRTUAL"

O dossiê investe, a seguir, contra o que chama de "cassino virtual" que nada mais é do que a modalidade de loteria On Line/Real Time, criada em 1995, pelo então governador Antônio Britto, que assinou o decreto número 36.233, de 19 de outubro daquele ano.

Um breve histórico sobre a questão das loterias na Caixa Estadual:

A Lei nº 6.893, de 16 de julho de 1975, transfere para a Caixa Econômica Estadual o serviço público de loteria do Estado do Rio Grande do Sul, extinguindo o Departamento de Loteria do Estado. Em 1990, através do Decreto nº 33.531, o governador Alceu Collares criou a "loteria instantânea, com bilhetes de resultados imediatos". Em 1995, como já foi referido, o governador Antônio Britto cria a modalidade "On Line/Real Time". Com a extinção da Caixa Econômica Estadual, toda a execução do serviço público de Loterias do Estado foi transferida à Secretaria da Fazenda.

Em diversos Estados, o "cassino virtual", como foi chamado pelo "denunciante", existe e é amparado legalmente, como são os casos de Santa Catarina, Rio de Janeiro e Paraná. Os Estados brasileiros legislam a respeito de diversas modalidades de loteria.

 

c) A TESTEMUNHA BOMBA

 

No dia em que entregou a peça com as supostas "denúncias" sobre a jogatina clandestina, Jair Krischke anunciou à CPI que tinha uma gravação de uma entrevista de uma testemunha bomba que iria confirmar suas denúncias contra o Governo do Estado. A testemunha era o ex-tesoureiro do PT, Jairo Carneiro dos Santos, que foi expulso por se apropriar de dinheiro do partido.

No início, Jair confirmou a entrega de uma fita com uma entrevista dada por Jairo ao jornal Diário Gaúcho, em que ele faria supostas denúncias contra o Governo do Estado e PT. Depois, Jair anunciou que a testemunha bomba iria pessoalmente à CPI.

A seguinte seqüência no depoimento de Jair Krischke no dia 25 de junho, demonstra a preparação engendrada pela mesa diretora da CPI para trazer a testemunha, constituindo uma verdadeira armação, como adiante se verá. Vejamos as passagens, quando fala o vice-presidente da CPI, Deputado Elmar Schneider (PMDB):

 

“O SR. ELMAR SCHNEIDER – Não tens conhecimento. Tu falaste – e me chamou a atenção – dessa forma que estava se organizando a compra e a Logibingo de um montante de 600 mil reais, e que esse dinheiro tinha desaparecido. Me diga uma coisa, mas desapareceu, sumiu de que forma? Aonde é que, talvez, tenha parado essa grana?

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Segundo informações que temos foi destinado, segundo informações que nós temos, e acredito que brevemente esta CPI tomará conhecimento, foram destinados à campanha eleitoral do Sr. Olívio Dutra.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – O Senhor já ouviu falar do Clube da Cidadania?

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Bastante, bastante e até quero salientar, quando estavam organizando este Clube fui convidado a participar da constituição deste Clube e lembro que na ocasião fiz três perguntas, que nunca me foram respondidas e nunca voltaram ao convite. Portanto, conheço lá do nascimento, a partir deste convite que me foi feito e este Clube da Cidadania tem freqüentado seguidamente algumas observações que partem de várias pessoas. Eu lembro que no pleito passado o candidato Alceu Collares várias vezes referiu-se ao Clube da Cidadania.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Dr. Jair, na sua opinião porque que haveriam de constituir esse Clube da Cidadania, que tipo de serviço um clube desse pode vir a prestar á sociedade gaúcha? Para quem, por quê? Qual a finalidade na sua opinião? Por que foi constituído o Clube da Cidadania?

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – O Clube da Cidadania tem um estatuto registrado no Cartório do Registro Especial, onde diz dos seus objetivos. Ele é um clube onde tem a missão de ser proponente de seguros de vida em grupo, e outras atividades no mercado segurador, e o resultado desta atividade ser destinado a organizações da sociedade civil e ao Partido dos Trabalhadores.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Ou seja, então é um clube oficial que tem declaração de Imposto de Renda.

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Tem, tem registro, tem direção, tem tudo claro.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Vem cá, voltando de novo, 600 mil reais é muito dinheiro, se desaparecei na compra da loja, talvez tenha ido, como o Senhor falou para a campanha do Olívio Dutra, mas a origem deste dinheiro. Da onde é que veio o dinheiro? Dinheiro não cai do céu. Na sua opinião, qual a origem desse dinheiro?

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Está claro no depoimento do Capitão Airton, que esse dinheiro era administrado pelo Grupo da Sorte, e que esse dinheiro foi desviado, e ele chama atenção, era um fundo para aquisição de uma loja de Bingo e foi desviado.

Segundo notícias que nós temos, esses 600 mil foram carreados via Clube da Cidadania para aquisição, em nome do Clube da Cidadania, da sede estadual do PT e para a campanha. Então havia uma dupla destinação. Por isso nós chamávamos a atenção de que aquilo que dizia o Capitão era muito importante, porque existe uma denúncia que chegou ao nosso conhecimento neste sentido e que tenho certeza será proximamente objeto de exame por esta CPI.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Sr. Presidente, Sr. Relator, eu confesso a vocês que eu marquei aqui uma das coisas que a mim chamou muita atenção, que 600 mil reais realmente é muito dinheiro, por isso a minha pergunta da origem, procedimento e veja bem o que estamos ouvindo agora do Grupo de Sorte, portanto, é algo realmente preocupante. Peço aqui ao Sr. Presidente e ao Sr. Relator para que realmente aquilo que nós acabamos de ouvir neste momento, que este dinheiro, muito dinheiro, mais de meio milhão de reais, quem sabe, tenha passado pelo Clube da Cidadania, temos que ver essa declaração de renda, tenha servido, quem sabe esse dinheiro, para a compra da sede do Partido dos Trabalhadores. Acho que é muito grave, muito gravíssimo, e tenha claro isso tem a preocupação, o Ronaldo Zülke está preocupado, e eu também quero dizer, Sr. Presidente, seria apenas isso, e confirmar que o Marcelo realmente é irmão do Capitão Airton e que tem, quem comanda é ele, uma...

(...)

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Ora, Sr. Presidente, queria lamentar, acho que mais dizer que as ruas estão esperando muito por essa CPI, lamentar fatos como esses estejam acontecendo. Dr. Jair, diga, com toda a sinceridade, que me chamou a atenção, nós estamos aqui já quase 10 horas da noite, desde as 14horas, vamos ficar mais, madrugada adentro, não importa, agora aqui está o ex-líder do governo e aqui está o atual líder do governo. Aqui foi dito que os 600 mil reais, mais de meio milhão de reais, tenha talvez, claro, a gente vai buscar isso através da declaração de renda e tudo, tenha passado pelo Clube da Cidadania e tenha chegado na campanha política e tenham chegado na compra da sede do Partido dos Trabalhadores.

E aqui o Senhor, está aqui como testemunha, mas para mim é fundamental neste momento, aqui estão os veículos de comunicação, aqui está a sociedade gaúcha, que no meu entender está louca para ouvir do Senhor, Dr. Jair, que tem uma história muito linda, que nós conhecemos. Agora aqui o Senhor foi desafiado pelo ex-líder do governo e pelo atual líder do governo que não havia nenhuma prova. O Senhor me permita, eu vou ser muito direto. Referente a esta questão dos 600 mil reais, referente a esta questão do Clube da Cidadania, referente a esta questão que este dinheiro pode do Grupo da Sorte ter ido para a compra da sede do PT, existe, Dr. Jair alguma prova, de algum papel, de alguma finta, existe alguma coisa neste sentido, porque o Senhor foi desafiado pelo líder do governo, acho que o povo na rua, neste momento, quer saber se, realmente, existe alguma prova neste sentido. (grifamos)

 

O SR. JAIR LIMA KRISCHKE – Deputado Schneider, chegou ao nosso conhecimento uma fita gravada com declarações contundentes, que não ficam somente nos 600 mil, avançam mais. Nós ouvimos esta fita, conhecemos esta fita e existem outras cópias guardadas, em locais seguros, porque dada a gravidade, faz-se necessário que esta CPI tome conhecimento pleno do que existe nesta gravação. (grifamos)

E nós traremos a esta CPI, se for necessário, esta gravação, para que aqui se comprove da autenticidade, para que aqui se comprove aquilo que, preliminarmente, nós colocamos e gostaríamos de ficar por aqui para que possamos não mais agora, 10 horas da noite, mas com tempo amplo, podermos examinar com toda a serenidade, porque é muito importante, é muito decisivo, isso não faz parte da história deste Estado e precisa ser apurado, precisa ser apurado e irmos até as últimas conseqüências. Caso contrário, nós, os rio-grandenses, estaríamos abrindo mão daquilo que tem sido uma apanágio da nossa gente, a coragem, a honestidade e a transparência daquilo que ocorre no mundo político do Rio Grande do Sul.

Ao longo da história, concordamos e discordamos neste Estado, mas isto tudo foi feito às claras, isto tudo foi feito a portas abertas. E eu sei exatamente da gravidade do tema e por isso o Deputado Schneider, lhe declaro, nós temos a gravação, conhecemos exatamente o seu teor, já ouvimos, mas gostaríamos de, numa oportunidade, que deve ser o mais próximo possível, provavelmente amanhã, tratarmos deste assunto.

 

O SR. ELMAR SCHNEIDER – Sr. Presidente, eu quero confessar-lhe, depois de nós termos ouvido aqui, e a gente conhece e tenho acompanhado esta história do Dr. Jair, que realmente não acreditávamos que essas acusações, naquilo que o Senhor falava, podiam ter sido coisas inventadas e levianas, portanto, o Senhor fala aqui em fita, quero dizer que estou perplexo. Acho que nós chegamos num ponto em que realmente vale uma reflexão. Nós, Sr. Presidente, no meu entender, temos que nos reunir, quem sabe numa convocação extraordinária, para sabermos qual será o próximo passo da nossa CPI, que realmente muito grave que não se trate de acusação, trata-se, já, de documento. Portanto, quero aqui apenas dizer que eu solicito a V. Ex.ª, o Relator, para que pense qual será o primeiro passo. Se for necessário, que haja uma convocação urgente extraordinária para sabermos quem serão as pessoas que devam ser ouvidas, já que estamos diante, agora, de documentos e de provas.”(grifamos)

 

O que resta inexplicado é o simples fato de que como que uma testemunha tão

No dia seguinte, 26 de junho, deu-se a continuação do depoimento de Jair Krischke que apresentou a fita. Sob o argumento de que a testemunha estava presente, os deputados decidiram ouví-la ao invés de ouvir a fita. Os deputados produziram um verdadeiro espetáculo para o depoimento de Jairo Carneiro – testemunha bomba. Mas, no início do seu depoimento, Jairo afirmou que mentiu na entrevista aos jornalistas do Diário Gaúcho para procurar se vingar do PT que o tinha expulsado. Ele chegou a pedir desculpas ao PT e às pessoas atingidas pelas suas invenções.

O ex-tesoureiro do PT, Jairo Carneiro, negou a veracidade do conteúdo da fita cassete gravada por quatro jornalistas, onde ele teria relacionado o dinheiro do jogo do bicho com a campanha de Olívio Dutra ao governo do Estado e com a compra da sede do estadual do PT. Carneiro afirmou que a gravação não foi autorizada e que as declarações feitas por ele foram fruto de sua revolta com o PT, em função de seu desligamento do partido. O ex-tesoureiro foi expulso do PT depois que uma sindicância comprovou que ele havia desviado recursos do partido. Segundo o ele, a fita gravada pelos jornalistas foi entregue ao presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, à sua revelia.

 

Segundo Jairo Carneiro, em 26.06:

 

“...Nessa fita eu faço várias referências ao processo – que também hoje já é público – da aquisição da sede do Partido dos Trabalhadores pelo Clube de Seguros da Cidadania. Conversei com os jornalistas dizendo que havia dinheiro do jogo do bicho na aquisição, na compra da sede do Partido, e citei algumas pessoas que teriam feito essas tratativas. Para minha surpresa, não surpresa, porque eu sabia que iria acontecer num momento ou outro, mas para o meu espanto, na sexta-feira à noite, após o depoimento de Jair Krischke, eu recebi uma ligação de um jornalista da RBS dizendo que a fita já estava à disposição da CPI, estava à disposição da Comissão... do Movimento de Justiça e Direitos Humanos. Em nenhum momento eu recebi nenhuma ligação do Presidente ou de qualquer conselheiro do Movimento me questionando sobre a fita, se o que continha naquela fita era verdade ou não, se o que continha naquela fita eu havia afirmado ou não. Recebi uma única ligação do Movimento hoje pela manhã, me propondo proteção para que eu depusesse hoje, aqui na CPI.

Devo afirmar que em nenhum momento eu solicitei proteção policial, nem para a Comissão, nem para o Movimento. Fiz, sim, um comentário com os jornalistas de que numa hipótese de depor na CPI, somente faria esse depoimento, caso houvesse uma proteção policial. Mas, fiz todo essa introdução, pra dizer pra vocês, e ao mesmo tempo me desculpar junto a todos, de que as informações que estão contidas nesta fita, elas não são verdadeiras. Essas informações, eu estou aqui hoje para dizer que eu as inventei. Não precisa rir, Deputado. É verdade. Essas informações foram frutos da minha indignação com o Partido dos Trabalhadores.

 

Devo dizer também que em nenhum momento recebi nenhuma pressão do Partido dos Trabalhadores para que não falasse ou para que não divulgasse, até por que eles não sabiam e nunca ficaram sabendo dessa, da existência dessa fita, até por que eu também tomei conhecimento somente à semana passada.

 

Então, Presidente, eu estou aqui e fiz essa introdução, e me coloco à disposição de todos pra afirmar que as declarações que eu dei para os jornalistas, e não as nego que dei, dei e falei, mas não falei a verdade. O que eu falei foi uma grande mentira e eu peço desculpa a todos que, por ventura, tenham sido atingidos por essa mentira, em especial, a militância do Partido dos Trabalhadores e a todos que querem ouvir a verdade, por que hoje eu estou aqui, na condição de falar a verdade. E, estou à disposição.

 

Os deputados e o senhor Jair Krischke ficaram totalmente atordoados com a testemunha bomba. O relator da CPI, deputado Vieira da Cunha, do PDT, chegou a agredir verbalmente Jairo.

Na edição do dia seguinte, o próprio Diário Gaúcho encarregava-se de desnudar a versão do relator, informando que a fita fora entregue à CPI, havendo apenas uma cópia.

Os jornalistas do Diário Gaúcho também confirmaram que gravaram s conversas com Jairo Carneiro sem o consentimento ou mesmo o conhecimento deste, como uma espécie de medida de precaução. Vejamos o que dizem em seus depoimentos.

 

“O SR. CARLOS HENRIQUE DE OLIVEIRA NUNES – Ahn, evidente que todas as denúncias que chegam ao Jornal e por nós são tratadas, elas devem ter todo tipo de precaução. E, como foi publicado na primeira matéria a respeito do tema, por precaução, contra eventuais desmentidos, a conversa foi gravada, foi o que foi publicado.”

 

“O SR. RONALDO ZÜLKE – Sr. Claiton, é... o Senhor referiu que é... integrou seu grupo de jornalistas que estava fazendo essa entrevista com o Sr. Jairo Carneiro já um certo caminho, né? O Senhor tem conhecimento de que essas entrevistas foram gravadas?

 

O SR. CLAITON DOS SANTOS MAGALHÃES – Sim, tenho.

 

O SR. RONALDO ZÜLKE – Com... ahn! o consentimento do Sr. Jairo Carneiro?

 

O SR. CLAITON DOS SANTOS MAGALHÃES – Não, essas... essas entrevistas a gente grava, como grava uma... é um padrão assim. A gente recebe orientação de gravar todas as entrevistas que nos são dadas. Então, é... não foi... eu não posso lhe dizer que a gente chegou pra ele: Ó, Jair Carneiro, o Senhor está sendo gravado. Pelo que eu... a gente aqui... das que... que eu participei, eu não fiz isso. A gente gravava assim, por uma... por uma questão de resguardo do próprio jornal.”

“O SR. RONALDO ZÜLKE – Chefia de redação. Eles foram orientados a gravar essas entrevistas?

 

O SR. PLÍNIO OMAR PEREIRA NUNES – Sim. No caso, eu orientei a gravar no início, porque era necessário evitar erro de interpretação e até por que a gente não sabia o que estava acontecendo. Precisava ter uma garantia do que estava acontecendo.”

 

Importante frisar que quando Jairo Carneiro foi ouvido na CPI pela primeira vez e negou as afirmações feitas aos jornalistas, a fita contendo suas declarações foi ouvida em sigilo pelos deputados para evitar qualquer comprometimento da honra das pessoas citadas. Posteriormente, já ao final dos trabalhos, a CPI decidiu, por maioria, vencidos os subscritores por ouvir a fita mesmo assim, o que somente não foi levado adiante frente a intervenção da bancada do governo e do representante do Ministério Público. Mesmo assim, a Presidência da CPI distribuiu, no penúltimo dia de sessão a degravação integral da fita para a imprensa.

Os Deputados que este subscrevem entendem que a fita não serve como prova e não deveria ser considerada nem incluída nos autos da CPI, para tanto anexam jurisprudência que conforta tal entendimento. Tal interpretação foi garantida em parte por liminar deferida em 11 de novembro, tendo o desembargador Francisco José Moesch limitando o conhecimento do conteúdo da gravação à própria CPI, que não deveria ter lhe dado divulgação pública, como aliás, insistentemente avisado por esta bancada.

Questionados pelos deputados ora subscritores, os jornalistas ainda confirmaram que entregaram a fita apenas ao relator. Desta forma, Vieira da Cunha admitiu que entregou uma cópia da fita, que é considerada uma prova documental, a uma testemunha da CPI, o presidente do MJDH, Jair Krischke, dando nova divulgação de seu conteúdo.

Jairo Carneiro voltou a ser ouvido na CPI em 18 de outubro, mas nada acrescentou de novo. Depuseram o ex-tesoureiro do PT, Jairo Carneiro, e os ex-proprietários do imóvel vendido ao Clube da Cidadania e onde, atualmente, funciona a sede estadual do PT.

 

d) A Grande Farsa do Relator Cunha

 

Os dois temas – jogo do bicho e videoloterias – e as relações com o Governo do Estado ganharam uma nova vitalidade com a “Denúncia ao Poder Legislativo” apresentada por Jair Krischke e mais dois conselheiros do Movimento de Justiça e Direitos Humanos – MJDH – em 20 de junho. O documento procura vincular o Governo a pessoas ligadas à máfia internacional dos jogos a partir de uma correspondência enviada à LOTERGS por um lobista, e do conhecimento que o mercado da jogatina teria sobre instruções normativas da Secretaria da Fazenda regulamentando as videoloterias e a loteria on line – real time que não foram publicadas.

A referida denúncia dos representantes do MJDH provocou imediatamente a oitiva de seu autor principal – Jair Krischke – na CPI. A partir do depoimento de Krischke e dos acontecimentos que se seguiram viu-se o retrato de uma farsa cuidadosamente engendrada por aquele que deveria ser um integrante isento da CPI – seu relator.

O relator – Deputado Vieira da Cunha – promoveu uma verdadeira farsa armada com o Sr. Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos - MJDH, na sessão da comissão realizada em 26 de junho do corrente ano.

Ocorre que no dia 20 de maio o Sr. Jair Krischke, o jornalista Luis Milman e Sérgio Bittencourt, conselheiros do MJDH, lançaram a chamada “Denúncia ao Poder Legislativo” na qual tentam estabelecer relações entre o Governo Estado e a máfia internacional em decorrência da publicação do Decreto nº 40.593, de 16 de janeiro de 2001, e de correspondência enviada ao Diretor da LOTERGS sobre a regulamentação das videoloterias.

No dia seguinte – 21 de junho -, por ocasião do depoimento do ex-Chefe de Polícia Luiz Fernando Tubino, o relator propõe aos membros da CPI a oitiva do Sr. Jair Krischke. Então, na segunda-feira, dia 25 de junho, a CPI realiza sessão para ouvir o presidente do MJDH.

Após quase três horas de explanação do depoente, o Deputado Ronaldo Zulke passa a questioná-lo para tentar elucidar as supostas denúncias. Ao término da inquirição, o depoente pede uma pausa no depoimento, no que é atendido pelo Presidente da CPI. Quando retorna do intervalo, o depoente começa a ser inquirido pelo Deputado Elmar Schneider que questiona sobre o destino de R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais) que teriam sido desviados do jogo do bicho para outra finalidade. O depoente respondeu a pergunta afirmando que esses valores foram destinados à compra da sede do PT e à campanha eleitoral do Partido. O Deputado segue questionando se o depoente tem provas do que está afirmando, “se tem algum documento, papel, fita...”, ao que este responde que sim, que tem uma fita gravada e uma testemunha. O depoente se dispõe a voltar no dia seguinte e apresentar as provas das alegações.

Na seqüência, dia 26 de junho, o Sr. Jair Krischke apresenta uma fita gravada contendo entrevista a jornalistas do Diário Gaúcho de Jairo Carneiro, ex-Tesoureiro e expulso do PT, e o próprio Jairo como a testemunha que elucidará as denúncias. Inquirido pela CPI, após prestar juramento, a testemunha reconhece que as declarações são de sua autoria, mas nega que tenha formalizado uma entrevista, também afirma que não sabia da gravação de suas conversas com os jornalistas e que mentiu para vingar-se do Partido que o expulsara.

 

No dia 28 de junho, o Sr. Jair Krischke concedeu entrevista à Flávio Alcaraz Gomes na Rádio Guaíba, cuja íntegra encontra-se em anexo, na qual afirma que a fita lhe fora repassada pelo relator da CPI, como se pode observar na transcrição a seguir.

 

Flávio Alcaraz: Não, eu tenho acompanhado o noticioso a respeito, não em profundidade mas, como cidadão rio-grandense, atento ao que nos cerca, este depoimento de sua testemunha: disse e depois não disse. E agora leio no jornal afirmar ele que tratou-se de uma vingança pessoal do senhor.

Krischke: Pois olha eu acho que há muitos equívocos. Absolutamente não fui eu que levei esta testemunha. Esta testemunha chega à Assembléia Legislativa via jornalistas que entregam uma fita gravada, por interesse da própria testemunha. Nós fomos apenas, e tão somente, depositário de uma cópia, o que nos foi entregue através do Deputado Viera da Cunha que é o relator da CPI. E além disso, apenas também, colaboramos tomando providências junto ao Ministério da Justiça no programa de proteção à testemunha. Eu vim a conhecer esse senhor, justamente, no dia em que ele prestaria o seu depoimento, uns cinco minutos antes, nunca o tinha visto na rua.” (grifamos)

 

6. A afirmação de Jair Krischke na Rádio Guaíba comprova que o relator entregara a fita, embora na sessão da CPI tenha agido como se de nada soubesse. A cronologia dos fatos noticiada pelos jornais Zero Hora e Diário Gaúcho autorizaram as conclusões expostas. Vejamos o desenrolar dos acontecimentos:

18/06, 2ª feira - Segundo os jornais Diário Gaúcho e Zero Hora a degravação da fita que continha supostas acusações do ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro é entregue ao relator da CPI da Segurança, Deputado Cunha e aos representantes do Ministério Público, promotores Mauro Renner e Carlos Araújo.

 

20/06, 4ª feira - O presidente do MJDH, Jair Krischke, faz “denúncias” junto ao Legislativo, acusando o Governo do Estado de manter ligações com a máfia internacional.

 

21/06, 5ª feira - A CPI da Segurança aprova a convocação de Jair Krischke para depor como testemunha.

 

22/06, 6ª feira - Segundo os jornais Diário Gaúcho e Zero Hora, a única fita existente sobre o assunto é entregue ao relator da CPI, Deputado Cunha.

 

25/06, 2ª feira - No depoimento Jair Krischke mantém as supostas denúncias apresentadas ao Legislativo, e, propositadamente, deixa em aberto o relato de que R$ 600.000,00 teriam sumido dos bicheiros.

 

Como já referido, após as perguntas do Deputado Ronaldo Zulke, a sessão é suspensa e o Presidente, Valdir Andres, o Vice, Elmar Schneider, e o relator, Vieira da Cunha, reúnem-se, em separado, com a testemunha Jair Krischke – devidamente acompanhado por seu assessor, Luiz Francisco Correa Barbosa, também advogado de uma empresa de caça-níqueis.

Após essa interrupção, a sessão recomeça com o deputado Elmar Schneider, em pé, perguntando à testemunha: o senhor tem provas das suas acusações? Ao que, Jair Krischke responde: “sou o fiel depositário de uma fita”, e se propõe a apresentá-la em depoimento no dia seguinte.

Destaca-se que a fita estava com o Deputado Cunha desde o dia 22/06 e a degravação desde o dia 18/06, e as denúncias de Jair Krischke ocorreram no dia 20/06.

 

26/06, 3ª feira - Ao longo do dia, é anunciada a presença da “testemunha-bomba” por Jair Krischke que, como até então não havia provado nada, serviria para esse fim.

 

No início da sessão, é votada a oitiva da citada testemunha em substituição à audição da fita.

O relator, Deputado Cunha busca produzir questionamentos à testemunha. Alegando não ter condições de prosseguir, o relator insistia demasiadamente para ouvir a fita, querendo fazer uma acareação da testemunha com ela mesma. O Deputado continuava simulando que não sabia o que continha a gravação. Vejamos sua declaração enquanto inquiria Jairo Carneiro:

 

O SR. VIEIRA DA CUNHA – Sr. Presidente, eu gostaria de conhecer o inteiro teor desta fita. Acho que os Deputados membros desta CPI devem conhecer o inteiro teor dessas fitas e vou dizer a V. Ex.ª o seguinte: eu, como Relator, inclusive, não me sinto em condições plenas para inquirir a testemunha sem ouvir a fita e me parece que essa seria uma providência que nós devêssemos tomar, porque o depoente reconhece a autoria da declaração, até porque, se não reconhecesse, nós deveríamos providenciar uma perícia, mas não há necessidade, porque o que contém a fita é declarado como autêntico por parte do depoente.[fim]

 

Ora, o relator segundo demonstram os fatos, forjou a apresentação da fita e da testemunha à CPI através de Jair Krischke. No depoimento do jornalista Plínio Nunes, em 15 de outubro o relator confessa que:

 

O SR. VIEIRA DA CUNHA – Sr. Plinio Nunes, este Relator já confirmou e reconfirmou várias vezes e confirmo novamente aqui em público que, de fato, recebi a fita, e uma cópia foi providenciada e entregue ao Movimento de Justiça e Direitos Humanos por mim. É minha a responsabilidade deste ato, única e exclusivamente minha

 

A cronologia dos fatos também gera forte suspeita, pendente de investigação, de que o próprio documento entregue à CPI pelo MJDH denominado “Denúncia ao Poder Legislativo” tenha sido encomendado como parte da farsa, pois foi elaborado em data posterior à da entrega da degravação da fita pelo Diário Gaúcho ao relator.

O relator tinha obrigação de relatar a todos os membros da CPI o que estava ocorrendo e, desta forma, agir com lealdade e boa fé em relação a seus colegas e ao Parlamento rio-grandense. No entanto, o Deputado sonegou aos membros da CPI, ora autores deste relatório o legítimo direito de conhecer os fatos que seriam tratados e as pretensas provas que tinha em seu poder. A conduta do relator no episódio coloca sob suspeição a legitimidade da CPI em relação aos fatos oriundos de uma verdadeira montagem engendrada por ele e por sua pretensa testemunha. Afinal, o relator repassou a terceiros prova material de fato relativo à investigação, sem conhecimento, deliberação ou concordância formal dos demais membros, utilizando temerariamente o cargo para criar uma farsa visando atingir seus colegas, o Governo do Estado e o partido político ao qual pertence o governador.

Diante da gravidade dos fatos, as bancadas do PT e do PC do B solicitaram formalmente ao presidente da Assembléia Legislativa o afastamento do Deputado Cunha da CPI da Segurança Pública, alegando conduta anti-ética e anti-regimental no trabalho da relatoria. Os parlamentares solicitaram providências do presidente da Casa no sentido de resguardar o parlamento gaúcho e a própria CPI, além de representar contra o Parlamentar na Comissão de Ética da Assembléia.

 

e) Apostas virtuais

 

No mês de setembro, novamente o MJDH e o seu presidente Jair Krischke entregam uma nova peça com supostas "denúncias" de que haveria a "conexão Las Vegas - Porto Alegre", através das "apostas virtuais de corridas de cavalo", que teria sido autorizada por um parecer do ex-chefe de Polícia, delegado Luiz Fernando Tubino, em 1999. O MJDH acusa que Porto Alegre é a sede para toda a América Latina da empresa Carnegic Cooke e Company, de Las Vegas. A empresa seria representada na capital gaúcha pelo presidente do Jockey Club Eldorado do Sul e coronel reformado da Brigada Militar, Valdo Marques da Silva.

Mas, na denúncia, Jair Krischke não entrega todos os documentos para a CPI, entre os quais um parecer do ex-chefe de Polícia do governo Britto, delegado Valter José Maitelli.

Abaixo, segue um relato de todos os pareceres dados pela Secretaria da Justiça e da Segurança e pela Polícia Civil, em 1998, e pelo delegado Tubino, em 1999, sobre o assunto da denúncia de Jair Krischke.

Pareceres da SJS e Polícia Civil sobre apostas eletrônicas em hipódromo - No dia 11 de setembro de 1998, o representante da empresa J. P. Souteiro Representações e Vendas Ltda, João Paulo Abreu Souteiro, enviou ofício ao secretário da Justiça e da Segurança, Djalma Manuel Bittencourt Gautério, solicitando autorização da Secretaria da Justiça e da Segurança (SJS) para "abertura e funcionamento da exploração de jogo de corrida de cavalos, via satélite, dos Estados Unidos da América para o Estado do Rio Grande do Sul".

No dia 14 de setembro de 1998, o diretor geral da SJS, Sergio Omar Fernandes, envia o ofício ao chefe de Polícia e pede "o exame do pleito". No dia 30 de setembro de 1998, o documento é entregue pela Chefia de Polícia à Divisão de Assessoramento Jurídico (DAJ).

Em 1º de outubro de 1998, a DAJ recebe cópias de publicação sobre os 90 anos do Jockey Club do Rio Grande do Sul, edição do Jornal do Jockey e ofício da empresa J. P. Souteiro enviada ao presidente do Jockey Club do Estado, Luís Fernando Cirne Lima. Na cópia do ofício ao presidente do Jockey, a empresa informa que "reativará, a partir do dia 01.11.98. aqui no Estado, as atividades da Race Boock, que serão transmissões de corridas de cavalo dos EEUU via satélite, com apostas em máquinas on line".

No dia 8 de outubro de 1998, a chefe do Serviço de Apoio Jurídico (SAJ) da DAJ, delegada Vanise H. de º Danckwardt envia um parecer denominado "Informação Nº 236/98 ao diretor da DAJ, delegado Milton Salatino. Nesse parecer, consta: "preliminarmente, cumpre ressaltar que não compete à Polícia Civil autorizar estabelecimentos que explorem qualquer tipo de atividade ligada à recreação acessível ao público. A atuação desta Polícia Civil dá-se apenas como polícia judiciária, na eventualidade da ocorrência do delito".

O parecer cita o artigo 8º da Lei nº 7.291, de 19 de dezembro de 1984, que coloca que "as apostas turfísticas só poderão ser efetuadas nos recintos ou dependências dos hipódromos, nas sedes ou subsedes sociais das entidades turfísticas, em agências e através de agentes por elas devidamente credenciados". É citado o artigo 18 do Decreto 96.993, de 17 de outubro de 1988, regulado da Lei 7.291, de 19 de dezembro de 1984: "as apostas só poderão ser feitas nas dependências do hipódromo, na sede social, nas subsedes, nas agências autorizadas e por intermédio de agentes credenciados".

A diretora do SAJ avalia, no documento, que "se as apostas sobre corridas, fora dos locais permitidos, são recebidos via telefônica, pode a infração, caracterizar-se independentemente da presença física do apostador". O parecer segue: "pelas razões expendidas, descabe a "J. P. Souteiro" explorar, no Brasil, em plena vigência dos dispositivos legais anteriormente mencionados, jogos de corridas de cavalos que ocorrem nos Estados Unidos, ademais emitidos por empresa mexicana, via captação de sinal-salélite, sob regramento, por tanto, de países estrangeiros e sem amparo na legislação brasileira". No final, o parecer coloca que "ante o exposto, face os diplomas legais anteriormente mencionados, verifica-se que a exploração do chamado "RACE BOOK", fora do hipódromo, constitui a contravenção penal do Art. 50, § 3º letra "b".

No dia 4 de outubro de 1998, o diretor da DAJ, delegado Milton Salatino, envia o parecer ao chefe de Polícia. No dia 4 de novembro de 1998, o chefe de Polícia, delegado Valter José Maitelli, envia despacho ao secretário da Justiça e da Segurança com o seguinte parecer: "A exploração do chamado race book, se praticado em hipódramos (jóqueis-clubes) em nada fere a legislação vigente, razão pela qual acolho na integralidade a Informação nº 236/98, expedida pela Divisão de Assessoramento Jurídico deste gabinete".

No dia 9 de dezembro de 1998, o assessor especial da SJS, José Henrique Moreira Alves, envia parecer ao diretor geral da SJS, considerando que "cabe aos hipódromos (Joquei-clubes), do Rio Grande do Sul, chancelar ou não a instalação do "Race Boock", para que opere legalmente".

No mesmo dia, o diretor geral da SJS e secretário substituto da Justiça e da Segurança, Sergio Omar Fernandes, comunica que acolhe os pareceres anteriores.

Ainda no mesmo dia (9/12/199), Sergio Omar Fernandes envia o ofício nº 1.126/98-DG ao representante da J. P. Souteiro Representações e Vendas Ltda, João Paulo Abreu Souteiro. No documento consta: "cumpre-me encaminhar a V. As, para conhecimento, cópia da Informação nº 236/98, da Divisão de Assessoramento Jurídico da Polícia Civil e parecer da Assessoria de Projetos Especiais desta Secretaria de Estado".

No dia 16 de março de 1999, o representante da J. P. Souteiro Representações e Vendas Ltda, João Paulo Abreu Souteiro, manda um ofício ao chefe de Polícia, delegado Luiz Fernando Tubino. No documento é colocado que a empresa "formulou pedido para funcionamento de agências de apostas em corridas de cavalo dos Estados Unidos da América do Norte, através de sinal eletrônico via satélite (sistema on line) junto a esta chefia e SJS e recebendo as devidas autorizações consoantes ao parecer da DAJ e SJS, conforme expediente nº 236/98 de 04/11/98". Depois o ofício segue com a seguinte solicitação "pelo exposto, requer ratificação da autorização da chefia anterior".

No dia 17 de março de 1999, o chefe de Polícia, delegado Luiz Fernando Tubino, envia o ofício nº 375 ao representante da J. P. Souteiro Representações e Vendas Ltda, João Paulo Abreu Souteiro. O ofício de Tubino apresenta o seguinte parecer: "ratifico a autorização da gestão anterior, observando que o movimento de apostas deverá ser feito nos hipódromos, ou em suas agências".

 

O empresário João Paulo Souteiro confirmou, em depoimento prestado a CPI da Segurança Pública no dia 17 de setembro, que apostas on-line em corridas de cavalo foram realizadas durante todo o ano de 1997 no Jóckei Clube do Rio Grande do Sul, durante a gestão de Jair Rodrigues. Segundo o empresário as apostas eram públicas, abertas e realizadas no salão social do clube. "Não havia nada de ilegal nestas atividades. Além disto, era impossível que as autoridades na época não soubessem que as apostas ocorriam livremente no Jóckei", assinalou.

O depoimento de Souteiro foi fundamental para desconstituir a denúncia do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de que o atual governo teria autorizado a realização deste tipo de jogo, a partir de portaria emitida pelo ex-chefe de Polícia, Luiz Fernando Tubino. O despacho assinado pelo delegado Tubino, quando estava na chefia de polícia, apenas reeditou decisão do chefe de Polícia do governo anterior, Valter Maitelli, tomada com base em parecer emitido pela assessoria jurídica da Polícia Civil.

O deputado subscritor, Ronaldo Zulke entregou ao presidente da CPI, todos os documentos oficiais sobre o assunto e acusou o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, de omitir informações para sustentar "uma denúncia fantasiosa".

 

Depoimentos derrubam tese da origem espúria dos recursos para compra da sede

 

Importante salientar que a ligação inicialmente feita pela CPI, de que o Clube de Seguros da Cidadania é uma “lavanderia” que recebia dinheiro do Jogo do Bicho para entrega-lo ao PT foi totalmente descaracterizada. Além de não ter havido transferência de recursos, das 22 testemunhas que em 1998 doaram dinheiro para o CSC, 20 admitiram que o fizeram. Ou seja, que transferiram legalmente recursos para o Clube e receberam os recibos respectivos, apresentados a eles pelo relator.

Fica claro que não resta qualquer prova nesta CPI de envolvimento do PT com receitas advindas da contravenção.

Como é de conhecimento da CPI, Clube de Seguros da Cidadania entregou ao Ministério Público - antes mesmo de iniciar-se esta CPI - a sua documentação fiscal e livros contábeis, assim como a movimentação financeira dos seus diretores. Cumprirá agora aos promotores e procuradores de justiças encarregados do caso agregar ao procedimento então instalado os depoimentos e documentos obtidos pela Comissão Parlamentar, ressaltando-se que seu objetivo deve ter a finalidade de realizar uma investigação ampla, aprofundada e, importante ressalvar, isenta de paixões políticas e pretensões eleitorais.

 

USO INDEVIDO DO NOME DO GOVERNADOR

 

A CPI recebeu em 25 de novembro das mãos do ex-delegado e Advogado Wilson Muller, 24 horas antes da data marcada para acareação do ex-chefe de Polícia, delegado Luis Fernando Tubino um CD- Compact Disc - contendo uma conversa entre o Sr. Diógenes de Oliveira e este. A origem de tal gravação foi negada por ambos, sendo informado pelo Dr. Muller que a sua origem cabia a um “alto funcionário da Secretaria de Segurança”, cliente seu, e que este possuía outras gravações, mas cujo nome não foi revelado sob abrigo do sigilo entre cliente-advogado. Salienta-se, no caso concreto que o Advogado não apresentou, ainda que em sigilo, qualquer procuração lhe outorgando poderes para representar esta pessoa perante a Comissão. Como se sabe, a procuração é o instrumento básico pelo qual o Advogado representa seu cliente; pelo qual exerce seu munus público.

Por isso a Lei 8.906/94, (Estatuto do Advogado) dispõe que:

 

Art. 5º. O advogado postula, em juízo ou fora dele, fazendo prova do mandato.

 

Enquanto o sigilo profissional protege as informação passadas ao Profissional do Direito em razão de seu ofício, a “ocultação” de qualquer pessoa assegura o anonimato, o que é vedado pelo art. 5o,IV da Constituição Federal, levantando-se sérias dúvidas quanto a clandestinidade de tal gravação e por quais motivos foi feita.

O CD foi apresentado pelo Relator às 11:30 hs do dia 26 de novembro, quando a CPI deveria iniciar a acareação do ex-chefe de Polícia com quatro delegados que afirmaram que teriam ouvido deste, em versões mais ou menos diferentes, que o dinheiro do Jogo “agora iria para o chefe”, ou que “iria para as obras sociais do governo”. A transcrição da fita, inusitadamente, foi feita pela Rádio Band, que ao mesmo tempo transmitia passagens da gravação, transformando-se no segundo caso desta CPI em que gravações são repassadas a terceiros, nesse caso a imprensa, antes de chegar ao conhecimento dos demais deputados.

Vencido este aspecto, o fato é que os próprio interlocutores reconheceram suas vozes na gravação, comparecendo o Sr. Diógenes de Oliveira ao plenário da CPI para depor a respeito do conteúdo da conversa gravada no CD. Em seu depoimento tratou de maneira bastante clara a questão referente a “estar falando em nome do governador”. Dei um carteiraço, afirmou Diógenes. “Não tive nenhuma autorização do Governador do Estado para falar em seu nome; o que disse e fiz, foi de minha inteira responsabilidade, completou”.

Esclarecida a responsabilidade pelo conteúdo da conversa, resta ainda frisar que do dito encontro não resultou nenhuma conseqüência no que diz respeito aos assuntos referentes à segurança pública e ao combate específico à contravenção e à criminalidade. Ao contrário, o chefe de polícia foi bastante enfático ao negar qualquer possibilidade neste sentido.

Examinando o conteúdo da conversa com atenção e critério, não há outra conclusão a chegar senão a de que se tratou de um evento bufo, vulgar, onde um senhor opera bravatas irresponsáveis, se utilizando indevidamente do nome do Senhor Governador do Estado. Se alguma dúvida restasse quanto ao fato de que tal conversa não trouxe nenhuma conseqüência prática, bastaria lembrar que o Senhor Diógenes afirmou que pretendia derrubar os Secretários Bisol e Augustin, da Secretarias da Segurança e da Fazenda, respectivamente. Passado o tempo, Bisol e Augustin permanecem em seus cargos contando com a confiança do Senhor Governador, enquanto Diógenes de Oliveira não ocupa nenhum cargo no governo.

 

Mas se a conversa havida entre estes dois personagens não trouxe nenhuma conseqüência no trabalho da segurança pública no Estado, a publicidade de tal fita clandestina provocou sérios danos à imagem do Governador e do Governo, e isto, entendemos, não deve permanecer na impunidade.

É inaceitável que o nome de um Governador do Estado seja utilizado de forma leviana e irresponsável, única e exclusivamente para efeitos de uma bravata. Tal ato deve ser rigorosamente apurado pelo Ministério Público a fim de que sejam tomadas as providências cabíveis no caso.

 

CONCLUSÕES E PROVIDÊNCIAS

 

Diante de todo exposto, algumas conclusões devem ser sistematizadas com o fim de facilitar a análise dos órgãos destinatários do presente documento, pois ainda que tenhamos referido ao longo da exposição que a Comissão Parlamentar de Inquérito tratou de tudo que pudesse atingir o atual governo e tentar saciar a sanha vingativa dos que foram derrotados nas últimas eleições, ou daqueles que têm pretensões megalômanas para as próximas, não tratou com profundidade dos temas referentes à segurança pública de nosso Estado. Tentamos, ainda que sem a ajuda da maioria dos membros desta CPI, extrair das investigações, dos depoimentos, das “denúncias”, lições e encaminhamentos que possam efetivamente auxiliar no aprimoramento dos órgãos e instituições responsáveis pela segurança e até contribuir para os rumos da política para o setor.

 

Quando a CPI desviou-se dos assuntos para os quais não havia sido instituída, foi possível conferir a correção dos encaminhamentos adotados pelo governo. Podemos citar como exemplo os episódios envolvendo a investigação da compra de material de limpeza para as escolas e a detenção de um jovem no Parque Harmonia durante o Fórum Social Mundial nos quais constatou-se que a administração procedeu como deveria e adotou as medidas necessárias.

Desde o início dos trabalhos da Comissão, os Deputados subscritores através de inúmeros requerimentos e intervenções tentaram trazer à investigação do Parlamento os problemas envolvendo a corrupção policial e suas ramificações. O assunto era perfeitamente adequado ao objeto da CPI, e poderia ter sido passível de apuração, além de inserido no chamado 13º ponto. No entanto, inexplicavelmente, este assunto foi apenas tangenciado. A insistência da Bancada do Partido dos Trabalhadores possibilitou a oitiva na CPI de dois Promotores de Justiça integrantes do Conselho Superior de Polícia que forneceram importantes elementos sobre a atuação do órgão e sobre as irregularidades e crimes cometidos por agentes de polícia. Estranhamente esse assunto não teve eco na CPI. Posteriormente, o grande denuncista da Comissão – Jair Krischke – que patrocinou um espetáculo para a mídia, recheado de ilações e manifestações infundadas ao mesmo tempo em que atuava como coadjuvante no episódio da entrega da gravação de Jairo Carneiro ofendeu esses mesmos Promotores referindo que integravam um “Triângulo das Bermudas” que fazia desaparecer, por meio de arquivamentos, as denúncias por ele apresentadas.

 

Os encaminhamentos e ponderações que a Bancada do Partido dos Trabalhadores tem a fazer na conclusão dos trabalhos da CPI são as seguintes.

 

1. A suspeição e autoritarismo do relator

A postura do relator durante esta Comissão foi totalmente destoante daquela adotada pelos relatores de CPIs, que devem manter conduta imparcial e isenta para garantir a lisura e seriedade dos trabalhos.

A maior demonstração da postura equivocada do relator foi a verdadeira farsa armada com o Sr. Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos - MJDH, para apresentação da fita de Jairo Carneiro. Na ocasião, o relator repassou a terceiros – Jair Krischke - prova material de fato relativo à investigação, sem conhecimento, deliberação ou concordância formal da CPI, utilizando temerariamente o cargo para criar uma farsa visando atingir seus colegas, o Governo do Estado e o partido político ao qual pertence o governador.

Assim agindo, o relator deixa a CPI vulnerável e passíveis de nulidade todos os seus atos, além de ser passível de punição na esfera da Comissão de Ética parlamentar, como já requerido pela Bancada do Partido dos Trabalhadores. Tal conduta também deve ser analisada sob a ótica do Ministério Público quando da análise do relatório da CPI.

 

2. Dos fatos inexplicavelmente ignorados pela CPI

Nas denúncias apresentadas à CPI foi possível constatar o envolvimento dos próprios denunciantes com os esquemas denunciados. Assim ocorreu em relação ao ex-juiz e atual advogado Luiz Francisco Barbosa, pois ficou comprovado que mesmo sendo denunciante da chamada jogatina clandestina, a qual tem ramificações e ligações com a máfia internacional, advoga para empresas do setor. Também é o caso do delegado Roberto Pimentel que, apesar de compromissado nos termos da Lei, faltou com a verdade na CPI em relação a sua vida funcional, e do delegado Nelson Soares Oliveira, sobre o qual descobriu-se ter dois registros de identidade civil diferentes, além de situações mal explicadas de saídas e retornos do serviço público.

Ainda que a CPI não tenha se esforçado em investigar e apontar as responsabilidades dos agentes policiais envolvidos em ilícitos, a bancada do Partido dos Trabalhadores e a Bancada do Partido Comunista do Brasil reafirmam seu compromisso de persistir no aperfeiçoamento das instituições, combatendo seus vícios e desvios em prol da valorização dos bons profissionais da área da segurança pública. Por essa razão é absolutamente imprescindível que o Ministério Público realize as investigações que a CPI deixou de proceder, e apure as responsabilidades cabíveis.

Nesse sentido, reafirmamos a importância de que este Parlamento, em que pese a má vontade dessa Comissão, manifeste pleno apoio as investigações que já vem sendo realizadas pelo Ministério Público, em especial as que vem sendo realizadas pela Secretaria de Justiça e Segurança, com vários Inquéritos Policiais referentes as suspeitas que pairam sobre vários Delegados citados na CPI.

 

3. A manipulação de fatos

Esta Comissão parlamentar, ao dar guarida as denúncias apresentadas pelo Sr. Jair Krischke em nome do Movimento de Justiça e Direitos Humanos incorreu em graves equívocos. Denunciações caluniosas, ilações descabidas e suspeitas infundadas foram a tônica de tais fatos que, manipulados sem escrúpulos, atacaram a honra de pessoas e instituições em proveito de manipulações políticas, manchando a história dos defensores dos direitos humanos. É imprescindível que estes fatos e seu autor, assim como as ligações desse e suas intenções indiretas, sejam levadas ao conhecimento do Ministério Público do Estado, com a anexação integral dos seus depoimentos e dos documentos que apresentou a CPI, a fim de que àquele órgão tenha todas as informações necessárias para apurar as responsabilidades pessoais por ilícitos cometidos.

 

4. A CPI necessária

Tendo em vista os rumos tomados pela Comissão, reafirmamos a necessidade de constituição de uma CPI destinada a analisar os financiamentos de todas as campanhas eleitorais da última década. Devem ser abrangidos todos os partidos políticos que concorreram nessas eleições para que a investigação, além de buscar responsáveis, aponte para a solução da questão do financiamento de campanhas.

 

5. O uso indevido do nome do governador

O episódio da gravação da conversa de Diógenes de Oliveira, embora fuja ao tema da CPI e não contribua para qualquer encaminhamento sério pela relatoria da CPI, revelou o uso indevido do nome do governador. Esse fato por si só merece ser rigorosamente investigado pelo Ministério Público para que seja apontada a responsabilidade, e, adotadas as devidas providências.

 

6. Medidas legislativas para aperfeiçoamento do controle sobre a administração pública

A Bancada do Partido dos Trabalhadores entende como necessária alteração na Constituição do Estado visando a aperfeiçoar o controle sobre os agentes públicos que ocupem cargos ou funções relevantes na Administração Pública. Esse controle deve abranger a evolução patrimonial dos agentes antes, durante e após a passagem pelos cargos públicos, bem como a especialização dos órgãos judiciais para o tratamento das questões que envolvam ilícitos cometidos contra a Administração.

Da mesma forma, urge que se institua uma Corregedoria unificada e independente para todos os órgãos da área da segurança pública, a fim de tornar os processos de apuração de irregularidades e infrações funcionais mais ágeis e isentos de influências corporativas.

Essas são as considerações e encaminhamentos que a Bancada do Partido dos Trabalhadores, representada pelos Deputados titulares nesta Comissão Parlamentar de Inquérito, julgou necessário declarar e levar ao conhecimento dos demais parlamentares, dos Poderes constituídos e da sociedade rio-grandense.

 

Sala das Sessões, em 14 de novembro de 2001.

 

 

 Deputado Ivar Pavan                      Deputado Ronaldo Zulke

 

 

(Encerra-se a Sessão às 20h07min.)

 

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